O futebol é das equipes, por isso o Brasil sofre sem Neymar | Blogs – ESPN.com.br
A perda de Neymar, a princípio pelo restante da fase de grupos, é muito preocupante para a seleção brasileira. Não há como maquiar a situação, mesmo em se tratando de um grupo de jogadores que oferece as melhores companhias para a figura principal do time, e, portanto, tem mais recursos para seguir sem ela. Porque não é uma questão de substituição individual. O futebol é um jogo de contextos coletivos, um jogo que, mais até do que aos jogadores, pertence às equipes. Rodrygo pode substituir Neymar? Pode. Paquetá pode? Sim. Ocorre que a lesão no tornozelo direito não tira apenas o jogador mais influente da seleção; encerra, ao menos – e tomara – temporariamente, as associações Neymar-Vinicius Júnior e Neymar-Paquetá, circuitos de movimentação ofensiva que marcam diferenças no time de Tite.
É preciso salientar que, em casos como estes – não esqueçamos de Danilo -, as informações divulgadas publicamente são mantidas no nível mínimo necessário. Primeiro, porque é preciso, de fato, esperar a evolução das lesões para se ter uma ideia de possibilidades. Depois, porque, durante uma Copa do Mundo, a comissão técnica da seleção brasileira tem que tratar das repercussões. Enquanto é perfeitamente possível que Neymar e Danilo retornem à ação nas oitavas de final, ou antes, o anúncio desta sexta-feira (25) pode ter sido uma aquisição de tempo. Um período de observação, espera e torcida antes de reavaliar a situação.
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De qualquer modo, uma verdade se impõe: Tite deve esquecer de Neymar e Danilo por ora, por mais radical que pareça. A Copa passa rápido e, mais do que nunca, é necessário pensar jogo a jogo. E isso significa excluir os que não estão disponíveis, sob pena de não investir tempo e trabalho na equipe que não pode esperar pelos titulares machucados. Os cenários de substituição dos ausentes são diversos e devem ser examinados conforme as circunstâncias de adversários e, no caso da última rodada da fase de grupos, chances de classificação às oitavas de final. O elenco que representa o Brasil no Mundial oferece a Tite algumas variações, dependendo, primeiro, do modelo de equipe que ele pretende utilizar contra a Suíça, na segunda-feira (28).
É possível que Tite prefira não repetir a escalação da estreia, diante de um time que deve se defender profundamente em quase todo o tempo, limitando a utilidade de dois pontas, e usar a formação mais ‘básica’, com Fred e Casemiro no meio de campo. Neste caso, seriam três trocas: Vinicius por Fred, Neymar por Rodrygo e Danilo por um lateral-direito, a escolher entre Militão e Daniel Alves. O papel de Neymar ficaria a cargo de Paquetá, porque, para atacar como está habituado, o Brasil precisa de um jogador por dentro, Rodrygo.
O problema é que, assim como Tite disse ontem que “há vários jogos dentro de um”, ao mencionar a tomada de decisões durante uma partida, cada jogo também influencia os próximos em todos os aspectos que compõem o futebol. Após Vinicius Júnior estrear bem e se envolver nas jogadas dos dois gols brasileiros contra a Sérvia, já seria complexo tirá-lo do time mesmo que Neymar pudesse jogar. Na ausência de Neymar, um time sem Vinicius ficaria ainda mais carente do impacto individual capaz de momentos decisivos. Para manter o astro do Real Madrid, seria necessário reutilizar a formação do primeiro jogo, com duas trocas puras e simples: um lateral no lugar de Danilo e Rodrygo na posição/função de Neymar. Paquetá seguiria como segundo volante.
Os próximos dias serão tensos, especialmente se a lesão de Neymar não evoluir bem ou se essa evolução não for visível, no sentido literal. Como se sabe, os jogos contra Suíça e Camarões, este dia 2 de dezembro, são as preocupações imediatas, mas a Copa do Mundo começa depois.
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As cinco substituições – um exagero para um time que chegou ao Catar com 36 partidas de invencibilidade – para o jogo contra o México indicavam o estado de nervos que dominava a <a href="http://Argentina“>seleção argentina, um indício de como os campeões sul-americanos dialogavam com o encontro mais tenso de uma geração inteira de jogadores do país. A final do Maracanã em 2014 foi uma noite de sonho e ilusão; o risco de ver a Copa do Mundo acabar na segunda rodada era a angústia de uma noite sem fim.
A alguém que queira saber o que é o mais absoluto medo aplicado ao futebol, basta assistir ao primeiro tempo da Argentina contra os mexicanos. Jogadores que evidentemente têm noção exata de quais são as virtudes coletivas de seu time se mostraram petrificados, presos a um nada futebolístico que fazia o tempo passar e olhava para o 0 x 0 sem saber direito o que aquilo significava. Em jogo, assim como na derrota para a Arábia Saudita, a Argentina era tudo menos uma equipe que praticava o que por lá se chama de la nuestra, ou seja, um jeito próprio de se expressar em campo.
Por sorte, o adversário com o qual os argentinos compartilhavam o gramado era um México sem ideias e sem soluções, que não sabia ao que jogava e nem mesmo parecia entender que o time de celeste e branco enfrentava, antes de qualquer outra coisa, os próprios fantasmas. Eles eram visíveis em campo e em cada um dos 88 mil rostos transfigurados do lado de fora. Metade do encontro se deu assim, envolvido pela névoa de aflição que o futebol reserva aos momentos em que o que há para perder é insuportável.
Até que Di Maria, este à altura da tarefa que se impunha, descobriu Messi andando na vizinhança da meia-lua. Um domínio e um chute rasteiro mais tarde, a Argentina finalmente pôde sentir o ar nos pulmões. No banco de reservas, Pablo Aimar, ídolo de Messi que hoje trabalha na comissão técnica da seleção nacional, levou as mãos ao rosto como quem não aguentava mais. A expressão de quem passou a vida em campo e, em tese, deveria estar habituado a essas provações emocionais, diz o suficiente sobre o valor de um gol que não poderia ter outro autor.
Enzo Fernández assinou um golaço para aliviar todas as almas e a Argentina sobrevive. Mais do que vencer a Polônia, porém, será necessário ser Argentina. A Argentina do jogo curto, da reunião de jogadores ao redor de Messi, das associações que geram espaços onde parecem invisíveis. O time que venceu o México teve pouco mais do que o pavor que paralisa e um gênio capaz de tudo.
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1 – A confirmação da escalação virgem, logo na estreia da Copa do Mundo, evidenciou a “ousadia” da qual tanta gente acreditava que Tite não seria capaz. É uma declaração que não pode passar despercebida; “aqui estamos”, com algo que o resto do mundo inveja: Neymar, Raphinha, Richarlison e Vinicius Júnior.
2 – Na Sérvia, a ausência de Vlahovic entre os titulares significou, de início, um problema a menos para o balanço competitivo que o Brasil deseja: controlar e ser incontrolável.
3 – Stojkovic, craque que hoje dirige o selecionado sérvio, perguntou na véspera “quem vai marcar?”, ao falar sobre um Brasil com quatro atacantes. Uma das respostas ele já teve logo no início, observando Raphinha acompanhar Mladenovic até as profundezas do campo de defesa. No futebol de hoje, se não for assim, não funciona. Stojkovic obviamente sabe.
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4 – Na marca dos 20 minutos, Brasil com a bola e discretamente ameaçador. Um grande passe de Casemiro, por dentro, que Neymar dominou mal. Sérvia com certa rispidez e sem constrangimento para se encerrar em seu campo. Nada que não fosse esperado. O plano sérvio sempre foi absorver a pressão e roubar com espaço para atacar, preferencialmente, pelo alto.
