Senadores e debatedores criticam impunidade e cobram combate à corrupção – Senado Federal
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Da Agência Senado | 24/10/2022, 18h45
Fim do foro privilegiado, decretação da prisão em segunda instância e medidas eficazes de transparência e fiscalização na administração pública foram algumas das ações defendidas por senadores e debatedores para o combate efetivo à corrupção no país. O tema foi tratado durante audiência pública da Comissão de de Transparência, Fiscalização e Controle (CTFC), nesta segunda-feira (24), que discutiu a corrupção e a possibilidade de facções criminosas estarem ligadas a crimes da administração pública tendo como base declarações dadas à Polícia Federal pelo empresário mineiro Marcos Valério, condenado no caso do Mensalão. Valério foi convidado para a audiência mas não compareceu.
O autor do requerimento para realização da audiência, senador Eduardo Girão (Podemos-CE), disse que o Brasil precisa “jogar luz em algo que está na sombra” e seguir pelo caminho da transparência e eficiência na gestão pública. Ao elogiar avanços obtidos pelas forças-tarefas como a Lava Jato e a de combate ao Mensalão, Girão defendeu que o Congresso fique atento a matérias que focam no enfrentamento ao mau uso do dinheiro público.
— Este Senado Federal, que hoje é muitíssimo questionado pela população — e eu não tiro a legitimidade da população com relação a isso —, já aprovou o fim do foro privilegiado há cinco anos [PEC 10/2013]. Para mim a grande blindagem à corrupção no Brasil e à impunidade é o foro privilegiado. Está na Câmara dos Deputados. Falta o presidente da Câmara [deputado Arthur Lira] tirar da gaveta e votar, e eu acho que o Brasil dará um passo fantástico rumo ao fortalecimento de princípios e valores éticos no nosso país.
Para Girão, o enfrentamento e o controle não são difíceis de se executar, já que, conforme observou, os mecanismos dos processos de corrupção já são bastante conhecidos no Brasil: licitações direcionadas, contratos superfaturados e empréstimos injustificáveis. O senador ainda criticou o que chamou de “arbitrariedades” cometidas por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), o que, na sua visão, não tem contribuído para o bom funcionamento da República.
O senador Lasier Martins (Podemos-RS) reforçou as críticas e também saiu em defesa da aprovação do fim do foro privilegiado. De acordo com ele, a aprovação pelo Congresso de projeto que institua a prisão após condenação em segunda instância ajudará a reduzir a sensação de impunidade “tão presente no Brasil”.
— Se nós tivermos a aprovação da prisão após condenação em segunda instância, como é comum na maioria dos países, nós evitaremos a impunidade, que tem beneficiado tanta gente. Porque a prisão após condenação em segunda instância vigorou de maneira intercalada desde a Constituição de 1988 por 21 anos.
Relator da Operação Lava Jato no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), o desembargador federal João Pedro Gebran Neto também criticou “os inúmeros recursos protelatórios possíveis” na Justiça brasileira.
— É imprescindível, para que nós tenhamos combate à criminalidade em geral, não só à corrupção, à lavagem de dinheiro, mas a todos os crimes, que, depois de julgado no primeiro grau e no órgão colegiado, que é um tribunal, as penas passem a ser executadas. E por que isso é necessário? Porque a prisão historicamente tem duas finalidades: uma finalidade especial, que é destinada para aquela pessoa que cometeu o crime responder por ele — essa finalidade é a prevenção especial —, mas tem uma outra finalidade da pena, e não sou eu que falo, são os historiadores, são os juristas já de décadas, de séculos, que é a prevenção geral, para que a sociedade tenha a percepção de que há efetividade na jurisdição criminal, ou seja, de que quem comete crime vai preso — afirmou.
O desembargador ainda saiu em defesa das delações premiadas feitas pela Operação Lava Jato, ao argumentar que foram validadas em sua grande maioria pelo STF, e disse não concordar com a decisão da Corte de ter considerado parcial a atuação do então juiz e senador eleito Sérgio Moro (União-PR).
— Eu julguei processos em relação à suspeição do juiz Sergio Moro. Tive compreensão diferente da do Supremo Tribunal Federal. Prevaleceu a dele — disse ao responder questionamentos do senador Lasier e da deputada Carla Zambelli (PL-SP).
Para o ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner de Campos Rosário, o país precisa atuar em três eixos para o combate a corrupção: capacidade de detectar e investigar, execução de medidas preventivas e sanção das penalidades.
Rosário disse que no passado um dos grandes problemas que facilitavam a corrupção na administração pública era a falta de transparência em relação ao financiamento de estatais, como Petrobras e BNDES. Segundo o ministro, os órgãos de controle não tinham acesso a informações como o valor total investido e as condições contratuais de empresas que recebiam recursos públicos. Ele citou como exemplo obras estruturais em países como Cuba e Venezuela.
Ele lembrou que, desde a Operação Lava Jato até os dias de hoje, a evolução no combate à corrupção está elencada na implementação da Lei das Estatais (Lei 13.303, de 2016) e nas medidas de transparência e fiscalização adotadas em relação às contratações públicas que representam quase 15% dos gastos públicos do país. Rosário citou ainda como evolução a Lei de Leniência (Lei 12.846, de 2013) com a devolução de ativos, a exigência de servidores capacitados e a fiscalização destes.
