Por que Tarcísio e Bolsonaro estão errados sobre as câmeras nas fardas da PM – CartaCapital

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A retirada das câmeras de segurança dos uniformes de agentes pode incentivar a violência e dificultar a punição de excessos

O candidato ao governo de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), voltou a tecer críticas sobre o uso de câmeras nas fardas dos policiais militares do estado. 
Uma de suas promessas de governo é a retirada do equipamento de gravação dos uniformes dos agentes, sob a justificativa que os equipamentos deixam os agentes em “desvantagem” e prejudicam o trabalho policial. 
“O que representa a câmera? É uma situação deixar o policial em desvantagem em relação ao bandido”, declarou o candidato bolsonarista em entrevista ao programa Pânico, da Jovem Pan. 
A tese defendida pelo ex-ministro da Infraestrutura muito se aproxima do discurso do presidente Jair Bolsonaro (PL) que chegou a afirmar em setembro que a atividade policial melhoraria sem o uso das câmeras.
“Tira esse negócio de câmera para ver se não melhora de cara”, afirmou o ex-capitão. 
A introdução do uso das câmeras corporais em São Paulo foi feita em 2019, pela gestão do governador João Doria visando diminuir a violência e a letalidade policial. 
Ao contrário do que afirmam o ex-ministro e o atual presidente, as câmeras não dificultaram o trabalho policial, e sim garantiram uma redução da violência cometida por agentes. 
Dados do programa Olho Vivo, que estabelece o uso dos equipamentos nas fardas, mostraram queda de 80% da letalidade policial nas unidades em que houve a implementação do dispositivo. 
Entre junho de 2021 e maio deste ano, os 19 batalhões que utilizaram as câmeras registraram 41 mortes por intervenção policial. Nos 12 meses anteriores ao início do programa, as mesmas unidades foram as causadoras de 207 mortes.
As lesões corporais decorrentes das abordagens também diminuíram cerca de 28% em comparação ao ano anterior da implementação dos gravadores. 
Especialistas atribuem o sucesso do programa a “transparência” trazida para a ação policial, sendo os equipamentos inibidores nas agressões desproporcionais. 
Isso mostra que as forças de segurança podem atuar de outra forma na contenção da criminalidade. 
No entanto, a retirada dos equipamentos das fardas dos PMs está diretamente relacionada com a agenda de Bolsonaro que defende uma mudança legislativa para permitir que policiais não sejam responsabilizados por excessos e violência descabida em abordagens. 

Por inúmeras vezes, o presidente Jair Bolsonaro tentou emplacar projetos que previam a ampliação do excludente de ilicitude, para isentar as forças de seguranças de eventuais punições por excessos em abordagens e operações.
O mecanismo que estabelece a possibilidade de uma pessoa praticar ação que seria normalmente considerada criminosa sem sofrer as imputações já existe em nosso ordenamento jurídicos para casos envolvendo estado de necessidade, para se salvar de um perigo real, legítima defesa e estrito cumprimento legal de dever ou no exercício regular de direito. 
Esse último caso permite policiais e outros agentes de segurança pública não sejam punidos caso seja necessário infligir agressões contra outra pessoa ou causar danos a algum bem. Evidentemente, isso não significa que qualquer agressão realizada por um agente de segurança pública não poderá ser punido. O Código Penal prevê e enfatiza que excessos deverão ser penalizados.
O ex-capitão tentou incluir a ampliação das garantias dos agentes no pacote de Lei Anticrime, elaborado pelo então Ministro da Justiça, Sérgio Moro, porém, o dispositivo foi excluído do projeto no Congresso. 
Em novembro de 2021, o presidente enviou projeto similar diretamente ao Congresso tentando estabelecer novo texto à lei penal, deixando a cargo do juízes a redução de pena ou a negativa de aplicação de responsabilização se o excesso decorresse de “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”. 
Na prática, o presidente Jair Bolsonaro pretende que os agentes de segurança possam agir antes do início de uma ameaça concreta, usando da violência de forma preventiva. 
Para especialistas da área de segurança, a mudança estimula a violência policial, dando aos agentes “carta branca” para não serem punidos pelo excesso na legítima defesa. 
Apesar da atual previsão de punição, a impunidade é a principal causa da violência da polícia brasileira, segundo relatório da Human Rights Watch, publicado em janeiro de 2021. 
Essa violência também tem um alvo muito específico no País, as periferias e jovens negros. Conforme o levantamento, 80% das vítimas da violência policial são pessoas negras. 
Além de não combater a violência policial, Bolsonaro tem, por vezes, encorajado atos ilícitos e excessivos. Somente em 2020, os assassinatos cometidos pela polícia aumentaram 6% no primeiro semestre, revertendo dois anos de taxas decrescentes. 
A falta de responsabilização de agentes infratores nas corporações criminaliza na visão da opinião pública o trabalho dos bons agentes, que precisam conviver com profissionais que usam da força de forma ilegal e de forme discricionária. 
Como resultado, as pessoas não confiam na polícia enquanto se sentem inseguras, impactando negativamente na percepção de segurança pública. 
Marina Verenicz
Repórter do site de CartaCapital
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