5 – Uma bola por baixo de Thiago Silva para Vinicius Júnior, uma por cima de Casemiro para Raphinha (gerou um gol na última Data Fifa), e o Brasil começou a encontrar frestas na parede vermelha que protegia a área sérvia. No 1-2 de Paquetá e Raphinha, a chance de finalizar de perto se apresentou com o grito de gol engatilhado, mas o chute saiu fraco e fácil para o goleiro.
6 – Ao descanso, o 0 x 0 se explicava pelas poucas chances brasileiras. Sempre que a bola circulou rápido e com movimentações coordenadas, o espaço apareceu. O problema é que o volume precisa vir acompanhado de contundência. Mesmo assim, Vinicius Júnior e Raphinha, ponteiros que transformaram a seleção na reta final das eliminatórias, estiveram a um bom gesto técnico do primeiro gol.
7 – Um Brasil com mais desarme voltou do vestiário. Raphinha criou para si uma outra grande chance, mas falhou novamente diante do goleiro. De uma questão de espaços negados, o jogo passou a ser um caso de oportunidades perdidas pelo Brasil, uma série de “quase gols” que chegou ao ápice quando Alex Sandro, de longe, deixou uma marca na trave direita de Milinkovic-Savic. O empate já era uma bênção para os sérvios.
8 – Grande ação de Neymar, girando na frente da área para gerar pânico. Ao balançar para encontrar o chute, oferecer a bola para Vinicius Júnior não era bem a ideia, mas o rebote do goleiro pediu a Richarlison um gol que poucos jogadores merecem tanto quanto ele. 1 a 0 aos 17 minutos, condições ideais para trabalhar em vantagem e, quem sabe, lidar com um adversário um pouco mais propenso ao risco.
9 – Não foi necessário. Tite preparava Fred e Rodrygo quando Vinicius Júnior procurou Richarlison na área. A bola chegou forte e difícil para dominar, mas o 9 da seleção a converteu em uma das pérolas deste início de Copa: um toque para o alto e um voleio espetacular, para estufar a rede e encantar o mundo. Que tremendo gol.
10 – O chute de Casemiro no travessão seria um terceiro gol bonito e merecido, mas, àquela altura, a atenção estava no banco de reservas, onde Neymar recebia atendimento no tornozelo direito, com o rosto escondido pela camisa. Mau sinal, num segundo tempo em que a seleção construiu seu caminho para uma vitória que só deveria deixar boas sensações.
e 11 – Estreia difícil, boa atuação e uma preocupação. Um Brasil seguro e capaz de ser explosivo, único vencedor possível no Estádio Lusail. Luzes em Richarlison, aplausos para o desempenho coletivo, apreensão por Neymar.
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A escolha por uma escalação inédita para estrear na Copa do Mundo diz muito sobre a <a href="http://Brasil“>seleção brasileira e sobre seu treinador. Com relação ao time, o que é bastante evidente: o recado aos adversários de que terão de lidar com Neymar, Raphinha, Richarlison e Vinicius Junior simultaneamente; um pesadelo potencial capaz de atormentar todos os técnicos no Qatar, sem exceção. Quanto a Tite, a decisão revela um estágio profissional – e a ocasião propícia – em que, além do resultado, há o desejo de se debruçar sobre o “como”.
Pode parecer uma redundância, uma vez que, ao escolher jogadores e modelos de atuação, todo técnico trata de como jogar. Mas Tite está em uma posição diferente: a fartura de opções no elenco da seleção lhe oferece o luxo de pensar em como vencer. Ninguém estranharia se o Brasil iniciasse o jogo contra a Sérvia com Fred e Casemiro responsáveis pela maior carga de trabalho defensivo no meio de campo e um atacante a menos – Vinicius, no caso -, uma formação plenamente capaz de vencer não só a estreia, como o torneio. Haveria, claro, as críticas de quem consegue enxergar o debate como uma competição entre Fred e Vinicius, um triste equívoco. O que está em questão não são as características individuais de dois jogadores completamente distintos, mas o comportamento coletivo do time com um e com outro. E neste aspecto, o equilíbrio que Tite sempre teve como mantra, e que é obrigatório a qualquer equipe com ambições, permanece como condição indiscutível.
Enquanto é verdade que esta escalação vai começar um Mundial sem ter sido testada em competição, é um engano pensar que Tite decidiu por ela sem ter visto o que gostaria em treinamento. Ao dizer que “os jogadores de ataque se escalaram”, o técnico revela um componente decisivo do trabalho de montagem de equipes; quando os jogadores convencem seu treinador de que a ideia funciona. As observações neste período pré-Copa, somadas à injeção de juventude e dinamismo que os atacantes de lado de campo, em especial, deram à seleção desde a derrota para a Argentina na final da Copa América, representam a confiança de Tite na escalação que nunca usou.
Cuidado para não confundir a equipe desta quinta-feira com o time que venceu Gana, em setembro. Sim, Paquetá atuou como segundo volante naquele amistoso, mas os laterais (Militão e Alex Telles) eram diferentes e o comportamento da seleção, também. Com bola, a primeira linha “girou” no sentido horário, com Militão passando a ser zagueiro pela direita, e Telles se movendo por dentro, mais próximo aos meio-campistas. O que se pôde ver nos 3 x 0 sobre o time africano foi a capacidade de Paquetá de fazer o papel pedido por Tite, e o potencial da associação Vinicius-Neymar do lado esquerdo do ataque. A ascensão do jogador do Real Madrid ao pedigree de astro do futebol é benéfica a Neymar não apenas na divisão das atenções do público e da mídia, como também no compartilhamento das responsabilidades dentro do campo. Nas palavras de um componente da comissão técnica da seleção brasileira, “a chegada do Vinicius libertou o Neymar”.
Tite compreende a sensação. Após um ciclo inteiro entre dois Mundiais, e confortável na pele de quem treina a única seleção que perde Copas – todas as demais jogam -, o técnico está à vontade para abraçar o potencial ofensivo de que dispõe e propor um futebol que se relaciona mais intimamente com o que nós, brasileiros, entendemos como nosso. O que a seleção deve apresentar a partir desta quinta-feira não deve ser analisado à luz do que seu treinador já fez, mas do que ele pretende fazer.
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Durante treze anos, o universo da luta greco-romana foi impiedosamente dominado por um homem chamado Alexandr Karelin. O lutador apelidado de “Urso Russo”, vencedor de nove campeonatos mundiais e três medalhas olímpicas de ouro em sequência, permaneceu invicto entre 1987 e 2000, até ser derrotado, numa das maiores surpresas da história dos esportes, na final dos Jogos de Sydney (seria uma falha não mencionar o autor da façanha: o americano Rulon Gardner). Ungido como o maior nome da modalidade em todos os tempos, Karelin também era conhecido pela expressão “O Experimento”, como se fosse uma criatura super-humana, construída num laboratório para aterrorizar seus adversários. Uma outra interpretação, menos controversa, é a de que seus combates eram ocasiões de aprendizado para oponentes apresentados à impossibilidade de derrotá-lo.
De certo modo, a influência de Roger Federer, que anunciou sua retirada do tênis competitivo aos 41 anos, pode ser relacionada à forma como Karelin era enxergado, muito embora eles sejam completamente opostos em quase tudo. A forma como estabeleceram um nível particular de excelência para se distanciar dos concorrentes, mesmo considerando as diferenças entre modalidades irreconciliáveis, é semelhante no aspecto de que, por momentos, até os melhores, os mais capazes e os mais bem preparados tinham consciência de que não podiam sonhar em ser como eles. E no caso de Federer, ícone de um esporte em que não há contato físico, a aparente elegância sem esforço com a qual jogava – oferecendo a todos, mas especialmente a quem estava do outro lado da quadra, uma marca de tênis inatingível – também é um tipo de brutalidade.
