Haddad tenta equilibrar economia e política e mira déficit de 0,5% a 1% do PIB – JOTA

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Política Fiscal
Com projeções duvidosas, como o próprio ministro admitiu, medidas têm potencial de atingir superávit de R$ 11 bilhões
Com o conjunto de medidas anunciadas na tarde desta quinta-feira (12/1), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), colocou no radar a possibilidade de o resultado primário do governo central ser positivo neste ano. Pelas contas apresentadas no seu power point, o déficit de R$ 231,5 bilhões do orçamento se tornaria um superávit de R$ 11 bilhões.
Mas, durante sua fala, Haddad mesmo relativizou os números e disse que seu objetivo é aproximar receitas e despesas em proporção do PIB de 2022, para “tentar equilibrar o orçamento ainda neste ano”. E avisou: “Pode haver frustrações e, se for o caso, vamos tomar outras medidas”. O ministro também admitiu a possibilidade de o déficit não ser zerado e falou que está mirando um ficit entre 0,5% e 1% do PIB.
Há algumas incógnitas sobre a viabilidade do cenário apresentado, embora seja claro que haverá uma redução relevante no saldo negativo das contas públicas
para 2023, o que, por si só, é uma boa notícia.
As principais dúvidas residem nas medidas para redução de litígio do Carf e da chamada “denúncia espontânea”, na qual o contribuinte inadimplente resolve sua pendência com a Receita recolhendo o tributo devido sem os encargos normais. O impacto chega a R$ 70 bilhões, entre permanente (uma conta inquietante de R$ 20 bilhões) e extraordinário (estimado em R$ 50 bilhões) nas duas medidas.
Como as duas iniciativas dependem de adesão do contribuinte, mesmo que a estimativa seja conservadora, há sempre um risco de o resultado não se materializar. O efeito permanente dessas ações, então, parece ainda mais duvidoso.
Por outro lado, a reprojeção de arrecadação geral para o ano, de R$ 36,4 bilhões, pode estar subestimada, já que economistas do próprio governo apontavam para um potencial maior neste ano do que o que estava previsto no orçamento de 2023 — falava-se em até 1% do PIB.
A reoneração do IPI, que chegou a constar do cardápio de medidas, ficou para depois. A medida, como mostramos esta semana, era de fato complexa e tinha prós e contras. Mas teve um aspecto pedagógico importante no sentido de mostrar que Lula ainda está bastante sensível a pressões do setor empresarial e
andando sobre gelo fino para não perder apoio popular.
Assim, um aspecto claro do pacote de hoje é que o governo tenta fazer um ajuste fiscal pela receita, mas sem fazer muita pressão na sociedade.
Nesse sentido, cabe destacar que as medidas extraordinárias (que incluem ainda R$ 23 bilhões perdidos em contas de PIS/Pasep) são voluntárias. A que muda a regra do aproveitamento do crédito do ICMS no PIS/Cofins apenas corrige a bizarra situação em que havia a retirada do tributo estadual da base de cálculo das contribuições federais pela decisão do Supremo, mas as empresas poderiam usá-lo como parte dos créditos gerados por esses dois tributos. A estimativa de ganhos dessa iniciativa é de R$ 30 bilhões.
A iniciativa mais impopular foi o anúncio do fim da desoneração da gasolina a partir de março. Haddad disse que a conta considera o previsto na lei atual, mas deixou em aberto o retorno do tributo e o condicionou ao novo comando da Petrobras. Ou seja, os ganhos de R$ 28 bilhões neste ano e R$ 34 bilhões nos anos seguintes ainda não são certos. A medida é correta, ainda que haja algum ranger de dentes, mas está cercada de incerteza, reforçando a incógnita sobre o cenário de receitas.
No lado da despesa, o ajuste estimado em R$ 50 bilhões dificilmente vai colocar pressão no orçamento. Todo mundo sabe que a PEC da Transição, com sua autorização de R$ 168 bilhões em gastos extras, tinha uma gordura mais ou menos dessa ordem de 0,5% do PIB. Além disso, a paralisia de um governo que iniciou com uma espécie de “caça às bruxas” de bolsonaristas, com exoneração em massa de DAS 5 para cima, tirando muitos técnicos qualificados e nem de longe bolsonaristas de suas atividades, adia o funcionamento normal da máquina. E isso ajuda no ajuste prometido pelo ministro.
Além disso, há revisões de programas e a maior delas deve ser do Bolsa Família, que provavelmente gastará significativamente menos do que os R$ 170 bilhões estimados originalmente na elaboração do orçamento. Pelo menos neste ano.
É claramente um pacote que tenta equilibrar economia e política, e Haddad deixou transparecer isso, especialmente quando falou da reoneração da gasolina e redirecionou a mira do esforço fiscal para um déficit entre 0,5% e 1% do PIB e não para o superávit projetado em sua apresentação. Sem trazer grandes surpresas, ele tenta recuperar terreno junto ao mercado após os tropeços iniciais. Mas é preciso dizer que o anúncio de hoje teve mais uma vez uma comunicação um pouco truncada, com o ministro dizendo uma coisa e seus números, outra.
Fabio Graner – Analista de economia do JOTA em Brasília. Foi repórter e colunista de economia no Valor Econômico e também atuou no Estadão, DCI e Gazeta Mercantil, com mais de 20 anos de experiência, incluindo setor público. E-mail: [email protected]
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