Futebol como espelho – Correio do Povo

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Gilberto Jasper*
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A final entre Argentina e França serviu para muitas lições não apenas sobre futebol, mas a respeito do comportamento humano que caracteriza esta quadra da história. A beligerância que há tempos ultrapassou as redes sociais extrapola a civilidade e rende discussões agressivas em todos os ambientes. É absurda a virulência das ofensas proferidas por pessoas indignadas com amigos que torceram pelos nossos vizinhos da América do Sul na decisão da Copa do Mundo no domingo.
Resido ao lado de um restaurante especializado em parrilla, prato típico argentino e administrado por uma família oriunda daquele país. Desde o início do certame mundial, o local serviu de ponto de encontro de simpatizantes da equipe capitaneada por Lionel Messi. Neste grupo se incluíram muitos brasileiros, admiradores do futebol da seleção campeã em todas as rodadas do campeonato. O clima era de confraternização e entusiasmo que atraía cada vez mais pessoas.
Vivemos numa inédita era da comunicação plena e de ampla liberdade de expressão. Diante disso, soa incompreensível sermos obrigados a conviver com a radicalização que permeia as relações sociais. Inocentes grupos de WhatsApp formados por pais de alunos de qualquer escola se transformam em ringues, palco de agressões, ofensas e todo tipo de baixaria.
O futebol é mosaico social para onde convergem comportamentos humanos sem máscaras. Em um estádio de futebol – e aí se incluem todas as manifestações e ambientes inspirados pelo futebol, a preferência nacional –, a espontaneidade é marca registrada. Lembro-me de ir ao Beira-Rio com meu filho. Ao passar pelo pórtico de entrada do estádio, ele se voltava com olhar maroto e disparava:
– Pai, agora já posso dizer “nome feio”, né?
Nestas ocasiões de intenso envolvimento emocional, o futebol revela as pessoas como elas são. Ao longo da Copa do Mundo, ficou evidente a incapacidade de seres considerados racionais de administrar emoções e sentimentos.
Soaria ingênuo imaginar unanimidade em torno da seleção tricampeã do mundo. Espera-se, ao menos, ampla liberdade de escolha, opinião e manifestação.
2023 bate à porta. Será, talvez, o primeiro ano pós-pandemia em que o fim das ameaças sanitárias permitirá uma vida mais próxima do normal. Quem sabe possamos ser mais solidários e democráticos?
*Jornalista

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