Marcos José Diniz Silva: Religião e (educação) política – O POVO
Tem-se observado, recorrentemente, o espanto de muitas pessoas a respeito da presença ostensiva de lideranças religiosas e das referências aos postulados teológicos, especialmente cristãos, nos últimos anos da política brasileira. De modo mais notório, desde as eleições presidenciais de 2018, quando o candidato Jair Bolsonaro intensificou suas alianças com grupos evangélicos e pautou grande parte de suas propostas de governo na alçada da moral cristã. De lá para cá, no governo e na campanha pela reeleição, as negociações com religiosos evangélicos e católicos carismáticos – menos visíveis – tem sido sua marca.
Mas, a despeito desse barulho, as relações entre política e religião no Brasil nunca foram novidade. Embora muitos temam que as tendências fundamentalistas desses grupos venham a liquidar a laicidade do Estado brasileiro, originando uma república de viés teocrático, é preciso lembrar que na República brasileira, o preceito constitucional da laicidade sempre foi objeto de questionamentos e manobras da hegemônica Igreja Católica, até pelo menos a década de 1960. De lá para cá, o pluralismo religioso e as transformações urbanas impuseram maior equilíbrio, com o avanço do protestantismo, do espiritismo e das religiões afro-brasileiras.
O que hoje se apresenta como novidade é a substituição das demandas sociais pelas demandas religiosas de cunho moral no varejo das práticas políticas e no cotidiano parlamentar, a ponto de a classe política tornar-se refém dos programas das igrejas. No passado, era sobretudo no espaço do Executivo que se davam as negociações da hierarquia católica, agora é pela força das bancadas parlamentares, com grande peso no “Centrão”, que essa presença se manifesta.
E não é viável, no quadro cultural brasileiro, ter grandes ilusões secularistas e laicistas. O religioso tem uma cosmovisão própria, e tende sempre a interferir ou tentar conformar a sociedade ao seu modo de ver e viver no mundo. O desejado equilíbrio de perspectivas, nesse caso, será sempre resultado de uma disputa sociopolítica de diferentes visões de mundo.
Desse modo, cabe refletir, não tanto sobre o mal ou bem da religião na política, mas sobre o que demanda a sociedade, qual cidadania queremos, que tipo de sociedade queremos. Dilema que só a educação política poderá resolver.
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