É estranho escrever sobre Federer no passado. Ele jogará na Laver Cup na próxima semana. Prometeu, por escrito, jamais abandonar o tênis. Estará, de um jeito ou outro, na quadra em exibições futuras, em que as pessoas esgotarão ingressos em poucos minutos para ver o jogador fabuloso que foi um dia, uma oferta que certamente não decepcionará ninguém, mas infelizmente não se aproximará do Roger em ação, em competição, tratando o jogo como uma oportunidade para redefini-lo, e sendo tratado pelo jogo como a única pessoa autorizada a fazê-lo, numa conversa em que não havia outros participantes. Ao longo de sua trajetória, há inúmeros relatos de adversários varridos da quadra que, questionados sobre o que acabara de acontecer, revelaram a impressão de que Federer tinha produzido a perfeição em forma de tênis.
Há um componente estético obrigatório quando se fala sobre o tênis de Federer. Está relacionado, de maneira simplista, à sua versão pessoal do que um ser humano é capaz de fazer com seu corpo, uma raquete e uma bolinha. “Uma criatura cujo corpo é carne e, de alguma forma, luz”, escreveu o autor americano David Foster Wallace, em 2006, sobre a “beleza cinética” inescapável ao estilo do suíço, um dos motivos pelos quais ele era reverenciado até por quem não se interessava por esportes. Num jogo baseado em ângulos, Federer construía possibilidades matemáticas inviáveis, com movimentos criados e compreendidos apenas por seu cerebelo. Ele era um dançarino que se divertia ao confundir rivais com uma música desconhecida, um pintor cujos rabiscos na quadra contrária desenhavam padrões milimetricamente precisos. E fazia parecer que nada daquilo, por mais desafiador ou espantoso, requeria esforço. Em 2015, Brian Phillips escreveu sobre Federer no saudoso Grantland: “Ele simplesmente faz o tênis parecer fácil, o que significa que, no auge, ele virtualmente apaga a dimensão física do esporte”.
Provavelmente não há resposta errada quando se fala – e este é um debate que pode se intensificar agora, mas não terminará nunca – sobre o melhor tenista da história. Federer é o ser que flutua sobre um caminho de flores até o aperto de mãos, Djokovic é a manifestação viva do destino, Nadal personifica o amor e o sacrifício. A pura contagem de troféus não aceita a beleza ou as sensações, mesmo porque pode ser feita também por quem não viu, não gosta, não se emociona. Quanto ao maior de todos os tempos, amigos, o caso a favor de Roger Federer não precisa mais de argumentos. Se ainda havia qualquer dúvida, o anúncio de sua aposentadoria fez com que o próprio jogo de tênis encerrasse a questão.
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Quando recebeu o convite para recuperar a temporada do <a href="http://Flamengo“>Flamengo e se debruçou sobre as possibilidades de utilização de um dos melhores elencos do futebol sul-americano, Dorival Junior tinha a intenção de construir o time com variações do 4-3-3, sistema no qual baseou seus trabalhos anteriores, no Athletico Paranaense e no Ceará. A ideia era jogar e marcar com este desenho preferido, desde que a proposta tivesse a adesão – em postura, mas, sobretudo, em prática – do grupo de jogadores e se provasse, no campo, o plano que extraísse o melhor desempenho de uma equipe carente em confiança após a experiência com a comissão técnica do português Paulo Sousa.
As primeiras formações, porém, revelaram alguma distância em relação ao que o novo treinador pretendia, como se fossem estágios iniciais em que era necessário aliar a urgência por resultados e a observação do funcionamento coletivo, posteriormente conciliando perdas e ganhos em cada aspecto. Dorival partiu de uma estrutura com um volante, dois meias entre as linhas do rival, dois pontas abertos e um atacante centralizado, num planejamento de ataque posicional que não gerou a fluidez desejada. No jogo contra o América-MG, prévio ao início do confronto de máxima importância com o Tolima, pela Copa Libertadores, os primeiros passos para o sistema que faria o Flamengo decolar foram dados, sem muito alarde: um 4-3-1-2 com De Arrascaeta por dentro, antes de Pedro e Gabriel Barbosa funcionando como uma dupla.
A vitória por 3 x 0 rendeu tranquilidade e confiança, além de confirmar a maior influência do uruguaio quando próximo dos atacantes, claro exemplo de potencialização máxima de um futebolista superior. Àquela altura, as conversas em grupo no CT do Urubu – e, em diversos casos, encontros individuais com os vários jogadores com os quais a equipe de Dorival tem relacionamento antigo – já tinham assegurado o compromisso dos atletas com a plataforma de jogo que levaria à explosão ofensiva da partida de volta contra o Tolima, quando o Flamengo se apresentou num 4-1-2-1-2 (considerando a altura de cada linha, de maneira ilustrativa) e fez 7 gols no Maracanã.
O meio de campo em formato de losango permite que Everton Ribeiro atue confortavelmente como meia pelo lado direito e promove a constante movimentação que confunde a defesa oponente, já preocupada em conter Pedro e Gabriel, parceria que depende da disciplina na ocupação de espaços para que ambos joguem para si e para o outro. Gabriel, também um excelente passador, já notou como essa coordenação pode alimentar suas virtudes goleadoras e fazer do Flamengo um time ainda mais perigoso. O relacionamento de confiança com a comissão técnica, desde os tempos de Santos, tem se mostrado crucial para esses ajustes.
O que acelerou o processo, acima de tudo, foi a qualidade técnica dos jogadores envolvidos e uma capacidade cognitiva acima do normal. Tanto que a dinâmica do trabalho de utilização de vídeos ganhou uma camada adicional na confecção de movimentos ofensivos. Tentando simplificar, com um exemplo corriqueiro: em treinamento, quando a bola chega a um jogador aberto por um dos lados (seja o lateral ou o atacante que joga por ali), é necessário que um companheiro se projete no espaço e ataque a linha defensiva adversária. A comissão técnica não determina qual é esse jogador, deixando a tomada de decisão para os atletas. Não é um comportamento rígido, mas uma tarefa que deve ser executada. Quando esses movimentos são realizados em competição, o vídeo registra a maneira como os jogadores resolveram situações, o que retorna ao treinamento como padrões criados sem que os futebolistas percebessem.
A próxima etapa é a inclusão de Everton Cebolinha – e, mais tarde, de Arturo Vidal – neste cenário de organização ofensiva. O Flamengo trabalha tanto com a possibilidade de substituição de um jogador no losango quanto com a ideia de um retorno, conforme as circunstâncias de jogo e adversário, ao desenho com dois pontas abertos e um centroavante. Propostas, ou respostas, à exigência permanente do futebol. Ao contrário do que se pode pensar, Cebolinha não é um “intruso” numa festa em que todos estão se divertindo, mas mais um convidado para se juntar à animação.
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Durante a comemoração do primeiro gol de Rony, na noite de quinta-feira, é bem possível que algum membro da comissão técnica do Palmeiras tenha sacado um caderninho de notas e escrito o nome do mais novo integrante de uma lista em franca expansão: Botafogo. O time carioca foi a vítima mais recente de um movimento ofensivo que já encaminhou um troféu da Copa Libertadores e tem ludibriado defesas Brasil afora; a bola sai dos pés do zagueiro que atua do lado direito em direção a um atacante colado à linha lateral, que espera a passagem de um jogador por dentro, que vai ao fundo e faz o passe para trás. Por vezes, a conclusão parte da risca da grande área, ou da região da marca do pênalti, ou um pouco mais à frente. Há ocasiões, como em Montevidéu, em que a marcação precisa ser arrastada para o centro e liberar o espaço, e a bola vai direto da defesa ao ataque. Contra o Botafogo, nem foi necessário. Scarpa passou desmarcado e só precisou dar sequência a uma jogada que é a mesma sempre. O resultado também.
