Moeda compartilhada e acordo Mercosul-UE: os desafios de Lula na América do Sul – Metrópoles
08/01/2023 2:00, atualizado 08/01/2023 8:17
Na primeira semana de governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sinalizou que adotará ações para retomar uma política externa que prioriza a integração na América do Sul. A liderança regional, fio condutor da diplomacia nos governos do petista, deve voltar repaginada — na tentativa de reconstruir a imagem brasileira. Além disso, o novo governo busca recuperar o protagonismo mundial do país, reaproximando-se de integrantes da União Europeia.
Em um claro contraste à postura de Jair Bolsonaro (PL), que deu as costas aos países vizinhos, Lula teve encontros bilaterais com 10 chefes de Estado no primeiro dia de governo. Entre eles, seis líderes da América Latina e dois da União Europeia.
O Itamaraty anunciou o retorno brasileiro à Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), e deve repetir o feito com a União das Nações Sul-Americanas (Unasul). Enquanto o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o governo estuda criar uma moeda comum para transações comerciais no Mercosul.
O reposicionamento do país no próprio continente é fundamental para restabelecer uma governança regional, proposta desenhada no plano de governo Lula. Especialistas consultados pelo Metrópoles alertam para a necessidade de inovação em termos econômicos. O mapa político e a agenda sul-americana são bem diferentes de anos atrás, quando o petista deixou o Planalto.
A diplomacia brasileira precisará enfrentar desafios como o avanço da China nos mercados da América do Sul e a ascenção da extrema direita no continente. Obstáculos somados à ameaça de recessão no hemisfério norte, em função da guerra na Ucrânia, e a necessidade de uma revitalização do Mercosul, bloco com mecanismos ainda engessados.
Segundo o professor de relações internacionais Roberto Menezes, da Universidade de Brasília (UnB), a política externa dos próximos quatro anos voltada para a América Latina deverá se pautar, sobretudo, por quatro eixos.
São eles: a manutenção da paz na região; o desenvolvimento regional a partir da prosperidade compartilhada; a volta da retórica em prol da justiça social; e a priorização da agenda ambiental.
No entanto, o cenário atual é bastante distante daquele de 20 anos atrás, quando Lula chegou ao Planalto. Enquanto, em 2003, Brasil, Índia, China, Rússia e África do Sul (que formam o bloco Brics) despontavam como promessas, hoje há uma polarização entre duas superpotências mundiais: EUA e China.
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Deslocada, a Rússia foi reposicionada como principal adversária das nações europeias em razão da guerra na Ucrânia, que já dura 10 meses. O conflito tem impacto negativo sobre a economia dos países europeus, o que diminui a margem para que países ricos se comprometam com metas financeiras mais ambiciosas.
Voltar a agenda diplomática para questões regionais é, mais que um assunto ideológico ou de cunho patriótico, uma diretriz fundamentada economicamente. Empresas brasileiras estão perdendo espaço para os chineses; portanto, o foco é recuperar esse espaço perdido da indústria brasileira no nosso principal mercado, que é a América do Sul, segundo Menezes.
“O Mercosul não deve ser considerado como um fardo, apesar das dificuldades, mas sim um espaço privilegiado para o Brasil conseguir implementar uma estratégia de desenvolvimento”, argumenta. “Um país não pode ficar preso à sua região, porém, nesse contexto, deve tratá-la como prioridade”.
No início dos anos 2000, foi discutida a criação de uma moeda única para a América Latina. Agora, o novo ministro da Economia, Fernando Haddad, defendeu a criação de uma moeda para incentivar o comércio intrarregional.
O cientista político Leonardo Paz, da Fundação Getúlio Vargas, pondera que “reeditar propostas de governos anteriores, sem muitas novidades, pode ser um pouco problemático”.
Antes da criação de uma moeda para transações dentro do bloco, o professor sugere que o Mercosul precisa de modificações estruturais. Entre elas, encontrar maneiras de contornar as disparidades dos países integrantes.
“O bloco é muito engessado, e tem uma dificuldade muito grande de organizar acordos comerciais com outros parceiros. É preciso dar mais ênfase ao grupo no sentido de liderar uma agenda de inovação, tornando ele mais simples e prático. Além disso, fazer a engrenagem rodar melhor. Se for mais do mesmo, é ruim. Torná-lo mais inovador e pragmático, por outro lado, seria positivo”.
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