Direitos humanos e futebol moderno: boicote despenca a audiência da Copa do Mundo na Alemanha – FutebolNews
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Torcida do Borussia Dortmund exibe faixa em apoio a boicote à Copa do Mundo. (Foto: Lars Baron/Getty Images/One Football)
A estreia da Alemanha na Copa do Mundo contra o Japão teve, em média, 9,2 milhões de telespectadores, quase três vezes menos do que o primeiro jogo da edição de 2018, quando 26 milhões de alemães assistiram à partida diante do México. Uma pesquisa divulgada pelo jornal “Der Spiegel” indicou que 70% dos entrevistados não pretendem acompanhar o campeonato. A baixa audiência é resultado do boicote de parte da população, que denuncia a escolha supostamente corrupta do país-sede, o desrespeito aos direitos da população LGBTQIA+ no Catar e a morte de trabalhadores imigrantes na construção dos estádios.
Alf Frommer (54), diretor criativo e autor de “Gestammelte Werke”, é um dos tantos alemães que decidiram aderir ao boicote. Ele lembra do lema da Copa do Mundo de 2006 “O mundo entre amigos”, que significa ter a consciência da abertura necessária para receber um Mundial. Para ele, os cataris proibirem até mesmo a presença de bandeiras com as cores do arco-íris foi uma clara demonstração de que o país não está pronto para receber visitantes de outras culturas.
– Eu amo Copas do Mundo, elas são ótimas. É o primeiro jogo da Alemanha em Copas do Mundo que eu não assisto desde 1982. Eu assisti todos os jogos da seleção alemã em Copas do Mundo e nunca pensei que deixaria de assistir a uma partida. Foi uma decisão difícil, incomum, mas eu consegui (risos) –, destacou antes de ressaltar que a maior parte da população alemã já estava descontente com a maneira como o futebol europeu está sendo conduzido.
– Isso (baixa audiência) também é consequência do distanciamento dos torcedores na Alemanha, que já ocorre há muitos anos por conta do futebol moderno baseado em dinheiro. Existem grandes torcedores que sequer vão mais aos jogos da Bundesliga e preferem assistir partidas amadoras da quarta ou quinta divisão da Alemanha porque este é para eles o futebol de antes. A entrada cada vez maior do dinheiro no futebol, em que quem tem mais dinheiro compra os títulos, afasta cada vez mais os torcedores. Eu acredito que o amor pelo futebol permanece lá, mas não pelo futebol que está sendo celebrado no Catar. Se você tem muito dinheiro, você pode comprar a Copa do Mundo, se você tem muito dinheiro, você pode comprar Neymar, Messi, Ramos, Mbappé e terá o melhor time. O futebol está cada vez mais previsível e resultados como a vitória da Argentina contra a Arábia Saudita, ou até mesmo a derrota da Alemanha para o Japão, por mais que me machuque porque eu quero que meu time vença, são os momentos em que nós dizemos: ‘Isso é futebol. O time que tem os melhores jogadores ou mais dinheiro não vence sempre.’ – explicou.
Na última sexta-feira (19), o presidente da Fifa Gianni Infantino rebateu as críticas à escolha do país-sede e afirmou que, pelo que fizeram nos últimos três séculos, os europeus deveriam pedir desculpas pelos próximos três mil anos antes de dar lições de moral nas pessoas. Alf Frommer reconhece os crimes cometidos por seus conterrâneos, mas defende que as pessoas devem sim ter o direito de apontar as infrações de outros países.
– Eu, como alemão, o que devo dizer? Nós cometemos os maiores crimes contra a humanidade de todos os tempos. Os europeus também são responsáveis pelo colonialismo, que cometeu outros tantos crimes, como a escravidão. Isso é inegável. Mas, se for assim, ninguém poderia falar nada, porque todas as nações fizeram algo no passado que não está de acordo com os direitos humanos da sociedade contemporânea. Por exemplo, nós, da Alemanha, não poderíamos nunca mais levantar a voz quando virmos que os direitos humanos estão sendo desrespeitados em algum lugar porque a Alemanha foi responsável pelo holocausto, e eu não acho isso certo. Os europeus têm superioridade moral? Não, mas temos o direito de deixar clara nossa opinião. – argumentou.
Em protesto a favor dos direitos LGBTQIA+, os capitães de Alemanha, Inglaterra, Holanda, Bélgica, Dinamarca, Suíça e País de Gales pretendiam usar uma braçadeira arco-íris com a frase ‘One Love’. A Fifa proibiu o movimento e decidiu punir aqueles que desobedecessem a instrução com o cartão amarelo. Descontentes, os titulares da seleção alemã taparam a boca na foto oficial, e a Federação Alemã criticou a decisão da Fifa.
“Com a nossa braçadeira de capitão quisemos dar o exemplo pelos valores que vivemos na seleção: a diversidade e o respeito mútuo. Seja alto junto com outras nações. Não se trata de uma mensagem política: os direitos humanos não são negociáveis”, disse em nota.
Nancy Faser, Ministra do Interior e dos Esportes do país, apareceu na arquibancada entre as autoridades cataris e membros da Fifa usando a faixa arco-íris. A política é conhecida pela defesa da igualdade de gênero e dos direitos da comunidade LGBT.
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