O segundo gol de Rony, de cabeça após escanteio, é outro desenho frequente. Um gol que o Corinthians já levou três vezes neste ano, duas no mesmo jogo. Sempre do lado direito, com a bola encontrando alguém na primeira trave. Pode ser na quina da pequena área ou mais adiante. No caso de ontem, Murilo vinha atrás de Rony para garantir que a cobrança de Scarpa seria uma assistência. A defesa do Botafogo não marcou nenhum deles. Houve mais dois gols, um que Scarpa resolveu dentro da área, com pouco ângulo para finalizar, e um diamante de Wesley, desses para quem viu in loco contar aos filhos. A noite será lembrada pela maioria pelo golaço que encerrou os 4 x 0. Abel Ferreira e os observadores atentos, porém, guardarão as duas assinaturas do time mais competitivo e confiável do futebol no país. O melhor, hoje, entre os três considerados favoritos a tudo.
Ninguém treina uma equipe para fazer um gol como o de Wesley. Esses momentos são o bônus que um técnico recebe por ter jogadores qualificados, ou, melhor ainda, por desenvolvê-los. A reivindicação do trabalho de um treinador é enxergar, em competição, os comportamentos ensaiados quando ninguém está olhando. Quando esses padrões não só são repetidos como se tornam o motivo pelo qual um time é superior aos outros, diz-se que tal time tem uma identidade, sabe a que joga, é reconhecível. E quando esse reconhecimento fica evidente independentemente das escalações, o que se tem é algo que o jogo nesta parte do mundo raramente vê: uma equipe de autor, uma obra pronta. O gol que inaugurou o placar na decisão da última Libertadores foi executado por Gustavo Gómez, Mayke e Raphael Veiga. Dudu, que puxou Filipe Luís para o lateral passar, era o único que estava em campo contra o Botafogo.
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O futebol sul-americano costuma ceifar trabalhos antes que tenham qualquer possibilidade de se aproximar do estágio em que o Palmeiras se encontra. E mesmo aqueles que são capazes de erguer o pescoço acima da superfície por mais tempo normalmente não recebem a oportunidade de aprimorar as próprias ideias. Após uma visita ao Morumbi, no campeonato estadual, em que o Palmeiras fez um gol cedo e logo se retraiu para jogar no espaço, Abel foi questionado a respeito dos motivos que o levaram a suspender a pressão inicial que resultou na vantagem. Mais tarde, no mesmo torneio, o Corinthians esteve no Allianz Parque e foi controlado, com posse, por um time que passou longos trechos do encontro fazendo a bola circular no campo de ataque.
Enquanto o processo de montagem de equipes continua sendo ignorado ou desrespeitado por uma classe dirigente amadora e submissa ao combo arquibancada/redes antissociais/jornalistas organizados, Abel Ferreira ergueu um time que poderia ser identificado se os jogadores fossem apenas pontos móveis numa tela de computador. Os títulos têm óbvia importância e devem ser motivo de orgulho, mas provavelmente são a razão pela qual Abel ainda está aqui, desafiando a linha de produção de “fatos novos” e multas rescisórias.
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O Jardim dos Mosqueteiros, ponto de convivência em Roland Garros vizinho ao estádio onde fica a quadra Philippe Chatrier, é uma homenagem aos heróis que conquistaram a Copa Davis em seis anos seguidos, entre 1927 e 1932. A vitória de Jean Borotra, Jacques Brugnon, Henri Cochet e René Lacoste contra os Estados Unidos, no ano que iniciou a sequência, foi o motivo da construção do local que simboliza o tênis francês. Ali, numa área gramada ampliada nos anos recentes, estão as estátuas dos “quatro mosqueteiros” que batizam o troféu entregue ao campeão do Grand Slam parisiense. Desde 2021, está também a estátua de Rafael Nadal.
Borotra, Brugnon, Cochet e Lacoste têm, juntos, 10 troféus na chave de simples. Entre eles, o mosqueteiro que mais vezes disputou o torneio é Cochet, campeão em cinco de oito campanhas na era amadora. Bjorn Borg, cujo reinado de seis títulos – quatro consecutivos, de 1978 a 81 – marcou uma época em que ninguém o tocava no saibro de Paris, competiu em Roland Garros por oito anos. Gustavo Kuerten, o tricampeão que anda sobre um caminho de pétalas de rosas a cada vez que passa pelo portão do clube, tem onze participações no Aberto da França. Após a vitória deste domingo, a distância entre as conquistas de Rafael Nadal em Roland Garros e o número de aparições de nomes de histórica relevância no torneio dá a medida da magnitude de um domínio incompreensível.
Como se sabe, e já há algum tempo, a trajetória de Nadal em seu torneio favorito pode ser descrita pelos anos em que ele não foi campeão: 4 em 18. Seria o estabelecimento de um nível anormal de supremacia em qualquer torneio de elite. Em se tratando do evento tenístico mais difícil de vencer, em que as demandas físicas e mentais com frequência suplantam o aspecto técnico, os quatorze títulos do espanhol em Paris constituem uma façanha que pertence ao debate a respeito dos mais impressionantes feitos esportivos jamais alcançados. Para contexto, convém lembrar que Pete Sampras, um dos maiores tenistas dos todos os tempos sem absolutamente nenhum favor, tem 14 troféus de Grand Slam na carreira.
Acima de tudo, é uma história de amor. São diversos os exemplos notáveis na relação com o esporte que escolheu como profissão que Nadal tem oferecido ao longo de sua vida. Nos últimos anos, já além da idade que por muito tempo significou o fim da linha para tenistas, o que espanta é sua obstinação para seguir concordando com as exigências e aceitando as concessões pessoais necessárias para ser ele mesmo. O corpo não suporta mais, o tempo lhe traz adversários que o têm como ídolo, a sala de troféus particular e a fortuna amealhada o aconselham a se retirar sorrindo. E aí está Nadal, obcecado pela décima-quarta taça como se tivesse perdido todas as outras, apaixonado pela única superfície que só pertence ao tênis, a ponto de, ao se recusar a abandoná-la, sustentar-se como o maior vencedor de torneios do Grand Slam.
Após a conquista do décimo título, Nadal foi presenteado com uma réplica da Copa dos Mosqueteiros do mesmo tamanho da original, com a inscrição “La Décima” na base. Agora, há quem entenda que a Federação Francesa de Tênis deveria renomear a quadra Philippe Chatrier para homenageá-lo. É perfeitamente apropriado, mas não suficiente. Se fosse possível consultá-los, Borotra, Brugnon, Cochet e Lacoste certamente aplaudiriam a mudança do nome do troféu de Roland Garros para troféu Rafael Nadal. Em vida, para que o maior mosqueteiro de todos saboreie a distinção que sua história inacreditável merece.
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Na véspera da final da Liga dos Campeões, perguntaram a Rafael Nadal o que era mais fácil: ele ganhar Roland Garros ou o Real Madrid conquistar o principal troféu do futebol europeu (a contagem de cada um, numa coincidência que deve significar algo mais, era de 13 taças no dia da entrevista). O rei de Roland Garros respondeu, sorrindo, que a missão do Real Madrid – clube para o qual torce – era mais simples porque lhe faltava apenas um jogo. Horas mais tarde, com a presença de Nadal no Stade de France, o gigante branco venceu o Liverpool e gravou seu nome uma vez mais na desejada prataria, dobrando a quantidade de títulos do segundo clube mais vitorioso no torneio, o Milan.
A campanha do Real Madrid nesta edição da Champions ilustra à perfeição o que se pode chamar de título inevitável. Cada virada – PSG, Chelsea e Manchester City ficaram pelo caminho, em confrontos nos quais o Madrid se levantou de um cemitério distante e deu a volta em placares impossíveis em circunstâncias normais – acrescentou contos à lenda do “senhor da Europa”, injetando no time e na torcida doses incalculáveis não de confiança, mas de absoluta convicção de que nada nem ninguém seria capaz de impedi-los de alcançar “la decimocuarta”. E assim se deu, diante de um adversário superior em jogo, mas não neste jogo. O gol de Vinícius Júnior, ápice de um trecho da decisão em que o Liverpool se sentiu frustrado a ponto de recebê-lo com resignação, foi a única finalização certa do time espanhol na noite. Só os céticos mais perseverantes seriam capazes de reler a história escrita desde as oitavas de final e imaginar que o epílogo seria diferente.
