O que os governos Lula e Bolsonaro discutiram sobre combustíveis – VEJA

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O setor de biocombustíveis, que aguardava a edição de uma medida provisória para corrigir distorções e aperfeiçoar o programa RenovaBio, precisará aguardar a posse de Lula. O lobby dos usineiros impôs entraves ao processo a ponto de o Ministério de Minas e Energia (MME) desistir de fazer qualquer movimento até o final deste governo. Nesta semana, coordenadores da equipe de transição do setor se reuniram com o ministro Adolfo Sachsida, que se comprometeu ainda a não tocar outras medidas importantes para o setor nesta reta final, como a venda de ativos da Petrobras.
O RenovaBio é uma política de Estado para mitigação de emissões dos gases causadores do efeito estufa no setor de transporte por meio do incentivo ao consumo e à ampliação da produção de biocombustíveis no país. Nos bastidores, o Renovabio já estava sendo chamado de “Bolsa Usineiro”, por render bilhões aos produtores de etanol.
As mudanças que estavam sendo articuladas pelo MME visam principalmente estabilizar o patamar de preço dos créditos de descarbonização, os chamados CBIOs, que sofreram uma escalada de mais de 900%. Estima-se que o aumento no preço dos CBIOs, que este ano chegou a subir R$ 60 e alcançar o patamar de R$ 200, gera impacto de 20 centavos por litro no preço final do diesel e da gasolina.
Ao assumir como ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida iniciou discussões sobre a modernização do programa e, desde então, representantes do setor têm se reunido com técnicos da pasta para debater as melhorias e aguardam a edição da MP, que acabou ficando para depois das eleições. As discussões abordam aspectos conceituais e operacionais do programa e dois pontos que têm ganhado visibilidade: as propostas para valorizar o CBIO em outros mercados e a alocação das obrigações e custos do RenovaBio.
No Brasil, o fato de as distribuidoras de combustíveis serem responsáveis por comprar os créditos da cadeia produtores – ao contrário do praticado em outros países – é um dos principais alvos de crítica, por gerar desequilíbrio no mercado. As distribuidoras não são responsáveis e nem possuem competência para investir em novos biocombustíveis, o que limita o investimento em tecnologias renováveis. De acordo com o programa, as distribuidoras são obrigadas pela política a adquirir os CBIOs em determinado prazo. A parte geradora dos créditos – os produtores de etanol – não tem data limite para vendê-los.
PUC-Rio defende mudanças
O encarecimento das transações é um dos pontos que requerem mudança, segundo estudo realizado pelo Departamento de Engenharia Industrial da PUC-Rio, que analisou o programa e reforçou a necessidade de aperfeiçoamento. Os pesquisadores recomendam a inserção de novos mecanismos para a geração de crédito com projetos ou meios alternativos, como chamamentos públicos e editais de fomento. Os novos meios possibilitariam a geração de créditos que vão além dos biocombustíveis.
O trabalho, desenvolvido pelos professores Antônio Thomé, Allan Cormack, Milena Mansur, Frances Blank, Amanda Chiote Cabral e Lia Piovesan, identificou que a manutenção da sustentabilidade do RenovaBio exige que as disfuncionalidades sejam corrigidas. Na opinião dos especialistas, o aperfeiçoamento passa pela alocação justa de seus custos, com as refinarias de petróleo e os importadores de derivados, geradores primários das emissões, assumindo responsabilidades.
A comercialização dos créditos de descarbonização é um ponto de destaque na pesquisa, que sugere a adoção de um valor-teto para evitar a especulação e alta excessiva no preço dos CBIOs. O valor teto é utilizado na Califórnia, estado norte-americano que possui uma lei similar (LCF), de 2009, em que o RenovaBio foi inspirado. É indicada ainda a criação de mecanismos para garantir a comercialização de CBIOs suficientes para o cumprimento das exigências da lei.
Ao comparar leis em vigor nos Estados Unidos, que possuem créditos de descarbonização semelhantes, os pesquisadores evidenciam a distorção no RenovaBio. Apenas no Brasil o setor de distribuição de combustíveis, parte final da cadeia, é responsável por compensar as emissões feitas na produção e refino.
Lula na COP 27
Os discursos do presidente eleito Lula na COP 27, destacando o protagonismo do Brasil para conter a degradação ambiental, deixaram o setor otimista com a continuidade e o aperfeiçoamento do RenovaBio.
Entretanto, as indicações do economista Miguel Ivan Lacerda e de Evandro Gussi para a equipe de transição deixaram parte do setor de combustíveis apreensivo. Lacerda é considerado o “pai” do programa e contrário a mudanças que corrigiriam distorções criadas por ele mesmo. Atualmente ocupa o cargo de presidente do INMET e é próximo do governo Bolsonaro. Gussi, por sua vez, é presidente da União da Indústria de Cana de Açúcar e foi forte apoiador de Bolsonaro durante as eleições.
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