Governo Bolsonaro não apoia projeto dos EUA contra China – UOL Confere

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Jamil Chade é correspondente na Europa há duas décadas e tem seu escritório na sede da ONU em Genebra. Com passagens por mais de 70 países, o jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparência Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Vivendo na Suíça desde o ano 2000, Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti. Entre os prêmios recebidos, o jornalista foi eleito duas vezes como o melhor correspondente brasileiro no exterior pela entidade Comunique-se.
Colunista do UOL
06/10/2022 10h01
O governo de Jair Bolsonaro não apoiou a proposta de europeus e americanos de abrir um debate na ONU sobre as acusações de violações de direitos humanos na China.
Nesta quinta-feira, numa votação tensa no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, o bloco ocidental conseguiu apenas 17 votos, enquanto a China somou 19 votos de seus aliados. O Brasil, porém, optou pela abstenção, assim como outros dez países, entre eles México, Índia, Argentina ou Gâmbia.

O resultado foi considerado como “histórico” por parte de embaixadores de diversos países, que destacaram a “força diplomática” da China e o desembarque de uma nova lógica geopolítica nas decisões da ONU. Entre os diplomatas das potências ocidentais, o constrangimento diante da derrota era evidente, enquanto o quadro de votação mostrava que praticamente nenhuma economia emergente havia optado por se aliar ao projeto de Casa Branca.
O governo de Jair Bolsonaro não explicou seu voto durante a reunião. Mas a avaliação interna do Itamaraty era de que colocar a China no radar internacional no que se refere aos direitos humanos ampliaria a tensão no cenário mundial, além de minar a capacidade de ação da ONU para lidar com outras crises.
Fontes ocidentais, porém, suspeitam que o governo de Pequim tenha feito uma forte pressão na América Latina para impedir que a região votasse pelo projeto americano e europeu. Hoje, a China é o maior parceiro comercial de mais de cem países pelo mundo.
O que gerou a elaboração da proposta de um encontro oficial foi a apresentação de um informe da ONU, ainda sob a gestão da chilena Michelle Bachelet, e que constatou graves violações de direitos humanos cometidos pelo governo de Pequim. O foco era o tratamento dado à população Uigur e, de acordo com o informe, as suspeitas indicam crimes contra a humanidade cometidos pelos chineses, incluindo tortura, desaparecimentos forçados e prisões arbitrárias.
Pequim rejeitou a proposta. “O que os americanos querem é muito mais que um simples debate. Mas usar fóruns da ONU para intervir em temas domésticos”, disse a delegação chinesa na ONU. “O que querem é instrumentalizar os direitos humanos”, atacou.
Para os chineses, o governo americano “espalha rumores e mentiras” sobre a situação de direitos humanos na China, com o objetivo de “conter o desenvolvimento” do país. Para Pequim, tal proposta “não vai promover o diálogo e apenas gera mais confrontação”. O regime comunista ainda alegou que tal iniciativa iria minar os trabalhos do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
Já o governo dos EUA, que apresentou a proposta, insistiu que os informes oficiais da ONU sobre a situação da China justificam a necessidade de um debate. Para o governo de Joe Biden, a meta era apenas de estabelecer um “fórum neutro” para falar da situação nos territórios chineses.
A embaixadora da Casa Branca, Michele Taylor, negou que o projeto esteja politizando o debate de direitos humanos. “Nenhum país deve ser excluído de um debate, nem o meu e nem a China”, insistiu a chefe da delegação dos EUA.
Os governos dos países escandinavos também saíram ao apoio da ideia de incluir a China em um debate, além das autoridades do Japão, Holanda, Reino Unido e várias democracias. Já a França destacou a imparcialidade da ONU ao denunciar a situação de violações contra a população uigur.
Venezuela, Eritreia e Bolívia saíram em apoio aos chineses, alegando que o gesto tinha como meta uma “manipulação política” e que ampliaria a polarização do Conselho.
“Querem transformar o Conselho de Direitos Humanos em palco para confrontação”, declarou a delegação de Nicolas Maduro, que qualificou o ato do Ocidente como “hostil”. Caracas ainda lembrou da pressão da Casa Branca para se evitar, há dois anos na ONU, qualquer referência aos EUA durante o debate sobre racismo após a morte do afroamericano George Floyd.
Cuba também votou contra a resolução e insistiu que a ação seria uma forma de potências ocidentais de usar a ONU para condenar a China, “com vistas a atingir metas geopolíticas”. Para Havana, o informe de Bachelet é “ilegítimo” e tal debate apenas vai “aprofundar a crise” entre os países.
Brasil foi criticado por ativistas de direitos humanos
Antes mesmo da votação, durante os debates para a apresentação da resolução, a chancelaria brasileira deixou claro que resistia à ideia e que não via motivo para a convocação do encontro.
Durante as reuniões preparatórias e nas quais se negociava o texto da resolução, a delegação brasileira tomou a palavra para mostrar que não estava de acordo com a iniciativa de realizar um debate sobre o China. Para o Itamaraty, esse não seria o momento adequado e tal proposta ameaça “polarizar ainda mais o Conselho de Direitos Humanos” da ONU.
O governo Bolsonaro, insistiu que o órgão internacional não poderia agir de modo “seletivo” sobre quais países deveriam ser examinados.
A postura do Brasil frustrou entidades de direitos humanos. Zumretay Arkin, do Congresso Uigur Mundial, foi um dos que criticou o governo Bolsonaro antes mesmo do voto. “Diante de graves abusos, incluindo crimes contra a humanidade e genocídio, o Brasil optou por olhar para o outro lado”, disse. “Sua relutância até mesmo em ter um diálogo significativo no Conselho de Direitos Humanos é condenável e deve ser chamada”, afirmou.
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