Chico Alves – Um dos piores legados de Bolsonaro foram os … – UOL Confere

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Chico Alves é jornalista, por duas vezes ganhou o Prêmio Embratel de Jornalismo e foi menção honrosa no Prêmio Vladimir Herzog. Foi editor-assistente na revista ISTOÉ e editor-chefe do jornal O DIA. É co-autor do livro ‘Paraíso Armado’, sobre a crise na Segurança Pública no Rio, em parceria com Aziz Filho.
Colunista do UOL
20/12/2022 13h14
Há muito tempo os políticos fisiológicos exibem criatividade para se beneficiar de verbas governamentais. Quando se fala do escambo imoral entre Executivo e Legislativo do Brasil, logo vêm à mente os escândalos do Mensalão e do Petrolão. Governos anteriores, no entanto, já chafurdavam nessa lama.
Na gestão de Fernando Henrique Cardoso, deputados receberam uma bolada para aprovar a reeleição para presidente. Antes, em 1989, a Petrobras frequentou o noticiário por conta de desvios originados em indicações políticas (o jornalista Ricardo Boechat ganhou prêmio com matérias sobre o tema). Poucos anos depois, o tesoureiro de Fernando Collor voltava a tentar implantar um esquema de maracutaias na mesma empresa.

O “toma lá, dá cá” é distorção antiga na política brasileira.

Nunca se viu, porém, nada parecido com o atual orçamento secreto, descoberto pelo jornalista Breno Pires, do jornal O Estado de S. Paulo. Trata-se de um aperfeiçoamento absurdo da tecnologia da corrupção. Por esse expediente, em 2022, os presidentes da Câmara e do Senado distribuíram recursos de emendas no valor de R$ 16 bilhões sem que se possa identificar com exatidão parlamentares beneficiados e nem onde o dinheiro foi gasto.
Essa engenharia maligna foi montada durante e por causa do governo de Jair Bolsonaro.
Eleito sob a promessa de que daria fim ao “toma lá, dá cá” entre Executivo e parlamentares, Bolsonaro começou seu mandato sem fazer negociação de nenhuma espécie com o Congresso – nem mesmo as lícitas, que são a base da política.
Depois de uma sequência de derrotas, completamente enfraquecido, o presidente abriu as portas para o Centrão, que, em troca de apoio, implantou então o orçamento secreto. Trata-se de um dispositivo fisiológico que se retroalimenta, já que os beneficiados desse ano usaram parte da dinheirama para turbinar suas campanhas eleitorais. A maior parte se elegeu.
A maior parte dessa operação está centralizada na mão de um homem: o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). São esses superpoderes que o tornam tão soberbo nas atuais negociações com o presidente da República eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), exigindo cargos e apoio a seus interesses em troca da tal governabilidade.
Mesmo com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou inconstitucional o orçamento secreto, Lira continua poderoso. Articula para manter o fluxo de recursos de emenda de alguma outra forma.
Caso Lula o enfrente, corre o risco de ganhar um gigantesco inimigo, que tem por trás de si um contingente considerável de deputados do Centrão.
Como resolver essa aberração?
Ninguém sabe ao certo.
O que se sabe mesmo é que a decisão do STF não encerra essa distribuição indiscriminada de recursos iniciada no governo Bolsonaro.
A maior ironia é lembrar que a gestão que permitiu o aparecimento do orçamento secreto (e se beneficiou dele) começou bradando que daria fim ao “toma lá, dá cá”.
Falsos moralistas geralmente acabam assim, afundados na imoralidade.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
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