O que Bolsonaro vai fazer nos últimos dias de governo – Gazeta do Povo
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O presidente Jair Bolsonaro (PL) quer encerrar o mandato decretando uma medida provisória (MP) para prorrogar a desoneração de impostos sobre os combustíveis. O assunto foi debatido no governo nas últimas semanas e ganhou força, segundo afirmam interlocutores governistas. Os últimos dias do governo de Bolsonaro também podem ser marcados por medidas para beneficiar os caminhoneiros, desbloqueio de verbas do orçamento, sanções (ou vetos) de leis e um indulto de Natal mais enxuto do que em anos anteriores.
A manutenção de impostos federais zerados sobre os combustíveis custa R$ 54 bilhões aos cofres da União, e já está prevista na proposta orçamentária de 2023 – o que evita a obrigatoriedade de que haja, ao mesmo tempo, a adoção de medidas compensatórias da isenção fiscal. Porém, a medida não tem o apoio do gabinete de transição do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – pelo menos não até este momento.
O futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), evitou comentar o assunto em coletiva de imprensa na última terça-feira (13) e disse que aguardaria a aprovação do Orçamento de 2023 e da PEC fura-teto para debater o tema. “Eu vou olhar para esses números, para o que o Congresso aprovou e o que e quais são as projeções do Orçamento para levar ao presidente [Lula] uma definição do que fazer”, declarou. O gabinete de transição de Lula defende um monitoramento sobre a evolução dos preços dos combustíveis, do preço do barril de petróleo e do dólar antes de tomar uma decisão.
Bolsonaro está disposto a manter zerados os tributos federais para cumprir promessa feita à população ainda durante o período eleitoral. Alguns interlocutores do governo sustentam, inclusive, que Bolsonaro analisa outras propostas que possam causar impacto em 2023, mas que tenham previsão orçamentária, ainda que não sejam de interesse do governo eleito.
Aliados afirmam que o presidente não vai adotar medidas para assegurar uma transição alinhada com Lula. “Não há clima de fim de governo. Ninguém está limpando a gaveta e se preparando para transição alguma na Presidência”, diz um aliado. A ideia de Bolsonaro é manter uma postura firme enquanto presidente e tomar decisões baseadas apenas no que sua equipe ministerial aconselha.
Outra proposta de Bolsonaro que pode ser encaminhada ao Congresso por MP é um texto para atender os caminhoneiros, categoria que apoiou a reeleição do presidente. A MP regulamentaria o documento de transporte eletrônico (DT-e), plataforma tecnológica digital que permitirá unificar os documentos e as informações de obrigações administrativas exigidas em operações de transporte de carga. O DT-e foi sancionado por Bolsonaro em setembro do ano passado. Mas ainda precisa de regulamentação.
A medida é aguardada por todo o setor de transporte de cargas, sobretudo pelos caminhoneiros autônomos. Ela atende a uma demanda da categoria por contratação direta dos autônomos pelas empresas embarcadoras, as donas das mercadorias.
Na mesma MP, também são aguardados dispositivos que regulamentem a transformação do imposto consumido por caminhoneiros em créditos, afirma o presidente do Sindicato dos Caminhoneiros de Ourinhos (SP), Júnior Almeida, o “Júnior de Ourinhos”.
A proposta consiste em um estímulo para a empresa contratar o autônomo através de incentivos fiscais, como o retorno de crédito do ICMS sobre o óleo diesel para o caminhoneiro por meio de um fundo criado para possibilitar que o transportador possa fazer dedução fiscal ou no frete de tudo que consumir. O modelo foi inspirado no que se aplica às empresas do transporte rodoviário.
À Gazeta do Povo, Júnior diz estar confiante de que a proposta seja encaminhada ao Congresso. Mas reconhece que ela não é consensual no governo, a despeito de se tratar de uma promessa firmada entre o governo e a categoria, quando o governador eleito de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), era o ministro da Infraestrutura.
“O presidente quer assinar [a MP]. E é o que a categoria espera. Tarcísio trabalhou quatro anos por isso. Atuamos para segurar a greve, fomos parceiros e ajudamos a construir algumas vitórias. E agora o governo não vai assinar algo que tira o caminhoneiro da exploração?”, questiona Júnior. Em suas redes sociais, ele fez um apelo para que Bolsonaro assine a proposta.
Sobre a desoneração dos combustíveis, Júnior confirmou saber que a medida está no radar do governo e pode ser encaminhada ao Congresso ainda este ano. “Vai ser mantido porque não se trata só de um imposto que é bom para o caminhoneiro; é um imposto que falamos do setor produtivo inteiro. Hoje, o combustível, principalmente o óleo diesel, tem a sua função como matéria-prima de inúmeros setores. A informação que temos é que ele vai manter”, afirma.
