Lula tem de abandonar velhas ideias do PT para recuperar economia do Brasil – UOL Economia

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Economista especializado em regulação, defesa da concorrência e áreas correlatas. Atualmente é sócio-diretor da Microanalysis Consultoria Econômica, coordenador do curso de regulação da Fipe e professor de economia da FGV-Law/SP. Foi Conselheiro do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e secretário-adjunto da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda.
03/11/2022 04h00
Nesse último domingo, o país democraticamente decidiu por eleger mais uma vez Lula presidente da república. Podemos até discutir as razões para isso, mas o fato que interessa é que a partir de 1º de janeiro de 2023, o novo presidente será empossado e terá um desafio econômico enorme a enfrentar.
Com taxas de desocupação (desemprego) e subutilização que vêm caindo, mas ainda se encontram elevadas (8,7% e 20,5% respectivamente, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE), níveis de pobreza alarmantes, conforme consta em estudo da Fundação Getúlio Vargas denominado “Mapa da Nova Pobreza” de junho de 2022, a questão social certamente deve ser prioridade do novo governo.

Se olharmos sob um ponto de vista estrutural de mais longo prazo, perceberemos que os desafios serão bem mais intensos. Nosso nível educacional continua extremamente baixo, a saúde continua agonizando e o problema de segurança pública está bem longe de ter sido equacionado. Em outras palavras, a demanda por investimentos públicos nessas áreas continua enorme.
Sob o ponto de vista fiscal, ao contrário do que alega o atual governo, a trajetória das contas públicas indica que voltaremos a incorrer em constantes déficits a partir do próximo ano. Sem o efeito do imposto inflacionário, sem a arrecadação extra advinda do aumento dos preços dos combustíveis e com forte demanda por gastos sociais e por reajuste do funcionalismo público, a situação será de difícil administração.
Em realidade, hoje a situação econômica do país é muito pior do que quando Lula assumiu o governo em 2003, o que certamente o colocará sob mais pressão. Naquela época, as bases para o crescimento econômico estavam traçadas. Tínhamos aprovado a Lei de Responsabilidade Fiscal e o regime de metas de inflação já estava vigente.
A transição do governo de Fernando Henrique Cardoso para o Lula foi fundamental e o diálogo aberto entre as respectivas equipes econômicas ajudou sobremaneira a entender-se os desafios da época. E neste aspecto, o “time” do então Ministro Palocci foi peça-chave para consolidar as bases econômicas que permitiram ao país crescer por anos, aproveitando, inclusive, o boom das comodities que se seguiram nos anos subsequentes.
Fato é que a partir da substituição de Palocci por Guido Mantega, o rumo da gestão econômica do país começou a mudar e a irresponsabilidade fiscal passou a fazer parte do cardápio do segundo governo Lula. Decisões já naquele período iniciaram uma sequência de gastos públicos correntes que culminaram com a crise das contas públicas durante o governo Dilma.
Obviamente essa nova postura à época cobrou um preço elevado da sociedade brasileira no final da década passada, com o retorno da inflação, elevação desemprego e retrocesso nos avanços obtidos no lado social durante o próprio governo Lula. A grande lição que deve ser tirada desse processo é que a economia não é algo estático. Ao contrário, tem um forte componente dinâmico.
O que se fez no passado é a maior causa do resultado econômico que observamos hoje. Da mesma forma, o que se faz hoje certamente se refletirá no futuro; e é exatamente neste ponto que entendo que Lula deverá rever boa parte de suas promessas de campanha, para o bem do país.
Lula, além de não se comprometer explicitamente com uma gestão fiscal responsável, afirmou que tomaria uma série de medidas que foram causa de muitos dos problemas econômicos que vivemos hoje. Dentre elas, a interferência sobre os modelos de precificação de estatais e uso de bancos públicos para fornecer crédito subsidiado.
Também fazem parte de suas promessas ruins maior participação do Estado na economia, com retomada do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), eventuais suspensões das privatizações já em curso e a revisão das reformas trabalhista e previdenciária.
No fundo, o que Lula sugeriu fazer durante sua campanha foi implementar um conjunto de velhas ideias que implicarão mais descontrole dos gastos públicos, elevação da ineficiência produtiva e alocativa no setor privado e distorções da estrutura de sinalização de preços na economia, inibindo investimentos privados em áreas fundamentais para a retomada do crescimento do país.
A esperança é que o futuro presidente entenda que venceu com apoio de uma coalizão de forças e que passe a escutar seus novos interlocutores, que têm uma visão mais ampla de mundo e da economia dos que os velhos desenvolvimentistas enraizados no PT.
Em outras palavras, seria fundamental que seu pragmatismo político também se transformasse em pragmatismo econômico, deixando de lado a ideia de um Estado Empreendedor e motor da economia e concentrando seus esforços no que é de fato relevante para os mais pobres: uma política sustentável e consistente de distribuição de renda.
E isso, acompanhado de investimento público de qualidade onde realmente importa e que fará a diferença para as futuras gerações menos abastadas: saúde, educação, segurança pública e saneamento básico.
Trilhado esse caminho, o ambiente de negócios no país melhorará substancialmente, elevando o investimento privado para níveis que sejam capazes de absorver uma boa parte da força de trabalho hoje desempregada ou subempregada.
A grande questão é saber se Lula será capaz de aprender com os erros passados, dar a guinada necessária e deixar o legado positivo que supostamente pretende, conforme afirmou tantas vezes nos últimos meses. Mas isso só saberemos a partir dos seus primeiros movimentos na construção do seu futuro governo.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
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