Este pode ter sido o último golpe fracassado de Bolsonaro contra a eleição – UOL Confere

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Ricardo Kotscho, 72, paulistano e são-paulino, é jornalista desde 1964, tem duas filhas e 19 livros publicados. Já trabalhou em praticamente todos os principais veículos de mídia impressa e eletrônica. Foi Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República (2003-2004). Entre outras premiações, foi um dos cinco jornalistas brasileiros contemplados com o Troféu Especial de Direitos Humanos da ONU, em 2008, ano em que começou a publicar o blog Balaio do Kotscho, onde escreve sobre a cena política, esportes, cultura e histórias do cotidiano
Colunista do UOL
30/10/2022 16h38
Impedir os eleitores do adversário de chegar aos seus locais de votação, especialmente no Nordeste, pode ter sido o último tiro no pé de Bolsonaro contra a democracia para tentar impedir a derrota certa apontada pelas pesquisas. O golpe contra as urnas eletrônicas e a Justiça Eleitoral já tinha flopado.
Só às 15h deste domingo, intimado por Alexandre de Moraes, presidente do TSE, sob a ameaça de prisão, a parar imediatamente a operação que barrou nas estradas a passagem de ônibus públicos com eleitores, em 514 barricadas montadas pela Policia Rodoviária Federal, o diretor-geral da corporação, Silvinei Vasques, prometeu cumprir a ordem dada pela Justiça Eleitoral na noite de sábado.

Quem vai acreditar nisso? Quem vai fiscalizar?
A esta altura, quantos milhares de eleitores tinham sido impedidos de votar? Como consertar este estrago, que pode ter influído não só nos índices de abstenção, mas no resultado final da eleição?
Às 10h, em sua primeira entrevista coletiva, o ministro Moraes saudou a tranquilidade nos locais de votação, tudo correndo normalmente.
Pouco depois, comecei a receber vídeos enviados pela minha neta Laura Kotscho, estudante de jornalismo, vindos de diferentes capitais do Nordeste, que circulavam nas redes sociais, mostrando o que estava acontecendo nas estradas, com a intimidação aos eleitores de camisa vermelha impedidos de votar.
Mandei tudo para a chefia do UOL, que não demorou a levar o assunto às manchetes, depois de checar as informações enviadas por eleitores prejudicados, no que logo seria seguido por outros órgãos de imprensa. As denúncias se multiplicavam por todo o país, para além do Nordeste petista.
Num dos ônibus parados, em Benevides, no Pará, o policial rodoviário que comandava a operação subiu a bordo e fez um longo discurso para defender o governo Bolsonaro e atacar a candidatura do adversário, chamado de “ex-detento”.
O próprio diretor-geral da PFR Silvinei Vasques, membro destacado da tropa de choque de Bolsonaro que aparelhou os órgãos federais de cima a baixo, na véspera tinha publicado um post com a bandeira do Brasil e a legenda: “Vote 22. Bolsonaro presidente”. Diante da repercussão nas redes sociais, tratou logo de apagar a publicação.
Antes de Bolsonaro, a Polícia Rodoviária Federal se limitava a fiscalizar a velocidade dos carros nas estradas e dar assistência a motoristas envolvidos em acidentes. No governo do capitão, ganhou novos poderes, a ponto de participar de operações nas favelas do Rio.
Em maio, a PRF ganhou as manchetes da imprensa ao matar um motociclista que circulava sem capacete, trancado no porta-malas da viatura da corporação, onde jogaram uma bomba de gás e fecharam a porta.
Genivaldo de Jesus Santos, de 38 anos, tornou-se a vítima mais conhecida da nova PRF, que passou a agir também nas cidades, em parceria com a Polícia Federal e as polícias locais, o longo braço armado do governo central.
Sem conseguir o apoio dos comandos militares para suas ofensivas golpistas, é nessas forças paramilitares e nos batalhões civis, formados nos clubes de tiro dos CACs e nas milícias, que Bolsonaro imaginava dar sobrevida ao seu desastrado governo, cada vez mais desmoralizado, a cada investida contra a democracia.
Na hora em que escrevo, faltam apenas alguns minutos para o fechamento das urnas —e, espero, para virarmos as páginas mais tenebrosas da nossa história. Essa tentativa bizarra de impedir o voto dos adversários, uma mistura de operação kamikaze com tabajara, parando seus ônibus nas estradas, pode ter sido a última de uma coleção de fracassos.
Como se ninguém fosse descobrir as barricadas da PRF à luz do dia, espalhadas pelas estradas do Brasil, com milhares de testemunhas, que hoje estão armadas com celulares, e filmam tudo. Assim como a vida dos mortos da pandemia, os votos das vítimas deste golpe derradeiro não têm volta. E nunca saberemos quantos foram. Vão decretar sigilo de 100 anos?
Vida que segue.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
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Ricardo Kotscho
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