Outra medida de fim do mandato esperada de Bolsonaro e do governo é a sanção (ou veto) de leis oriundas de propostas aprovadas no Congresso, o tradicional indulto natalino e o desbloqueio de recursos orçamentários que haviam sido contingenciados.
O governo federal tem R$ 15,5 bilhões em verbas bloqueadas nos ministérios, em geral para evitar despesas além do teto de gastos. O governo aguarda a aprovação da PEC fura-teto para desbloquear esses recursos. Além de abrir espaço no orçamento do ano que vem para o futuro governo de Lula, a PEC também autoriza o atual governo a fazer mais despesas sem ferir a regra do teto e, assim, fechar as contas de 2022.
O governo tem estudado, porém, o envio de medidas provisórias prevendo a abertura de crédito extraordinário fora do teto para agilizar o processo em alguns ministérios, como Bolsonaro fez na quinta-feira (15) ao editar uma MP que abre crédito extraordinário no valor de quase R$ 7,56 bilhões para o Ministério do Trabalho.
O ministro da Educação, Victor Godoy, garantiu na quarta-feira (14) que o governo vai desbloquear recursos e abrir espaço no orçamento da pasta para honrar compromissos e assegurar a manutenção das atividades da pasta – responsável, por exemplo, por financiar as universidades federais.
Segundo ele, os recursos serão destravados por meio de uma MP. “Teremos uma medida provisória que abrirá espaço no orçamento da educação permitindo a total liberação dos R$ 2 bilhões do financeiro e o desbloqueio parcial do orçamento. Ainda não temos esse número [do orçamento]. Mas temos a sinalização de que todas as políticas essenciais serão garantidas até o fim do ano, em especial a do livro didático”, afirmou Godoy em audiência pública na Comissão de Educação para prestar esclarecimentos sobre os recentes contingenciamentos.
A sanção de leis também é esperada por Bolsonaro. Até 28 de dezembro, ele tem que sancionar integralmente ou parcialmente, ou até mesmo vetar, nove projetos de lei aprovados no Congresso.
Um deles institui a política de doação de equipamentos eletrônicos a órgãos públicos. Outro prevê regras para a negociação de criptomoedas. Um terceiro trata da instituição da engenheira Carmen Portinho como patrona do urbanismo no Brasil. Outra proposta prorroga a dedução do Imposto de Renda para doações a programas de saúde. Também está prevista a proposta que considera pessoa com deficiência aquela com perda auditiva unilateral.
Outras propostas estabelecem norma para tornar equivalente a posição de advogados e do juiz nas audiências de instrução e julgamento, a previsão de prótese cardíaca por cateter no Sistema Único de Saúde (SUS), a regulamentação da profissão de instrumentador cirúrgico, e o aumento da margem do crédito consignado para servidores públicos federais.
Sobre o tradicional indulto natalino, é esperado que Bolsonaro decrete o benefício para condenados, sem a concessão específica para integrantes das Forças Armadas e profissionais de segurança pública que estejam encarcerados – como havia feito em anos anteriores.
O texto elaborado pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), ligado ao Ministério da Justiça, e submetido a Bolsonaro, não contempla condenados por crimes contra a Administração Pública, em especial aqueles condenados por peculato, concussão, corrupção passiva, corrupção ativa e tráfico de influência, e aqueles condenados por lavagem de dinheiro, crimes previstos na Lei de Organizações Criminosas e por pedofilia.
Desde que perdeu o segundo turno para Lula, Bolsonaro em geral tem se mantido recluso. Mas vem tomando decisões nas nas últimas semanas. Ele vetou integralmente, na terça-feira (13), um projeto de lei que proibiria a chamada “arquitetura hostil” – construções para afastar pessoas do espaço público e dificultar o acesso de grupos como idosos, crianças ou pessoas em situação de rua.
Bolsonaro também vetou integralmente na quarta-feira (14) um projeto de lei que responsabiliza sócios por dívidas de empresas. Trata-se do procedimento conhecido como desconsideração da personalidade jurídica – pelo qual se pode cobrar, dos sócios ou responsáveis, obrigações da empresa.
Na segunda-feira (12), Bolsonaro renovou a concessão do canal de televisão SBT, que havia se encerrado no início de outubro. A cada 15 anos é necessário confirmar os direitos de transmissão de uma emissora de TV. No caso de rádios, são 10 anos.
Na sexta-feira da semana passada (9), ele instituiu a criação da Ordem do Mérito Princesa Isabel para homenagear pessoas e entidades que tenham prestado “notáveis serviços” relacionados à proteção e à promoção dos direitos humanos.
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