Lambendo as botinas de Bolsonaro, Moro expõe como condenou Lula sem provas – UOL Confere

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM. No UOL, Reinaldo trata principalmente de política; envereda, quando necessário – e frequentemente é necessário -, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.
Colunista do UOL
29/10/2022 17h14
Nesta sexta, assistiu-se a uma cena insólita. Jair Bolsonaro teve um de seus conhecidos chiliques com a imprensa, quando confrontado com uma mentira que contou, e virou as costas aos jornalistas, não sem antes dar um peteleco no púlpito de onde falava, o que valeu pelo famoso murro na mesa. E quem ficou para tentar justificar a estupidez que dissera? Ele! Sergio Moro. Uma coisa passou despercebida: ao fazê-lo, o agora senador eleito aplicou o mesmo mecanismo mental safado que o levou a condenar sem provas Luiz Inácio Lula da Silva, abrindo caminho para a eleição de Bolsonaro, a quem foi servir na sequência. E cujos sapatos lambe ainda agora, depois de ter tido o traseiro chutado. Já volto ao ponto.
Considero Moro, já escrevi aqui e disse em todo canto, a figura mais desprezível da vida pública brasileira. Em muitos aspectos, mais do que Bolsonaro, que sempre foi e sempre se mostrou um fascistoide. Nunca disfarçou. Votou nele quem quis, sabendo muito bem o que ele pensava. Os que fizeram essa escolha ou concordavam com as barbaridades que dizia e diz ou consideraram que, contra o PT, valia qualquer um, inclusive aquele que já tinha deixado claro considerar estupro matéria de merecimento — distinção cabível apenas às bonitas. “Ah, eu não sabia…” Sabia, sim. Sabia e votou. Mas sigamos.

Moro ganha pontos na escala da abjeção porque tentou dar verniz jurídico à sua cruzada reacionária e à sua luta política. Usava a toga para se esconder e para produzir indignidades jurídicas. Amplos setores da imprensa, diga-se, caíram na conversa. Também porque quiseram. Bastaria, para afastar o mal, que consultassem as leis, o que não fizeram. Em vez disso, preferiram transformar vazamentos ilegais, oferecidos por procuradores e delegados, em esforço de moralização da política.
Processos fascistizantes das sociedades não ocorrem por acaso. Na origem, sempre está o abandono, por camadas importantes da sociedade, dos fundamentos da democracia. Nota à margem: leio sempre vetustos colunistas a cobrar um mea-culpa do PT. É mesmo? Quando é que vão se desculpar pela condescendência com o mal? Mas isso fica para outra hora. Voltemos ao caso.
Bolsonaro dava uma entrevista coletiva. Constatou e indagou um jornalista:
“O sr. voltou a repetir agora que o ex-presidente negociou a ida dele ao Complexo do Alemão com narcotraficante, com chefe do narcotráfico. A imprensa toda que acompanhou a agenda, que acompanha a política do Rio de Janeiro, sabe que quem organizou aquela agenda foi Rene Silva, um comunicador, que a imprensa, todos, conhecem há 10, 12 anos aqui no Rio de Janeiro. Então eu queria saber por que o sr. tem insistido nessa informação, nessa mentira…”

O presidente o interrompeu:
“Ô, você me chama… Você tem moral para me chamar de mentiroso?

O jornalista responde, com acerto:
“Essa informação é uma mentira.”

O corajoso “Mito”, diante da desmoralização pública, ainda tentou engrolar alguma coisa, mas deu seu tapinha no púlpito e virou as costas, amparado por… Moro! Por incrível e estupefaciente que pareça, o Leporello resolveu ficar, assumindo ares de porta-voz. O jornalista, então, indagou:
“O sr. quer responder por ele, ex-ministro?”

E o senador eleito disparou a sua fala indecente, indecorosa, indigna, nojenta, que é uma síntese da lama em que essa gente mergulhou o país. Afirmou, lambendo as botinas de Bolsonaro:
“Não, não… Na verdade, essas questões são relacionadas ao apontamento de que existe uma política de insegurança pública dos governos do PT…”
E pensar que figura tão deletéria era tida, até outro dia, como oráculo no combate à corrupção.
Perceberam? Moro condenou Lula sem provas. Ele nunca aceitou o meu desafio, na sua escancarada covardia, de dizer em quais páginas de sua sentença estão as evidências de que Lula era culpado. Na verdade, em embargos de declaração, escreveu com todas as letras que o tal tríplex de Guarujá nada tinha a ver com contratos da OAS com a Petrobras. Era a confissão da inexistência das provas.
E por que ele condenou? Basta ler o lixo que produziu para constatar: porque ele achava importante lutar contra o PT. Usava o aparelho judicial para a luta política, pouco importando que estivesse a condenar um inocente.
Vejam a resposta absurda que deu. Todos sabem que Rene Silva não é traficante. Como destacou o repórter, é líder comunitário, que atua na área cultural, há muito tempo. Ninguém menos do que o presidente da República o acusa de crime grave. O jornalista não chamou Bolsonaro de “mentiroso”, embora merecesse tal qualificação, mas demonstrou que ele estava contando uma mentira.
E como é que Moro justifica tal absurdo, em seu espetáculo grotesco de servidão voluntária? Assim:
“Na verdade, essas questões são relacionadas ao apontamento de que existe uma política de insegurança pública dos governos do PT…”
Entenderam?
Na luta contra o PT, vale tratar um militante cultural como narcotraficante, como valeu, no passado, condenar um inocente.
Quando é que os setores da imprensa a que me referi, colunistas em particular — alguns tendo feito fama e fortuna —, vão, afinal de contas, fazer o mea-culpa?
“Apoiamos um sujeito que, quando juiz, condenava sem provas e que, como político, justifique que se chame uma pessoa inocente de narcotraficante”.
Esse reconhecimento é importante. Para que não se invente um outro falso herói daqui a pouco.
Segue vídeo.


** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
Reinaldo Azevedo
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