Política fica de fora das comemorações e seleção da Argentina não deve ir à Casa Rosada – Yahoo Noticias

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Quando Gonzalo Montiel converteu o último pênalti que consagrou a seleção argentina como Campeã do Mundo milhares de argentinos — sem exagero algum — desabaram a chorar. As imagens de pessoas se abraçando, pulando, cantando e dançando nas ruas de todo o país foram emocionantes e confirmaram o que alguns analistas, no dia seguinte, definiram como “um momento de catarse", de uma sociedade que precisava desesperadamente de um motivo para comemorar. A seleção liderada pelo craque Lionel Messi, já chamada de seleção do povo, uniu gerações de argentinos como fazia muitíssimo tempo não se via no país.
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Jornalistas esportivos choraram ao vivo após o final de um jogo sofrido, que deixou muitos torcedores exaustos. Quando finalmente a seleção comandada pelo técnico Lionel Scaloni, agora famoso por ter criado o método scaloneta, venceu, o choro foi inevitável. Sem bandeiras políticas e apenas com a camiseta da seleção nacional de futebol, os argentinos saíram de suas casas e foram ao encontro de compatriotas para festejar. Não se falou em peronismo e antiperonismo, em kirchnerismo e antikirchnerismo, e o nome de dirigentes políticos não foi mencionado, pelo contrário, isso foi intencionalmente evitado. Os argentinos deixaram a política de fora de uma festa que teve o futebol, e apenas o futebol, no centro da cena.
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Como escreveu Martin Rodríguez, colunista do ElDiarioAR, “esta seleção é uma coisa que deu certo neste país, no qual quase nada dá certo há um bom tempo. O sucesso de Scaloni, Aimar, Samuel e Messi não demorará em ser trasladado à política. A equipe tem suas estatísticas, sua fórmula e seu espírito e isso vai contagiar. Mas numa era cuja religião oficial quis nos dizer que tudo era política, Messi ficou quieto. Foi um homem introvertido, discreto e dono de uma enorme família maravilhosa quem liderou um grupo de garotos saudáveis”.
A seleção de Scaloni e Messi conseguiu o que nenhum político argentino consegue há muito tempo: gerar orgulho entre milhões de argentinos. Cansados de uma classe política desgastada por escândalos de corrupção e a péssima administração de um país que vive às voltas com crises econômicas, sociais e financeiras, os argentinos encontraram na seleção vitoriosa um motivo para voltar a sentir-se orgulhosos de seu país.
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— Acumulamos décadas de estagnação, e a pandemia foi um período que complicou ainda mais um cenário que já era difícil. A vitória na Copa gerou uma catarse nacional, um momento no qual todos descarregamos angústias, choramos e botamos pra fora sentimentos que estavam guardados — comenta Ignácio Labaqui, professor da Universidade Católica Argentina (UCA).
Para ele, “a maioria dos que saíram às ruas para comemorar não estão interessados em política e a política deverá aprender do que estamos vivendo”.
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A seleção mostrou sua independência da política nacional em vários momentos da Copa. O ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019), que esteve no Catar, cogitou fazer uma visita aos jogadores e foi comunicado informalmente de que não seria uma boa ideia. No final de novembro, após a morte de Hebe de Bonafini, uma das fundadoras da ONG Mães da Praça de Maio e muito vinculada politicamente ao kirchnerismo, a Casa Rosada tentou convencer a Associação de Futebol da Argentina (AFA) a que os jogadores da seleção usassem uma braçadeira preta, em sinal de luto, e a reposta foi um não taxativo.
As portas da Casa Rosada estão abertas para a seleção campeã do mundo, mas ninguém em Buenos Aires acredita que Messi e seus colegas irão ao palácio de governo, como o fez a seleção de 1986, quando foi recebida pelo então presidente Raúl Alfonsín (1983-1989). Na época, o líder era Diego Maradona, um esportista que nunca escondeu suas preferências políticas — passando pelo kirchnerismo, chavismo na Venezuela e castrismo, em Cuba. Mas Messi, nesse aspecto — e em muitos outros, relacionados à sua vida pessoal — , não poderia ser mais diferente do que Maradona.
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— Faz uns 20 ou 25 anos que não tínhamos um motivo como este para comemorar. Havia uma necessidade coletiva de fazê-lo, pode parecer óbvio, mas foi isso o que vimos desde que ganhamos a Copa — afirma Marcos Novaro, sociólogo e professor da Universidade Nacional de Buenos Aires.
Ele concorda em que uma ida dos jogadores ao palácio de governo não faria qualquer sentido, e, inclusive, poderia incomodar muita gente:
— A política não tem nada a ver com esta seleção, que é profissional, tem valores muito fortes como a importância da família… são rapazes de bairro, pessoas muito simples, não são celebridades. E é isso o que cativou os argentinos.
As imagens de jogadores como Messi ou Angel Di Maria abraçando suas mães e seus filhos causam essa identificação na sociedade que os especialistas acreditam que, com o tempo, poderia acabar tendo um impacto na política. Não porque os jogadores assim o queiram, mas porque a força do que os argentinos estão vivendo certamente será expansiva.
O modelo scaloneta desperta admiração não apenas pelo resultado. De fato, muitos jornalistas comentaram que as comemorações nas ruas teriam acontecido — talvez com menor intensidade — mesmo em caso de vitória da França. Como explicar o método de um técnico no qual poucos acreditaram, e teve de suportar críticas públicos do próprio Maradona?
— Scaloni é moderado, fala pouco e só fala do que sabe. Ele é organizado, nada arrogante e profissional, quase alemão em sua metodologia. Tem talento e rompeu com estilos do passado. Os políticos argentinos deveriam aprender de seu futebol — assegura Navaro.
A técnica de Scaloni e a liderança definida por muitos como generosa de Messi conquistou a todos. Crianças, adolescentes, adultos e idosos, sem exceção. A seleção do povo uniu os argentinos com um jogo limpo, bonito e, acima de tudo, dando um exemplo de superação que tanta falta fazia ao país.
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