No caminho para mais uma coroa, o Real Madrid mostrou como a obstinação e a experiência podem moldar situações em campo que parecem definitivas. Treinadores de diversas modalidades costumam mencionar a habilidade de compartimentalizar instantes como a fronteira que separa os esportistas geniais dos demais. Companheiros de Michael Jordan, por exemplo, dizem que um de seus principais atributos era a capacidade de “permanecer no momento” sempre que o time precisava de sua presença sobrenatural e tranquilizadora, ou seja, bloquear qualquer tipo de distração que o atrapalhasse na execução da tarefa mais urgente.
O Madrid novamente campeão europeu é Marty Byrde (entendedores entenderão). Ou o sujeito que, a caminho do aeroporto com a família, percebe que os passaportes ficaram em casa. Entre comentários nervosos de que não há tempo para voltar e que perder o avião acarretará em cancelamento de diárias de hotel, e que as crianças ficarão incrivelmente chateadas, e que as férias programadas com tanta expectativa se perderão por um lapso, e que não será possível remarcar passagens ou recuperar o dinheiro… ele para o carro, pede que a mulher leve os filhos ao aeroporto e convence o motoqueiro que passava sozinho a levá-lo em casa para buscar os documentos. As consequências de um atraso não consumado não existem enquanto houver tempo, a prioridade é o que precisa ser feito para entrar no avião. O mesmo vale para um gol – ou mais – sofrido a poucos minutos do final de um jogo eliminatório.
Também vale para Rafael Nadal em Roland Garros, território em que a ideia de derrotá-lo se assemelha a um devaneio adolescente. No domingo, o canadense Felix Auger-Aliassime conseguiu o feito de levar Nadal ao quinto set, algo que só dois tenistas (Isner, 2011; Djokovic, 2013) fizeram ao longo de 17 anos em Paris. Sacando com 3-4, Aliassime teve seu serviço quebrado para espanto de exatamente nenhuma alma que jamais esteve ali. Nadal venceu e melhorou seus números para inconcebíveis 109 vitórias e três derrotas no Grand Slam francês. Um encontro com Djokovic, um dos dois únicos oponentes a vencê-lo ali (o outro é Soderling), está marcado para esta terça-feira e é obviamente uma ameaça à dinastia de Nadal em seu torneio predileto. Não por coincidência, trata-se de um jogo que guarda muita semelhança com Real Madrid x Liverpool: é preciso considerar a possibilidade de uma instantânea disparidade a favor do sérvio, em condições físicas superiores, rumo a um desfecho com contornos do apagar de uma era. Por outro lado, cada longa troca de bolas numa dança equilibrada e sem hora para terminar pode conduzir ao mesmo tipo de frustração, e resignação, que o Liverpool experimentou em Saint-Denis.
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No intervalo entre o gol de Philippe Coutinho e a aparição de “Kundogan”, um período de 12 minutos e 19 segundos corridos, houve 6 minutos e 19 segundos de bola em jogo no estádio Etihad. O Manchester City, no precipício do que se apresentava como uma frustração indescritível, ficou com a bola por 94,9% do tempo. Ao final de 37 passes trocados, contra apenas 7 do Aston Villa, o time dirigido por Pep Guardiola marcou 3 gols e assegurou o quarto troféu do Campeonato Inglês nas últimas cinco temporadas.
Gabriel Jesus declarou que se sentiu nervoso após o segundo gol do Villa. Kevin De Bruyne confessou que, por dez segundos, pensou que o título estava fora de alcance. Ao reiniciar o jogo, o City converteu uma de suas piores atuações em muitos anos numa curta – pela urgência da situação – exibição de seu manual de futebol. Onde havia confusão, se viu clareza; onde havia pressa, se notou ritmo; onde havia dúvidas, surgiu convicção. Dois gols foram marcados por Gundogan, ambos na segunda trave, reforçando sua faceta de meio-campista “que chega”. O outro foi um passe para a rede de Rodri, com a frieza e a precisão de um cirurgião durante uma operação de emergência. O City virou e venceu com os movimentos ofensivos que o caracterizam, com calma, controle e brilho técnico, uma assinatura particular a um momento que o futebol mais frequentemente associa ao caos e a bolas que, sem que seja possível explicar, encontram seu destino inevitável.
Considerando o caráter da equipe de Guardiola e as peças reunidas para construí-la, foi um final plenamente apropriado. Lembrando das previsões e ironias que marcaram o início da passagem do técnico pela Inglaterra, porém, a compostura do City na pequena janela de tempo em que a temporada se decidiu é uma gargalhada que durará semanas. Do estilo que “jamais venceria” no país que inventou o jogo às conquistas que estabeleceram uma dinastia na principal liga do mundo. Da heresia por perguntar “o que são tackles?” na terra do futebol bruto às ideias que definem uma era e se propagam, como influência sobre treinadores e futuros jogadores, por toda a estrutura do futebol inglês. Mas nada, é claro, será capaz de satisfazer aqueles que enxergam o jogo através das próprias carências e estão sempre prontos a dizer “mas…”. Destes, o futebol apenas ri.
O que exalta a viagem do City, tanto quanto suas virtudes clínicas, é o adversário que o impede de descansar ou sucumbir às doenças dos vencedores. A obra de Jurgen Klopp no Liverpool é igualmente um monumento ao jogo, em especial por também expressar o futebol que um treinador carrega dentro de si desde que o encanto se apoderou de seu futuro. O Liverpool tem sido capaz de produzir pontuações que entregariam títulos em diversas temporadas na Inglaterra, mas, por ser contemporâneo de uma equipe histórica, até agora ganhou um. Neste curso que pode terminar com uma coroa da Liga dos Campeões, Klopp e seu time ganharam duas copas inglesas e “perderam” o campeonato por um ponto. Não há sentido em relacionar a palavra “derrota” a um desempenho deste nível, mesmo que o Real Madrid lhe negue a glória europeia. Este é o time que o Manchester City tem superado ano após ano.
No domingo passado, quando toda a pressão de 38 rodadas se comprimiu em pouco mais de seis minutos de futebol, o City encontrou a saída como foi ensinado a fazer: conservando a bola e a movendo com capricho milimétrico, até concluir o triunfo de um jeito de jogar que reina na Premier League.
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Palmeiras: Abel Ferreira cita momento em que decidiu lançar livro no Brasil; VEJA
Não surpreende que tenha saído da mente de Jorge Valdano mais uma reflexão educativa sobre um dos debates infinitos do futebol. Em texto recente publicado no diário espanhol El País, o ex-jogador e treinador argentino tratou da eterna “batalha cultural” entre jogar bem ou ganhar. Eis um trecho:
“A guerra dos estilos. O do futebol é um território emocional em que cabe de tudo, incluindo batalhas intermináveis com a do menottismo e o bilardismo, dois campeões do mundo que dividiram o futebol argentino e internacionalizaram suas diferenças. Há fanáticos das duas escolas, discípulos de um e de outro, conciliadores que não se cansam de fracassar e até algum esquizofrênico que, como eu, é menottista tendo sido campeão do mundo com Bilardo”.
