Bolsonaro, Figueiredo e Floriano: os presidentes que não passaram a faixa – UOL Confere

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Do UOL, em São Paulo
01/01/2023 04h00
Jair Bolsonaro viajou na noite de sexta-feira (30) para Orlando, nos Estados Unidos, e não vai participar da posse do seu sucessor, Luiz Inácio Lula da Silva.
É a primeira vez que um presidente do Brasil termina o mandato fora do país.

Mas não é a primeira vez que um presidente no cargo deixa de transmitir o posto para o sucessor. Veja outras duas situações em que isso ocorreu — também envolvendo presidentes militares e também motivadas por rixas políticas com civis.
Em 15 de março de 1985, João Figueiredo, último presidente da ditadura militar, deveria passar a faixa para Tancredo Neves, eleito de forma indireta, marcando a retomada da democracia no Brasil.
Mas, na véspera da posse, Tancredo passou mal. No dia em que deveria receber a faixa, à 0h37, foi operado.
Naquela mesma madrugada, o mundo político começou a se movimentar para saber quem assumiria: José Sarney, o vice-presidente eleito, ou o presidente da Câmara, Ulysses Guimarães — ele próprio favorável à posse de Sarney.
Segundo reportagem do jornal O Globo da época, um passo importante das negociações foi convencer o presidente Figueiredo, que estava rompido com Sarney.
Como parte da costura política, Ulysses Guimarães teria se comprometido com Figueiredo de que não haveria solenidade de transmissão do cargo — evitando, assim, o contato entre os rivais.
Sempre foi um fraco, um carreirista. De puxa-saco passou a traidor. Por isso não passei a faixa presidencial para aquele pulha. Não cabia a ele assumir a Presidência”
João Figueiredo, em entrevista à Isto É antes de sua morte, em 1999, citada pela Folha
Sarney assumiu, então, sem a presença do antecessor militar. Havia a expectativa, porém, que o cargo fosse, a seguir, passado a Tancredo.
Mas, depois de sete cirurgias, Tancredo morreu em 21 de abril. Sarney assumiu de forma definitiva.
Uma réplica da faixa presidencial foi enviada de Brasília para o IML de São Paulo, onde o corpo de Tancredo estava sendo embalsamado. Ali, a faixa foi colocada sobre o terno preto de Tancredo pelo seu chefe de segurança durante a campanha eleitoral, major Forreaux.
É chefe, o Figueiredo não pôde te passar essa faixa, mas eu farei isso”
Major Forreaux, chefe de segurança de Tancredo, segundo reportagem da Folha de 1985
Tancredo foi sepultado com a réplica da faixa presidencial, embora não tenha chegado a assumir.
Já Sarney manteve a faixa original. Cinco anos depois, em 1990, transmitiu a faixa para Fernando Collor, o primeiro presidente eleito por voto popular após o fim da ditadura militar.
Em 15 de novembro de 1894, o militar Floriano Peixoto não compareceu à cerimônia de transmissão do cargo para seu sucessor, Prudente de Morais. A tarefa coube a um de seus ministros.
No dia 15, protocolarmente vestido, Prudente aguardava no salão do hotel que o viessem buscar [para a posse]. Ninguém apareceu, e foi num calhambeque alugado que chegou ao palácio Conde dos Arcos para prestar o juramento. Para o Itamaraty, onde se daria a transmissão do cargo, foi na carruagem do representante da Inglaterra, sem qualquer escolta oficial. As portas estavam abertas, os salões vazios. Floriano não compareceu”
Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas
“Foi pirraça”, disse o jornalista Natale Netto, autor de “Floriano, o Marechal Implacável”, para a Agência Senado, sobre a recusa de Floriano de comparecer à posse do sucessor.
O militar estaria contrariado com a transferência do poder para um civil, pela primeira vez. A proclamação da República fora feita por militares em 1889. Antes de Floriano, o primeiro presidente do país, Deodoro da Fonseca, também era militar.
Assim como ocorre agora com Bolsonaro, Floriano Peixoto havia se tornado ícone de um movimento de culto à personalidade, chamado “florianismo”. Segundo a FGV, foi “o primeiro fenômeno político centrado na figura de uma liderança republicana”.
Dois meses depois da posse de Prudente de Morais, em janeiro de 1895, o Jornal do Commercio publicou notícia sobre uma trama, jamais comprovada, que foi usada para justificar a ausência de Floriano Peixoto na transmissão do cargo.
O jornal lembrou a “estranheza que causou no público a ausência”, que foi “oficial e oficiosamente foi atribuída a [uma] moléstia” que acometia Floriano.
Parece, porém, que o sr. Marechal tinha motivos mais poderosos para não comparecer em atos públicos do que (…) os cuidados de sua saúde. Sabemos agora que tivera notícia segura de que a sua preciosa vida corria perigo e que homens perversos tramavam um crime contra sua pessoa”
Jornal do Commercio de 15 de janeiro de 1895, citado pelo Estadão no dia seguinte
Trata-se de um trama feito na Europa, sobretudo em Paris, por brasileiros ali residentes para o assassinato do sr. Marechal Floriano Peixoto no dia 15 de novembro, no caso, ao que parece, de não passar o poder ao seu sucessor”.
A publicação cita até que cartas dos brasileiros que tramavam o suposto assassinato teriam sido interceptadas e mostradas para Floriano.
Mas não há indícios de que a história seja verdadeira — a narrativa nem sequer entrou para o registro oficial histórico. O marechal morreu de causas naturais naquele mesmo ano.


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