Mau humor do mercado é outro sinal da provável derrota de Bolsonaro – CartaCapital
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A Bolsa despenca, o dólar sobe, enquanto o sonho da privatização radical escorre pelo ralo
O pessimismo da campanha de Jair Bolsonaro transbordou para a Faria Lima. A coisa não andava bem, mas a cena de faroeste caboclo protagonizada por Roberto Jefferson no domingo 23 matou a vã esperança de quem, no mercado financeiro, torcia pela reeleição (neste caso, a esperança não foi a última a morrer).
A Bolsa de Valores acumula quedas sucessivas, o dólar e o euro reverteram a tendência recente de queda. Na manhã da quinta-feira, três dias antes do segundo turno, a moeda norte-americana se aproximava dos 5,40 reais. As ações de duas estatais têm sofrido em particular: os papeis da Petrobras caíram mais de 10% desde a segunda-feira 24 e aqueles do Banco do Brasil recuaram 12%.
De todos os indícios que apontam para a derrota do ex-capitão, este é um dos mais significativos.
A turma da bufunfa não brinca em serviço e tem gastado rios de dinheiro no monitoramento da disputa. São pesquisas, trackings, conversas reservadas e, se bobear, até leitura da borra de café e jogo das runas. Informação não falta e essa informação, decepcionante para os investidores, se reflete nos preços dos ativos. Como se diz no mercado, a cada vez mais consolidada vantagem de Lula nas pesquisas passou a ser “reprecificada”.
Há ainda uma tentativa de influir no jogo, embora, em movimentos assim, seja difícil separar o terrorismo eleitoral do instinto primário de proteger o próprio dinheiro. Quando fica descontente, irritada ou apreensiva, a manada, ou melhor, a boiada corre desembestada na mesma direção. Sempre me pergunto, em momentos como este, se estamos diante da demonstração cabal das tais “expectativas racionais” do mercado.
Compreende-se a frustração. Lula tem avisado na campanha que pretende interromper o desmonte da Petrobras e a rapinagem das reservas do pré-sal, além de fortalecer os bancos públicos no financiamento das políticas sociais e do desenvolvimento. Nada de privatizações a toque de caixa, nada de empresas vendidas na bacia das almas.
Do outro lado, Paulo Guedes, o posto Ipiranga, no afã de corrigir o desastre do vazamento da proposta de desvincular da inflação o salário mínimo e as aposentadorias, voltou nestes dias a prometer o céu, a terra, a Lua e um pedaço de Marte aos donos do dinheiro. Em evento recente, Guedes, “Beato Salu” em sua realidade paralela, garantiu que o Banco do Brasil e a Petrobras serão privatizadas em um eventual segundo mandato de Bolsonaro. Aparentemente, na Faria Lima e adjacências, ninguém acredita, nem na reeleição, muito menos no posto Ipiranga.
Em certos salões, pode-se perder as calças, nunca a pose. Os resultados inesperados do primeiro turno devolveram a fé aos mercados. Os empresários despejaram quase 80 milhões na campanha de Bolsonaro em três semanas e foi como pagar um dízimo a Silas Malafaia ou contribuir para a igreja ortodoxa peruana do Padre Kelmon – o caminho ao paraíso não está garantido.
O cavalo é errado, e agora? Já sei, vamos ligar para um jornalista de economia e usar a pena alheira para a derradeira chantagem. Aqui, ali e acolá lê-se: os investidores continuam profundamente preocupados, consternados, com o fato de Lula se recusar a compartilhar seus planos ou submeter ao crivo das mesas de operação os nomes da equipe econômica.
É um risco dar um cheque em branco ao petista, ouve-se nas melhores butiques de investimento. E quanto a Bolsonaro? É o filho dileto. Para ele, damos o talão de cheques em branco, a senha do cartão de crédito e da conta na Suíça, o cadeado do armário do clube, a chave do carro e o número de telefone da amante. Se o saldo ficar negativo, se der “perda total”, não tem problema, o prejuízo pode ser dividido entre 200 milhões de patriotas.
Sergio Lirio
Redator-chefe da revista CartaCapital
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