Não há tempo para mencionar aqui algo minimamente suficiente sobre as obras futebolísticas de César Luis Menotti e Carlos Bilardo, o que representam para o futebol e como se antagonizam a ponto de simbolizar um conflito que o jogo não aceita. Se a escolha entre jogar bem ou ganhar realmente existisse, seria obrigatório contemplar a proximidade contraditória entre jogar mal e vencer. Mas Valdano se ocupa dos estilos – isto, sim, uma questão de eleição – e da categorização de treinadores, de maneira geral, entre atrevidos (Menotti) e precavidos (Bilardo). Em outros termos e alguns exageros, essa mesma polarização permeia a discussão futebolística no Brasil, com dois técnicos portugueses emprestando seus nomes a cada vertente.
É um recorde do imediatismo, claro. Jorge Jesus dirigiu o Flamengo por algo mais do que um ano, período caracterizado por troféus e futebol encantador. Abel Ferreira comanda o Palmeiras há 15 meses, com o tipo de prataria que marca uma era e um jogo menos exaltado. A rivalidade entre clubes candidatos e oponentes em tudo alimenta a formação de duas correntes que, fieis ao Brasil de hoje, são defendidas por legiões onde quer que o futebol seja assunto. Falar em jesuísmo x abelismo seria fermentar a hipérbole, mas o Mister (declarado admirador de Johan Cruyff) e Abel (proponente das ideias de José Mourinho) de fato representam maneiras distintas de jogar futebol.
Não é inteligente, no aspecto dos objetivos, discutir os métodos de um técnico que venceu o que Abel venceu no Palmeiras. No Brasil não há, hoje, outro time em que a influência do treinador seja tão perceptível no comportamento coletivo e na resposta dos jogadores. Se estiver acompanhando, Mourinho estará orgulhoso e, possivelmente, com saudades. Ao mesmo tempo, é perfeitamente razoável questionar se o futebol do Palmeiras precisa ser, digamos, expandido para que o Campeonato Brasileiro esteja ao alcance. Abel provavelmente concordará. Só não se deve pretender enxertar no coração de um técnico um tipo de jogo que ele não reconhece como próprio, por razões culturais, sentimentais e formativas.
Em entrevista ao mesmo Valdano, há alguns anos, Pep Guardiola relatou uma conversa com Diego Simeone, na ocasião em que recebeu uma visita do técnico argentino. Quando o papo chegou a um território específico – não mencionado – do manual de Guardiola, Simeone disse: “Disso eu não gosto. Não sinto..”. Pep sorriu e concordou: “Que ótimo. É disso que se trata”. Como alguém que não aceita negociar certos princípios de jogo, Guardiola não deveria se surpreender com a recusa de Simeone a rejeitar os próprios. E, assim, um menottista e um bilardista convictos deixaram para discutir suas ideias em campo, que é o local onde o futebol se expressa.
Valdano encerra a coluna – e a questão – com a classe que lhe distingue:
“A beleza. Do jogo infinito, que cada um ame a parte que mais gosta. Que eu saiba, não há nenhum estilo ilegal. Mas não me neguem o prazer dos pequenos vícios. (…) Entre ganhar ou perder, escolho ganhar. Entre jogar bem ou mal, fico com jogar bem. E que a batalha cultural seja vencida pelo melhor”.
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Palmeiras: Danilo fala da emoção de jogar a final, projeta duelo contra o Chelsea no Mundial e garante: ‘Vamos surpreender’
Mesmo quem não concorda com a forma como Abel Ferreira descreveu o encontro com o Chelsea na final do Mundial de Clubes – “Davi e Golias, nunca vendi ilusões” – precisa aceitar a metáfora, pois é assim que o técnico do Palmeiras preparou seu time para a decisão. É sempre importante relembrar que, no aspecto anímico-estratégico, Abel prefere se enxergar como Davi, embora dirija um gigante do futebol sul-americano. Sua formação recomenda e sua trajetória confirma a abordagem baseada na redução de riscos e exploração consciente dos defeitos de adversários tecnicamente superiores. O sucesso contra Atlético Mineiro e Flamengo na última edição da Copa Libertadores é amostra suficiente para antecipar como o Palmeiras lidará com o time inglês, obviamente o oponente mais qualificado do período de Abel como treinador no Brasil.
Na era da imbecilidade orgulhosa, cabe a explicação: a história de Davi e Golias é uma passagem bíblica que está no Primeiro Livro de Samuel, no Antigo Testamento. Davi foi o jovem pastor que defendeu Israel contra Golias, um guerreiro filisteu de quase três metros de altura que desafiou qualquer israelense para um combate individual até a morte. Na ausência de um soldado destemido a ponto de encarar o gigante, a fé de Davi o levou a aceitar a missão mesmo diante de tamanha desvantagem. Sem armadura para protegê-lo, armado com pequenas pedras e um tipo de estilingue, Davi foi para a luta contra Golias e sua espada. Davi viria a ser rei entre 1003 e 970 a.C., emprestando seu nome à estrela de seis pontas, símbolo de proteção que aparece na bandeira de Israel.
A vitória de Davi no combate mortal contra um adversário mais poderoso é frequentemente associada a eventos esportivos em que a diferença de nível é evidente. Abel Ferreira está correto, é o caso de Chelsea x Palmeiras, dois times que habitam mundos distintos de futebol, cujo encontro opõe formas diferentes de desejar o mesmo troféu e distribui as responsabilidades em partes desequilibradas. Como é futebol, e um jogo único, é razoável dizer que, em condições normais, o Palmeiras terá suas oportunidades. Retornando a Liverpool x Flamengo, em 2019, ocasião em que a distância técnica coletiva entre os finalistas era maior, o campeão brasileiro teve momentos. É natural que o Chelsea pretenda assumir a postura de time dominante em campo e exponha seus problemas de jogo, hoje mais numerosos do que quando conquistou a Champions, a uma equipe treinada para explorá-los.
Quanto a “jogar de igual para igual”, trata-se de uma leitura que só pode ser feita após a bola parar. Diz-se que é assim quando as ideias de cada time são identificadas em campo num plano de equilíbrio, mesmo que o resultado sugira outra impressão. No jogo de futebol, pode-se vencer de maneiras diversas, até aceitando o domínio do rival e investindo nas frestas que quase sempre surgem ou são provocadas. É muito improvável, pela forma como entende o futebol neste nível, que Abel dê alguma importância para a perspectiva de enfrentar o Chelsea “de igual para igual”. Ele está determinado a vencer o Chelsea, com a estratégia que enxerga como viável.
Curiosamente, a história de Davi e Golias guarda ainda mais semelhanças com jogos desta natureza. Davi tinha cinco pedras para tentar uma vitória improvável, ou seja, pouca margem para falhar. A primeira estilingada acertou o gigante entre os olhos, levando-o ao chão, mas ainda vivo. Diz a Bíblia que Davi não perdeu tempo; tomou-lhe a espada e o decapitou.
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Vinte e quatro horas depois que uma parte da torcida do Corinthians determinou que a diretoria do clube demitisse um treinador ao término do terceiro jogo do calendário, Rogério Ceni e Abel Braga tomaram conhecimento do “novo normal”: no futebol brasileiro, em 2022, o campeonato estadual não serve mais, apenas, para encerrar trabalhos após campanhas receberem notas baixas em provas que não têm valor. Como se tivessem se articulado no período tenebroso da pandemia, as pressões externas se apresentaram mais ranzinzas, mais impacientes, mais desavergonhadas, e – sim, sempre é possível – mais ignorantes. Nenhum técnico, seja quem for, está a salvo; nenhuma carreira está livre da desqualificação vulgar, por vezes vil, se não for capaz de moldar o processo de montagem de equipes ao gosto de quem não o conhece.
Há mais ou menos um ano, um treinador, de volta ao que é provavelmente o clube de sua vida, teve de pedir um prazo para ser julgado e talvez conservar seu emprego ante o diagnóstico dos especialistas, receosos de que aquele início de temporada irregular contaminaria a chance de conquistas. Era Cuca, campeão brasileiro e da Copa do Brasil meses mais tarde. O exemplo é extremo, sim, pois pode sugerir, especialmente para quem tem o hábito de ler o que não está escrito, que todo os trabalhos, regados com tempo e paciência, terminam por frutificar. Claro que não é assim. Ocorre, e isso é um fato, que o Atlético-MG poderia ter jogado fora um 2021 inesquecível por causa do Campeonato Mineiro.
