Barrar política em show é oportunismo, diz Paula Lavigne – UOL

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“Quem diria, eu defendendo o Bolsonaro.” É com alguma dose de ironia que Paula Lavigne faz esta afirmação. Em primeiro lugar, porque a produtora cultural de 53 anos se tornou figura central na articulação de artistas nas redes sociais em prol da candidatura de Lula, do PT, nestas eleições.
Depois, porque, nos últimos quatro anos, o grupo comandado por ela, o 342 Artes, foi crítico ferrenho da gestão do governo no meio ambiente e na cultura. Mas, em 2022, Lavigne se viu tendo que defender a participação de Bolsonaro na Festa do Peão de Barretos, enquadrado pelo partido de Ciro Gomes como um showmício.
“Bolsonaro em Barretos é como Pabllo Vittar no Lollapalooza“, diz ela, retomando o episódio em que o próprio Bolsonaro tentou barrar a manifestação política da artista no festival. “Acho por bem passar as eleições e aí a gente sentar para conversar sobre isso, porque vamos ter que clarear muita coisa sobre showmício. Tem vários artistas respondendo a processo. Pelo amor de Deus, virou um inferno isso.”
A presença do presidente em Barretos e o ato pró-Lula de Pabllo são dois dos muitos episódios de manifestação política que pararam na Justiça. “Isso é mais do que censura. É oportunismo. Quem faz isso [tentar barrar manifestação política] aparece um monte na rede social, e para ele é bom.”

Esse modus operandi, com as chamadas milícias digitais atacando perfis nas redes sociais para fazer viralizar conteúdo de aliados, não é novidade. Lavigne acredita que a classe artística sentiu esse choque pela primeira vez em 2018, mas que tudo começou ainda com os casos do “Queermuseu” e das acusações de pedofilia dirigidas a Caetano Veloso, seu marido. A trajetória de Alexandre Frota, do Pros, e de Marco Feliciano, do PL, são exemplos de como o método funciona, ela diz.
Em 2017, o então postulante a deputado federal estava no PSL de Bolsonaro e atacou três dos principais artistas brasileiros que lutaram contra a ditadura militar —Caetano, Gilberto Gil e Chico Buarque. Frota acabou sendo eleito para a Câmara dos Deputados.
Já o deputado federal e pastor Marco Feliciano afirmou que Caetano era pedófilo e que havia estuprado Lavigne. Os dois têm um relacionamento desde que ela era menor de idade. Feliciano conseguiu se reeleger em 2018, seguiu aliado a Bolsonaro no pleito deste ano e, mais uma vez, foi reconduzido ao cargo.
Mas isso tudo tomou uma proporção maior para o campo artístico este ano. Bater boca com determinado artista hoje é uma forma de chegar àquele que é hoje o coração da audiência na internet —o campo do entretenimento. É como se candidatos vissem essas celebridades como uma espécie de trampolim para chegar ao ecossistema de fofoca, influenciadores e artistas.
Sócia de Caetano desde os 17 anos —e emancipada deste então—, Lavigne afirma que é este mesmo discurso de ataques a artistas que desembocou no que chama de “demonização da Lei Rouanet” e no desmonte do setor. Agora, no entanto, diferentemente de 2018, diz ela, os artistas parecem ter finalmente percebido a importância do pleito para o setor em 2022.
É neste momento que Lavigne assumiu o papel de articuladora com mais força. Ela aproveitou a estrutura do grupo 342 Artes, que já vinha atuando em outras causas, como o Ato Pela Terra, em Brasília, e passou a atuar também nas eleições.

Mesmo que nem sempre com intermédio da produtora, os artistas ganharam protagonismo nas campanhas deste ano. Um dos movimentos mais expressivos foi pela campanha de voto útil em Lula, com artistas fazendo o “L” em vídeos nas redes sociais. Ainda assim, a corrida não foi liquidada no primeiro turno e levantou um debate sobre qual é o peso efetivo do posicionamento da classe.
“Em nenhum minuto achei que a gente faria essa tal diferença. Uma eleição é a soma de muitas coisas, da rua, sem desanimar nas redes”, diz ela, que afirma ter se surpreendido com a votação expressiva que o presidente obteve nas urnas.
Citando pesquisadores como Pedro Lavareda e Fabio Malini, ela compara o pleito à Copa do Mundo e repete uma das máximas dos tempos de política na internet —a de que eleição só se ganha com onda e com emoção.
“O que a gente sabe fazer de melhor é levar emoção para as pessoas. Artistas realmente puxam onda, temos que atuar como linha de frente. Um clipe é uma onda, uma dancinha é uma onda. Essa é a nossa partezeinha, partezinha pequena mesmo, mas uma muito significativa.”

É justamente aí, diz ela, que reside um campo mal aproveitado pela campanha do petista —o mesmo explorado por ela durante a pandemia, quando viralizaram vídeos de Caetano, em casa, assistindo a novelas, comendo paçoca ou comentando notícias do jornal.
“Você precisa mostrar intimidade, mostrar que é pessoal, e é isso que está faltando. Lembra quando bombou o vídeo do Lula malhando a perna? As pessoas querem saber se ele come biscoito com leite.”
Apesar do papel de articuladora que assumiu durante a campanha, Lavigne rechaça a possibilidade de entrar para a política institucional —”Deus me livre, por nada nesse mundo”— e afirma que, no futuro, pretende seguir organizando shows, eventos e, no máximo, atos políticos.
“Numa coisa o Ciro Gomes tem razão. A gente já está com a vida ganha. É mais fácil para a gente fazer isso [se articular], porque outras pessoas teriam que parar tudo o que estão fazendo ou não teriam equipe como a que eu tenho.”
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