— Por isso é tão importante que a sanção ocorra, porque ela tem esse aspecto importante de ser até um elemento preventivo. Porque quando as pessoas veem os outros sendo sancionados a gente passa a se preocupar com as reais consequências e passa a tomar cuidado, e muitas vezes alguns vão deixar de executar. Outros vão criar mecanismos mais apurados para continuar corrompendo. Mas muitos, quando verificando que [para] o caso descoberto ocorre real punição, a gente vai ter aí uma diminuição desse processo — disse.
O senador Styvenson Valentim (Podemos-RN) criticou o que chamou de retrocessos na legislação de fiscalização, transparência e penalidade como a recente mudanças na Lei de Improbidade (Lei 14.230, de 2021) e a promulgação da Emenda Constitucional (EC) 105, que autoriza a transferência direta a estados, municípios e Distrito Federal de recursos de emendas parlamentares individuais ao Orçamento. Além disso, citou a falta de transparência no chamado orçamento secreto, cujos gastos são definidos por meio das emendas de relator, no âmbito da Comissão Mista de Orçamento (CMO). Para Styvenson, os temas precisam de uma análise profunda, tanto pelo Legislativo quanto pelos órgãos de controle.
A jurista e ministra aposentada do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Eliana Calmon disse que durante sua carreira enfrentou a dificuldade de combate à corrupção. Segundo ela, práticas irregulares eram recorrentes nos tribunais de Justiça o que, na sua avaliação, ajuda a perpetuar a engrenagem de atos fraudulentos na administração pública. Ela deu exemplos de situações que vivenciou como procuradora, ministra do STJ e corregedora-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Eliana Calmon destacou que a legislação e a instituição de novas ferramentas de fiscalização e transparência fizeram com que as investigações, apurações e penalizações evoluíssem. No entanto, considerou que muitas fraudes cometidas hoje têm em sua origem as emendas parlamentares.
— Eu dizia sempre: o ovo da serpente está — e aí os senhores vão me desculpar — nesta Casa, está no Poder Legislativo, através das emendas parlamentares, porque o mapeamento vinha a partir das emendas parlamentares, com já tudo arregimentado com as concorrências públicas cujos editais eram feitos dentro das empresas que iam fazer a obra. Porque isso a Polícia Federal encontrou dentro das empresas, sendo gerados os editais de concorrência. E aí foram mapeando o dinheiro que sai a partir dessas emendas e que vai sendo distribuído para as empresas, para os parlamentares, até chegar à ponta que é o quê? O engenheiro que faz a medição da obra. Tudo! — afirmou.
O coordenador de Repressão à Corrupção da Diretoria de Investigação e Combate ao Crime Organizado da Polícia Federal, Fabiano Emídio de Lucena Martins, disse que atualmente 11% dos inquéritos de todas as investigações da Polícia Federal referem-se a desvio de recursos públicos e combate à corrupção na administração pública, somando 5.874 inquéritos. Martins esclareceu que a corporação tem pautado sua atuação em dois pilares: proatividade e assertividade. Segundo ele, o número de operações aumentou nos últimos três anos.
— Tivemos, no último triênio, já que eu estou falando de dois anos e meio aproximadamente, na Coordenação de Repressão à Corrupção, um aumento de 24% das operações especiais e comuns de combate à corrupção na Polícia Federal em relação ao triênio anterior. Se nós compararmos 2016 a 2019 e 2020 a 2022, nós estamos falando aí de um aumento de 24% nas operações de combate à corrupção — informou.
Para ampliar o combate à corrupção no país, o coordenador-geral de Articulação Institucional do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça, Edson Fábio Garutti Moreira, citou o estímulo à criação e à articulação das unidades de combate e enfrentamento à corrupção nas polícias civis e a execução do Programa Nacional de Prevenção à Corrupção (PNPC) e do Programa Nacional de Contratação Pública (PNCP). Segundo ele, as iniciativas do Executivo ampliam o combate ao crime no país e buscam atender convenções internacionais das quais o Brasil faz parte, além de ampliar requisitos para possibilitar a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
No entanto, Moreira ressaltou que há muitos anos a Polícia Federal tem identificado a participação do crime organizado e de facções criminosas cada vez mais em crimes comuns, o que demanda mais aprimoramento e investimento nas investigações.
— Elas praticavam tráfico de drogas, tráfico de armas, tráfico de órgãos, e a gente está vendo cada vez mais essas facções criminosas de caráter violento adentrando em crimes como o estelionato. Então, aqueles estelionatos pelo WhatsApp, pelo Pix estão forrados de organizações criminosas por trás. Por quê? Perceberam que é muito mais fácil, muito menos arriscado. Então, no âmbito da Rede-Lab [Rede Nacional de Laboratórios de Tecnologia contra Lavagem de Dinheiro] e da Renaccor [Rede Nacional de Polícias Judiciárias no Combate à Corrupção] a gente está tendo algumas iniciativas para tentar mapear essa questão do Pix, garimpo ilegal de ouro — têm sido vistas organizações criminosas de cunho violento fazendo a segurança de garimpos ilegais — e pirâmides financeiras — detalhou.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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