Edson Arantes do Nascimento, o Pelé (1940-2022) – Grande Prêmio

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O Rei está morto. O trono do futebol ficou vazio nesta quinta-feira (29) com a morte de Pelé, aos 82 anos, devido à metástase de um câncer de cólon. O maior de todos, aquele que teve o mundo do esporte aos seus pés e encantou torcedores de todo o planeta, sucumbiu após anos de uma piora gradual de sua saúde.
Edson Arantes do Nascimento escreveu como Pelé seu nome na história do futebol ao aliar o que, até agora, nenhum outro jogador conseguiu: lances de efeito, mais de 1000 gols, grandes conquistas coletivas por clubes e seleção, prêmios individuais, carisma e engajamento social e político – além de uma faceta artística que deixou transparecer depois de ter pendurado as chuteiras.
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Pelé não era perfeito – nenhum rei é. O ídolo se envolveu em uma série de polêmicas ao longo da vida, mas se despede deixando um histórico irretocável como jogador, com 1281 gols em 1363 jogos, incluindo compromissos não oficiais, três títulos de Copa do Mundo (1958, 1962 e 1970) e o bicampeonato mundial pelo Santos (1962 e 1963), entre incontáveis outros feitos. A carreira impressionante lhe rendeu o prêmio de Atleta do Século XX, em votação feita com jornalistas do mundo todo pelo jornal “L’Équipe”, da França.
Filho de dona Celeste Arantes e seu Dondinho, como era conhecido o também ex-jogador João Ramos do Nascimento, Edson nasceu em 23 de outubro de 1940 em Três Corações, Minas Gerais. Ainda nos campinhos do interior mineiro, ganhou o apelido de Pelé por ser fã do goleiro Bilé, do Vasco da Gama de São Lourenço. O garoto não conseguia pronunciar a alcunha do ídolo corretamente, mas, mesmo sem intenção, com a sua fala errada, criou para si um apelido que ficou eternizado.
Pelé cresceu em Bauru, no interior de São Paulo, e aos 15 anos chegou ao Santos, onde a ascensão foi meteórica. Consolidou-se como titular já no ano seguinte, em 1957, e permaneceu no Peixe até 1974, período em que conquistou dez títulos do Campeonato Paulista, seis da Taça de Prata, reconhecida mais tarde como Campeonato Brasileiro, dois da Copa Libertadores e dois do Mundial de Clubes, entre outros.
O sucesso do ainda menino no Alvinegro Praiano lhe rendeu a convocação para a Copa de 1958, e o resultado foi melhor do que se poderia imaginar na época. O camisa 10 balançou as redes seis vezes, todas no mata-mata, incluindo dois gols na final – um deles antológico, e ajudou o Brasil a conquistar o título inédito com a vitória sobre a anfitriã Suécia por 5 a 2 na decisão.
Em 1962, uma lesão impediu que tivesse o protagonismo esperado, mas mesmo assim pôde ajudar a seleção a se sagrar bicampeã no Chile. Após uma atuação apagada – como de toda a equipe – e a queda na fase de grupos em 1966, na Inglaterra, veio o ápice em 1970 com o tri mundial no México, naquele que é apontado por muitos como o maior time de futebol de todos os tempos. Desde então, o Rei é o único a ter conquistado três títulos de Copa como jogador.
O ato derradeiro da carreira como profissional aconteceu nos Estados Unidos, de 1975 a 1977, pelo estrelado New York Cosmos, equipe que contou também com Carlos Alberto Torres e Franz Beckenbauer. No último ano com o Rei, a equipe conquistou o troféu da North American Soccer League.
Entre tantos gols, um em especial ajudou a estabelecer a monarquia de Pelé. Em 19 de novembro de 1969, no melhor palco possível para o feito, o Maracanã, o camisa 10 converteu cobrança de pênalti contra o goleiro Andrada, do Vasco, e marcou o milésimo tento. O feito em si já era histórico, e o Rei o tornou único ao discursar para os jornalistas, que sequer esperaram a partida acabar e invadiram o gramado logo depois que a bola balançou a rede vascaína.
“Não quero festas para mim. Acreditem que para mim é muito mais importante ajudar as criancinhas pobres, os necessitados. Pensem no Natal. Pensem nas criancinhas”, pediu um craque engajado.
Também está entre os feitos que coroaram o Rei ter parado uma guerra, nem que fosse por apenas um dia. Em 4 de fevereiro de 1969, em meio à sangrenta Guerra de Biafra, entre dois grupos étnicos da Nigéria, o governo local estabeleceu cessar-fogo para que o Santos de Pelé pudesse jogar no Benin, perto da fronteira com o território nigeriano, em amistoso contra o Benin City.