Cabe repetir a pergunta: quantos títulos relevantes o Athletico Paranaense ganhará até que os demais clubes brasileiros percebam como se deve abordar essa aberração de três meses? Não há explicação plausível para que Ceni, a uma atuação ruim de receber o crachá de estagiário que Sylvinho exibia até quarta-feira (2), diga que o São Paulo talvez tenha cometido um erro de planejamento ao não iniciar o Campeonato Paulista com os jogadores que representaram o clube na Taça São Paulo de Futebol Júnior. O equívoco é gravíssimo, como podem atestar Miranda e os vários outros futebolistas do clube que não estão prontos, ainda, para competir. E não é que Ceni deveria estar em Bragança Paulista dirigindo os garotos na terceira rodada do estadual. Deveria ser missão de Alex, comandando o próprio time, enquanto Ceni treina a equipe principal na pré-temporada.
O mesmo vale para Abel Braga, chamado de burro durante o imprescindível encontro do Fluminense com o Audax Rio, pela terceira jornada do charmoso estadual carioca. Burrice é a utilização de jogadores titulares em partidas dessa natureza, expostos, junto com a comissão técnica, ao mau humor permanente de quem se relaciona miseravelmente com o futebol, com o estímulo das agendas que lucram com um nível de exigência insano que só destrói, só atrapalha, só prejudica. Além dos evidentes aspectos de rendimento no trecho importante do ano, tratar o estadual como um período de preparação ajuda a manejar expectativas e alivia a pressão sobre trabalhos em estágio inicial. Provavelmente também poupa a bateria do telefone celular de dirigentes que, com o disfarce de discursos modernos e a proteção de cheerleaders, optam por terceirizar suas responsabilidades a torcedores raivosos.
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Se é possível apontar algo positivo no episódio da faca em campo em Barueri, trata-se da ação dos jogadores do São Paulo que ajudaram a conter os invasores e evitar uma escalada de violência com potencial assustador. O fato de que atuar como agente de segurança não é atribuição de nenhum futebolista, em nenhuma circunstância, colabora para a compreensão da falência gerada pela construção da ideia de que estádios de futebol são locais em que condutas inaceitáveis em qualquer outra parte são toleradas.
Mais do que toleradas, estimuladas. Pelos distintos níveis de impunidade, pela licença para exibir comportamentos primitivos em nome da “paixão”, pela apresentação do jogo – com evidente colaboração da maneira como o futebol é comunicado ao público pela chamada mídia esportiva – como uma fábrica de deuses e idiotas, noção incompatível com a natureza de um esporte em que, por óbvio, se erra e se acerta como na vida. O invasor, do gramado, do CT ou da vida pessoal de jogadores, é perdoado como um enfermo do mistério do futebol, quase sempre apenas por ser um fraco, incapaz de controlar as próprias frustrações. E assim, repetidas vezes, a faceta mais perigosa do jogo, a que coloca em risco a vida de atletas, é convenientemente dispensada como um exagero.
Cenas lamentáveis! Palmeiras x São Paulo na Copinha é paralisado por invasão com direito a faca apreendida
Mais grave do que a faca que entrou, primeiro no estádio, depois no campo, é a partida não ter sido suspensa. Não importa o que estava em jogo, quanto tempo restava, se alguém se feriu ou não. A leitura de que o show deve continuar como forma de resistência à própria destruição é a capitulação aos interesses, aos acordos, ao negócio. E a um contrato assinado unilateralmente que estabelece que jogadores, esses alienados que não têm a medida dos privilégios dos quais desfrutam, são remunerados pornograficamente para servir, quietos e obedientes, aos desejos de quem se declara apaixonado, “até morrer”, pelo jogo.
Tal contrato é uma desgraçada reunião de ignorâncias. Uma delas é o desconhecimento, por opção, das dificuldades enfrentadas e superadas pela gigantesca maioria daqueles que são bons o suficiente para alcançar não só o profissionalismo, mas o estrato mais alto da pirâmide. Há raros setores de atividade em que a meritocracia está tão escancarada quanto num campo de futebol de primeiro nível. Também há quem seja equivocado a ponto de julgar que ali se encontram incapazes que merecem ser punidos quando envergonham o orgulho dos fanáticos, de onde se justifica a violência sugerida, ameaçada, e, por ora, ainda não materializada de maneira irreversível, contra jogadores.
Mas falta pouco, e as abordagens a um problema cujo aviso já ultrapassou o prazo de validade são tão falhas que aqueles que estão sob risco não deveriam esperar a aparição espontânea das soluções. Não, não é justo que se cobre dos jogadores os movimentos que ao menos podem levar a um impasse, a uma pausa que exija algum tipo de reflexão esclarecida. Talvez, porém, tenha chegado a hora, antes que se produza um mártir. Diante da violência que obriga futebolistas a se protegerem dentro de campo, a resposta apropriada deve ser a ausência de futebol. Que se recusem a jogar. Que vão para o vestiário e não retornem, que se unam e se coloquem acima das questões frequentemente utilizadas como argumentos para que sigam sob ameaça. Está claro que ninguém fará isso por eles.
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A resposta do funcionário do balcão do check-in foi do tipo que não permite interpretações: “Senhor, fechou para pousos e decolagens. Não tenho como dar qualquer previsão”. Não era necessário conhecer a fundo o funcionamento de aeroportos para concluir que a ponte-aérea para São Paulo não sairia naquela manhã. A região do Santos Dumont parecia estar sob uma daquelas naves alienígenas que assaltaram o planeta em “Independence Day”, impondo uma escuridão incompatível com o horário. A chuva forte e o vento não eram o problema mais grave, explicou o rapaz a um grupo de passageiros apressados e recém apresentados a uma notícia ruim. O drama era a falta de visibilidade.
“O Galeão está aberto?”, questionou um senhor. Estava. As opções eram tentar a sorte no aeroporto internacional ou esperar, ali, que se fizesse a luz. A debandada na fila ilustrou o que a impaciência é capaz de fazer quando se tem o desejo, ou a obrigação, de estar em outra cidade antes da hora do almoço. Mas e se o mau tempo chegasse ao Galeão antes? Foi precisamente este o dilema contemplado durante a corrida de táxi entre os dois aeroportos cariocas. As feições do rosto do motorista instantaneamente se transformaram quando informado sobre o destino, antes de passar a dissertar sobre a inclemência do clima em dias como aquele. “Outro dia peguei uma chuva na Perimetral…”.
O real significado da advertência só foi conhecido quando o trânsito parou, completamente, no Elevado da Perimetral. O mundo caía com força e ventava de tal maneira que o barulho da água batendo na lateral do carro chegava a assustar. No alto do Elevado, sem conseguir enxergar direito e sem qualquer perspectiva de sair do lugar, a experiência adquiria contornos traumáticos para quem sofre de claustrofobia ou simplesmente tem pavor de chuva. Caso da senhora no carro ao lado. Mãos cobrindo os olhos, cabeça balançando aos soluços, ela chorava e dizia coisas que tanto podiam ser orações como palavras de desespero. A dúvida seria resolvida sem demora. Ao notar o estado da senhora, o taxista pediu que ela abaixasse o vidro: “Abaixa! Abaixa! É só água…”.
