Atos golpistas em Brasília mudam agenda política na largada do governo Lula e exigem coordenação sóbria entre os Poderes – InfoMoney
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Atos podem colocar pauta econômica em segundo plano no curto prazo; efeitos das respostas serão decisivos para retomada de normalidade institucional
Os atos golpistas que tomaram a Praça dos Três Poderes no último domingo (8), em Brasília, mais do que representarem o primeiro grande desafio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desde a posse, alteram o eixo da agenda política nacional de curto prazo e pressionam as instituições por respostas em um contexto inédito na Nova República.
Analistas políticos consultados pelo InfoMoney acreditam que os acontecimentos podem atrasar o calendário das discussões sobre a agenda econômica – especialmente a de um novo arcabouço fiscal e a possibilidade de revisão de benefícios tributários a setores específicos.
“O foco agora muda totalmente. Estávamos discutindo agenda econômica e passamos a falar sobre os responsáveis pelos atos e o financiamento”, observou um especialista consultado sob a condição de anonimato. Isso certamente afetará o humor dos agentes econômicos.
“A invasão da Praça dos Três Poderes ontem e a consequente elevação na incertezas política local devem levar os investidores a exigirem maiores prêmios de risco nos ativos domésticos, o que deve resultar em dia negativo para o mercado local, com o Ibovespa impactado, também, pela queda no minério de ferro”, observam os analistas da Nova Futura Investimentos.
Para eles, “o dólar deve ser o melhor termômetro da piora no sentimento de risco, não só por ser um hedge natural, mas pelo fato de bolsa e as taxas de juros já estarem bastante descontados”.
Em nota publicada no último domingo, analistas do J.P. Morgan disseram esperar reação negativa dos mercados, mas concentrada no curto prazo. Já a Capital Economics ressalta que as implicações da invasão são principalmente políticas, mas resultam em prêmio de risco prolongado para os ativos financeiros do país. Outros analistas seguiram na mesma linha.
Os episódios fazem com que o mundo político deixe outras pautas em segundo plano e se volte para um conjunto de medidas em resposta ao que tem sido visto como a versão brasileira da invasão ao Capitólio, sede do Congresso dos Estados Unidos, ocorrida dois anos atrás por apoiadores do então presidente Donald Trump.
Havia uma expectativa inicial que o ministro Fernando Haddad (Fazenda) detalhasse nesta semana as primeiras medidas de ajuste fiscal discutidas na semana passada com sua equipe e com o presidente Lula. Mas é provável que a pauta tenha que esperar um pouco mais até que a nuvem da crise institucional instalada se disperse.
Apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) – o primeiro presidente a tentar a reeleição no país e ser derrotado nas urnas – avançaram ontem (8) sobre a Esplanada dos Ministérios e invadiram o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF), e deixaram um rastro de destruição aos prédios públicos.
Parte da mudança de agenda já foi observada no domingo, com a decretação de intervenção federal na segurança pública do Distrito Federal por Lula e o afastamento do governador Ibaneis Rocha do cargo ao qual foi reeleito em primeiro turno por 90 dias.
A expectativa é de uma ação enérgica dos Três Poderes em resposta aos atos. No Congresso Nacional, que está em recesso, já há discussões sobre a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os atos, seus responsáveis e financiadores.
Para Lula, este será um teste sobre a força do novo governo e de capacidade de inaugurar um novo momento na relação com Judiciário e Legislativo.
A velocidade em reverter o quadro de tomada da Praça dos Três Poderes foi uma primeira sinalização do novo governo, mas ainda deve ser monitorado o potencial contágio dos atos pelo país, com novos bloqueios de vias públicas, e o grau de comprometimento dos 27 governadores em cumprir a determinação do ministro Alexandre de Moraes, do STF, pela desmobilização de acampamentos bolsonaristas em frente a quartéis do Exército e outras estruturas militares.
“As invasões representam desgaste simbólico por terem sido atingidos prédios que abrigam o poder do Estado, mas o fato de terem se restringido ao domingo – sem interrupção de atividades e durante o recesso parlamentar – minimizam suas consequências diretas imediatas. Nesse sentido, válido ressaltar a postura condenatória unânime de atores da política institucional, incluindo o partido de Jair Bolsonaro, que havia sido mais tolerante em episódios anteriores”, observam os analistas da XP Política.
O tom das autoridades em resposta aos atos é considerado fundamental para determinar se o episódio será um “fantasma” para o futuro da gestão do presidente ou se a resposta o terá fortalecido no cargo.
Apesar de os atos representarem um teste importante ao governo Lula, o analista político Ricardo Ribeiro, da MCM Consultores, ressalta que o vandalismo registrado legitima medidas do governo que antes poderiam ser questionadas para enfrentar golpistas que até hoje não aceitam o resultado das últimas eleições.
“As instituições acharam os inimigos externos como os culpados, além dos radicais nas ruas. Isso pode resultar em fortalecimento do governo. Mas é um pouco cedo falar sobre isso”, pontuou um analista sob a condição de anonimato.
Há uma avaliação de que as cenas também afastam eleitores de “centro” que escolheram Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno da disputa pelo Palácio do Planalto e restringem a base de apoio do ex-presidente a um gueto radicalizado.
O que pode trazer consequências, inclusive, para a articulação do grupo no Congresso Nacional – já que o bolsonarismo conseguiu construir bancadas relevantes na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
Para especialistas do Direito, os atos de ontem podem inaugurar uma nova era de medidas excepcionais por parte do Poder Judiciário, como se observou no enfrentamento à pandemia de Covid-19 ou mesmo em resposta aos atos antidemocráticos de apoiadores de Bolsonaro nos últimos anos.
Mas, ao pisar neste terreno, o Supremo Tribunal Federal retorna aos riscos de danos colaterais sobre eventuais excessos. Calcular as medidas corretas e na intensidade devida será o principal desafio dos magistrados, que nos últimos anos passaram a viver sob forte pressão e ataque de um grupo político no poder. Qualquer avanço indevido pode gerar danos significativos e abrir precedentes perigosos.
(com Reuters)
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