COP27 aplaude eleição de Lula, mas quer revisão de compromissos do Brasil – UOL Confere
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Jamil Chade é correspondente na Europa há duas décadas e tem seu escritório na sede da ONU em Genebra. Com passagens por mais de 70 países, o jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparência Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Vivendo na Suíça desde o ano 2000, Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti. Entre os prêmios recebidos, o jornalista foi eleito duas vezes como o melhor correspondente brasileiro no exterior pela entidade Comunique-se.
Colunista do UOL
03/11/2022 08h32
A cúpula da ONU (Organização das Nações Unidas) espera que o desembarque do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no cenário internacional mande “sinais fortes” contra o desmatamento no mundo. O UOL apurou com exclusividade que, para retomar sua postura de protagonista internacional, o Brasil será cobrado a refazer seus compromissos de redução de emissões, considerados como insuficientes e verdadeiras “pedaladas ambientais”.
Lula decidiu ir à Conferência da ONU sobre o Clima que ocorre na próxima semana no Egito, inclusive como um sinal claro de que sua gestão irá colocar a questão climática no centro de sua agenda e na busca de recuperar a credibilidade internacional do país. Em suas declarações, ele já deixou claro que está ciente da pressão internacional e que está disposto a voltar a cooperar.
Sua ida ocorre depois que o governo do Egito, que organiza o evento, enviou uma carta ao presidente eleito para oficialmente convidá-lo. Entre diplomatas estrangeiros, a presença de Lula irá ofuscar a delegação oficial do Brasil, liderada ainda por representantes de Jair Bolsonaro.
Mas o UOL apurou que, na ONU, a expectativa é de que Lula não apenas mude o discurso, mas que haja uma revisão real da realidade do meio ambiente no país.
Respondendo ao UOL, o vice-secretário-executivo da Convenção da ONU para Mudanças Climáticas, o indiano Ovais Sarmad, deixou claro que a entidade comemora a eleição de Lula. Mas aponta para os caminhos adiante.
“Saudamos os resultados das eleições no Brasil e queremos dar as boas vindas a Lula em Sharm El Sheik”, disse Sarmad, que tem o cargo de secretário-geral assistente da ONU, um dos postos mais altos na diplomacia mundial.
“Essa é uma mudança importante que temos visto no nível político que deve mandar um sinal forte sobre o desmatamento que vemos em várias partes do mundo, em especial na Amazônia”, disse.
Segundo ele, as florestas são fundamentais no que se refere às emissões e, portanto, a eleição brasileira foi considerada como positiva. “Esse resultado (da eleição) é muito importante e bem-vindo”, disse Sarmad. “Vamos trabalhar com todos os atores e o Brasil é uma das peças extremamente importantes, especialmente na questão florestal”, completou.
Pessoas do mais alto escalão da ONU e com amplo acesso ao secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, admitiram ao UOL que existe uma esperança de que o governo Lula irá refazer e reapresentar à comunidade internacional novos compromissos nacionais, no que se refere à redução de emissões. A proposta apresentada por Bolsonaro foi duramente criticada e vista como uma tentativa do governo de trapacear a comunidade internacional.
Segundo esses negociadores, há uma disposição real do mundo em ajudar o Brasil a lidar com o desmatamento, inclusive com o retorno do financiamento externo. Mas não haverá “cheque em branco” e, antes de um novo acordo, o que o mundo quer ver é se o novo governo brasileiro tem novas metas e planos. No Egito, isso estará no centro das atenções.
Na semana passada, num verdadeiro obituário da política de meio ambiente do Brasil, o Programa da ONU para Meio Ambiente publicou seu informe anual sobre emissões revelando que o governo de Jair Bolsonaro vai na direção contrária entre as principais potências do mundo no que se refere ao combate às mudanças climáticas.
A estratégia do Itamaraty e de outras autoridades nacionais de mentir à comunidade internacional simplesmente fracassou.
O documento aponta que as metas estabelecidas pelos maiores responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa não estão sendo suficientes para limitar o aquecimento global dentro dos limites definidos pelo Acordo de Paris, abaixo dos 2 graus Celsius e com esforços para que o limite seja de 1,5 grau Celsius até 2100.
O que ainda deixou a ONU preocupada é que, apesar das metas anunciadas pelos governos durante a Cúpula em Glasgow, no ano passado, as políticas, medidas e ações sequer correspondem ao que foi assumido pelas diplomacias de todo o mundo.
Para a entidade, não há opção: ou governos aumentam sua ambição ou simplesmente o desastre climático será uma realidade.
Mas o informe revela um outro aspecto: todo o esforço do governo de Jair Bolsonaro de mostrar ao mundo, em Glasgow, que estava assumindo uma postura de defesa do clima não passava de uma farsa.
No ano passado, o governo tentou desmontar a pressão internacional anunciando compromissos de redução de desmatamento e adotando um novo tom nos discursos. Mas as taxas de destruição da floresta continuaram a subir, enquanto os órgãos para lidar com a situação da Amazônia continuaram sem recursos.
Para Carlos Rittl, especialista em política internacional da Rainforest Foundation da Noruega, o Brasil “se destaca negativamente” no novo informe da ONU.
O país aparece como o país dentro do G20, que, ao invés de aumentar a ambição climática em seus novos compromissos, apresentou metas que vão levar a um aumento das emissões em 2030 em relação às propostas anteriores. Apenas o México também tem um desempenho que vai na contramão do mundo, mas em taxas bem mais modestas que a brasileira.
“Ou seja, o mundo está caminhando rápido para o caos climático, há pouco avanço nas metas dos maiores emissores, mas só um país que torna o desafio de combater o aquecimento global ainda mais difícil: o Brasil de Bolsonaro”, disse Rittl.
“Além disso, o relatório também mostra que enquanto as emissões de uso da terra de alguns países, como China, Índia, Estados Unidos e União Europeia foram negativas em 2020, no Brasil as emissões aumentaram, por conta do aumento do desmatamento”, destacou. “A guerra do Bolsonaro contra a Amazônia tem impacto para o mundo inteiro”, disse.
O informe ainda revela que o Brasil, em sua proposta, nem sequer cumpre com todos os critérios esperados das maiores economias do mundo, como transparência, a publicação de um plano e um acompanhamento anual.
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