Desfechos fantásticos para uma crise política surreal – Gazeta do Povo
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Imagine que louco se! Desde que se instalou no Brasil essa crise política que vou chamar de surreal, embora ela esteja mais para dadaísta mesmo, não paro de repetir isso e de imaginar desfechos que são loucos num dia, só para se revelarem perfeitamente plausíveis no dia seguinte. O que é duplamente lamentável. Primeiro porque parece que todos os parâmetros de racionalidade foram pras cucuias e o que prevalece hoje é o voluntarismo de crianças de cinco anos fantasiadas de autoridades. E depois porque… Esqueci. Se me lembrar até o fim do texto eu digo.
Segue, agora, uma lista de possibilidades que hoje vou chamar de delírios, mas amanhã já não tenho tanta certeza assim. Vale avisar, porém, que não sou oráculo nem vidente, e que se alguns dos cenários descritos se concretizar terá sido mera coincidência – ou azar ou castigo.
Imagine que louco se o ex-presidiário eleito Lula, em seu primeiríssimo ato de governo, percebe que vai ter que disputar os holofotes e o poder com o ministro Alexandre de Moraes e decide fazer o que o presidente Jair Bolsonaro não fez até agora. Agora imagine, de um lado, a esquerda tendo de justificar a ação de Lula. E, do outro, a direita boquiaberta vendo o adversário restabelecer a já mítica “harmonia entre os poderes”.
(Novamente, e pela última vez, não estou dizendo que isso vá acontecer nem que haja qualquer possibilidade de isso acontecer. Só imagine que louco se).
Imagine que louco se, pé ante pé, na surdina que certamente se seguirá à performance estridente de Pabllo Vittar cantando o Hino Nacional durante a posse do ex-presidiário, o presidente Jair Bolsonaro aparece todo paramentado, tira lentamente a faixa presidencial e a transmite (?) ultrademocraticamente a Lula. Daí ele cumprimenta o novo chefe do Executivo, checa os bolsos para ver se a carteira ainda está ali – e vai embora. Sem dizer uma só palavra. Sem dar um único pio. Talquei?
Imagine que louco se o presidente Jair Bolsonaro, atendendo aos pedidos dos manifestantes diante dos quartéis, invoca uma legislação obscura qualquer e declara ilegítima a eleição presidencial de 2022. Mas calma que ainda tem mais. Imagine que louco se, depois de fazer isso, Bolsonaro anuncia a realização de novas eleições (contra Lula!), mas desta vez com voto auditável. Mas calma que ainda tem mais. Imagine que louco se nessa nova eleição… Bolsonaro perde para Lula por uma diferença mínima.
Imagine que louco se Lula está lá todo pimpão na festa da posse quando, de repente, não menos nem mais do que de repente, sofre uma síncope ao ouvir um dueto de Chico César e Gaby Amarantos cantando “Coração de Estudante”. Mas ninguém percebe. Eis então que Lula, já com a caneta executiva na mão, nomeia Bolsonaro (sim, Bolsonaro!) ministro-chefe da Casa Civil e imediatamente vira alvo de um pedido de impeachment do PT, que alega que o ex-presidiário foi substituído por um sósia bolsonarista.
Imagine que louco se eu termino a crônica sem me lembrar do outro motivo por que considero lamentável imaginar esses desfechos que são loucos num dia, mas que se revelam perfeitamente plausíveis no dia seguinte.
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