Porém, nem só de acertos foi feita a vida de Edson Arantes do Nascimento. As principais controvérsias giraram em torno da relação – ou melhor, da falta de relação – com a filha Sandra Regina Machado, fruto do caso que teve com a empregada doméstica Anisia Machado quando ainda namorava a primeira esposa, Rosemeri.
Sandra conseguiu ser legalmente reconhecida como filha do ex-jogador em 1996 através de um exame de DNA e morreu de câncer em 2006. Até o fim da vida a filha garantiu que não recebeu qualquer ajuda do pai para custear o tratamento. Pelé ainda teve outra filha de uma relação extraconjugal, Flávia Kurtz, com a jornalista Lenita Kurtz, embora com ela tenha estabelecido uma convivência nos últimos 20 anos.
Um capítulo à parte na vida de Edson Arantes do Nascimento é Edinho. Pelé se ressentia publicamente da escolha do filho pela posição de goleiro, mas vibrou com a campanha que culminou com o vice-campeonato brasileiro pelo Santos em 1995. Depois da aposentadoria, o descendente do Rei foi preso por tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, apesar de ter deixado a prisão em 2019 ao progredir para o regime aberto. Edinho, hoje, é técnico do Londrina, time paranaense da Série B do Brasileirão.
O ídolo também foi criticado por uma suposta submissão ao regime militar vivido no Brasil durante boa parte de sua carreira. Ainda no campo político, foi Ministro do Esporte de 1995 a 2001, no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Pelé emprestou o nome a diversas causas sociais, incluindo a nomeação como embaixador da Boa Vontade da Unesco, embaixador da ONU de ecologia e meio ambiente e embaixador do futebol, entre outras. A vida depois de ter pendurado as chuteiras também envolveu participações em transmissões como comentarista esportivo, com destaque para o abraço em Galvão Bueno enquanto o narrador gritava “É tetra!” após o título da Copa do Mundo de 1994, nos Estados Unidos, e a faceta artística.
Quem era criança nos anos 90 dificilmente não se lembra da frase “ABC, ABC, toda criança tem que ler e escrever”, refrão da canção elaborada pelo Rei em campanha pela alfabetização infantil. Compôs também para peças de teatro com seu nome e, como ator, contracenou com astros de Hollywood, como Michael Caine e Sylvester Stallone em “Fuga para a Vitória” (1981), e com comediantes como Renato Aragão e Dedé Santana em “Os Trapalhões e o Rei do Futebol”.
Os últimos anos de vida foram de luta contra uma série de problemas de saúde. Ainda em 1999 sentiu dores fortes durante uma corrida nos Estados Unidos, onde passava férias, e teve de passar por uma cirurgia no joelho direito que incluiu a retirada de parte do menisco. Mais tarde, em 2011, passou por uma operação de catarata, mas dias depois do procedimento pôde ver o Santos ser tricampeão da Libertadores no Pacaembu, em vitória sobre o Peñarol por 2 a 1, com show de Neymar.
Mais recentemente, desde 2012, passou a comparecer a menos eventos públicos e quase sempre em cadeira de rodas. Edinho disse que uma série de cirurgias no quadril limitou as caminhadas do pai e o obrigava a usar um andador, o que, segundo o filho, deixou o Atleta do Século deprimido.
Encarou ainda crises renais, causadas em parte pelo fato de ter retirado um dos rins quando ainda era atleta, hiperplasia da próstata, e uma cirurgia de coluna, entre outros problemas de saúde. Em setembro do ano passado, em exames de rotina, descobriu um tumor no cólon direito. O problema se agravou nas últimas semanas e provocou a morte do maior jogador de todos os tempos.
Foi-se o rei, ficam a sua história e o seu legado. Pelé transformou o futebol ao aliar técnica e habilidade raras a uma enorme força física e grande consciência tática. Sempre foi elogiado por companheiros, por adversários e até por seu maior rival na disputa histórica pelo título de maior, Diego Maradona.
Apesar da rivalidade, os dois tiveram aparições afetuosas juntos em alguns momentos, como quando o brasileiro foi o primeiro convidado de um programa de TV apresentado por Maradona. Quando ‘El Pibe’ morreu, em novembro de 2020, Pelé declarou que gostaria de jogar a seu lado no céu. É provável, então, que haja algum estádio lotado em outro plano neste momento.

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