A imagem do vidro do passageiro do carro dela descendo só não foi tão inacreditável quanto a do vidro do táxi fazendo o mesmo movimento, imediatamente seguido de uma rajada do que pareciam ser litros de água gelada. Uma cena surreal. O taxista gritava, perguntando se ela precisava de ajuda. “Nós vamos morrer aqui… vamos morrer!”, ela respondia. Descontrole absoluto. O vento dava a impressão de mover os carros, o que dava a impressão, bem pior, de que o elevado estava balançando. Era compreensível o pessimismo da vizinha motorista, já vencida pelas emoções e incapaz de raciocinar. Os vidros continuavam abertos, a água continuava entrando, a senhora continuava chorando. “Ela precisa entender que não tem o que fazer…”, disse o taxista.
O quê? Como assim, não tem o que fazer? “Não tem, tá na mão de Deus”, explicou. O taxista então chamou a atenção dela, pedindo para se acalmar e prestar atenção no que ele ia dizer. Ela prestou. “Senhora, se tiver de cair, vai cair! Não adianta perder a cabeça. Se tiver de cair, vai cair e todo mundo vai junto!”. Ela ficou olhando, sem reação. Ele finalmente fechou o vidro. A aventura terminou no Galeão, sem ocorrências. O voo para São Paulo só saiu à tarde. A cada ano, antes da última rodada do Campeonato Brasileiro, a cena retorna como se fosse ontem. Se tiver de cair, vai cair.
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Na noite de 17 de novembro, enquanto o São Paulo derrotava um time predominantemente reserva do Palmeiras no Allianz Parque, um grupo de torcedores se insurgiu contra o técnico Abel Ferreira. Concentrados no setor de cadeiras mais próximo ao banco de suplentes do dono do estádio, os defensores da instituição expressavam desgosto quanto às escolhas do treinador para a visita de um rival sanguíneo, a dez dias da final da Copa Libertadores. Quem não estava presente pode imaginar que teor de linguagem foi dirigido a Abel especialmente durante o segundo tempo, quando alguns titulares entraram num jogo cujo vencedor já estava definido.
No dia seguinte ao clássico, mesmo após as explicações do técnico do Palmeiras a respeito da escolha de jogadores conforme o que havia sido desenhado com vistas à partida de Montevidéu, houve quem chegasse ao extremo de afirmar categoricamente – sem que a “paixão” ou qualquer outra irracionalidade que caracterize o comportamento de torcedores possam ser utilizadas como estímulo – que o planejamento da comissão técnica do clube não só tinha sido mal feito, como comprometera as possibilidades de um segundo título continental consecutivo.
Mais: as críticas chegaram ao ponto de acusar Abel de “não entender o clube”, como se fosse razoável que um ex-jogador profissional, trabalhando como técnico do Palmeiras há mais de um ano, não tivesse a capacidade de identificar e compreender os contornos de onde está. O que Abel de fato não reconhece, e por isso todos os palmeirenses deveriam agradecer, é a mentalidade primitiva que alimenta a ideia de que um jogo contra um adversário tradicional, por um campeonato que o Palmeiras não poderia vencer, deveria ser prioritário diante da final da Copa Libertadores da América. Ou o nonsense de que é possível desejar as duas coisas num calendário como o do futebol brasileiro.
Palmeiras: ‘É um privilégio trabalhar com o Abel, ele ensina todo mundo igual’, conta Weverton
Há uma expressão em inglês, “to outcoach”, que infelizmente não tem tradução literal para a língua portuguesa. O significado, porém, é simples: quando um técnico supera outro no conjunto de influências que o jogo de futebol permite a quem não entra em campo. A partida no estádio Centenário ilustra essa dinâmica com rara nitidez. Dizer que o Palmeiras explorou os defeitos que o Flamengo fatalmente exibiria é apenas metade da equação, pois tais defeitos, primeiro, foram provocados. A jogada do primeiro gol, diretamente do traçado na parede para o gramado, revela o que leva jogadores a admirar quem os comanda. Do movimento coordenado de Dudu e Mayke surge o espaço para o lançamento cirúrgico de Gustavo Gómez. Antes, seis passes, do lado esquerdo do ataque à direita do campo defensivo, construíram a armadilha: Danilo, Piquerez, Scarpa, Zé Rafael, Piquerez e Luan.
O gol de Raphael Veiga é o evento específico que altera completamente a decisão, além de um exemplo de treinador em campo. Em vantagem contra um time tecnicamente superior, o Palmeiras direcionou a partida para os territórios em que era mais forte: o comportamento defensivo e estratégico. Pode-se não gostar ou entender que o elenco oferece condições para jogar de outra(s) forma(s), o que é discutível e fica para outro dia. Mas como proponente declarado das ideias de José Mourinho, Abel Ferreira desequilibrou as ações precisamente como planejou e aumentou as chances de vitória – e troféu – de seu time. Enfrentando um oponente que teria mais posse e cometeria erros, é cruelmente difícil argumentar contra essa abordagem.
Deyverson marca na prorrogação, Palmeiras vence Flamengo e leva o tricampeonato da Libertadores
E que fique claro: o que reivindica o planejamento da comissão técnica do Palmeiras para ganhar em Montevidéu não é o resultado final, mas o fato deste time, contra este adversário, ter chegado à prorrogação com boas perspectivas, embora o aspecto físico indicasse certa vantagem para o Flamengo. Treinadores de ponta estão cansados de afirmar que, no tempo extra de jogos desta magnitude, o desfecho está na cabeça dos jogadores e no balanço da sorte. A ocasião do segundo gol é mais uma tradução desta realidade, reunindo a falha imprevisível, a reação instintiva, a finalização imperfeita e a intervenção que deu a Casillas uma Copa do Mundo e a Deyverson uma Libertadores.
Não haverá desculpas a Abel, lamentavelmente. Uma das tarefas mais difíceis do futebol é entender por que se ganha. É coisa para gente preparada.
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Se a análise sobre o desempenho de Sylvinho como técnico do Corinthians não fosse uma evidência da soma dos defeitos do futebol brasileiro, ao menos se poderia louvar o interesse de uma porção da torcida – a maioria do público de 43.583 presentes a Itaquera aplaudiu os jogadores e só vaiou o treinador – por como o time tem se apresentado, não apenas se ganha, perde ou empata. Mas obviamente não se trata disso, pois nem mesmo um mínimo de curiosidade há, de forma geral, sobre como se joga. A perseguição a Sylvinho se origina em algo ainda mais constrangedor: o futebol imaginário que qualquer técnico, seja quem for, tem a obrigação de oferecer a partir da chegada de quatro jogadores que teriam lugar em quase todas as equipes do país.
Talvez sempre tenha sido assim, em maior ou menor escala, mas existe uma casta de torcedores que passa muito mais tempo pensando e falando sobre os rivais do que sobre o time que diz amar. A absoluta irrelevância em termos nacionais que caracterizou a maior parte da temporada do Corinthians levou esse torcedor a uma síndrome que não é só resultadista (se fosse, a chegada ao G-4 após mais de 80 rodadas do Campeonato Brasileiro e seis vitórias seguidas em casa teriam amenizado os sintomas), mas também de estilo. O enfermo precisa ver seu time repentinamente jogando como os melhores conjuntos brasileiros e decide que é tarefa do técnico materializar esse devaneio. E não é que ele tenha apagado da memória que o time corria risco de rebaixamento antes das contratações de Giuliano, Renato Augusto, Willian e Róger Guedes durante o campeonato. Coisas desinteressantes como o processo de montagem de equipes de futebol nem chegaram a ocupar seu tempo.
Dos quatro contratados, quem mais atuou foi Giuliano, 19 vezes. Renato Augusto fez 18 partidas, Guedes fez 16 e Willian apenas cinco. Reunidas, as peças que deveriam converter o Corinthians na mais recente versão da Laranja Mecânica estiveram em campo pelo tempo equivalente a dois jogos. Dois. E há quem tenha o arrojo analítico de pedir grandes evoluções a um time no trecho final da temporada, quando todas as equipes brasileiras, exceto o Atlético Mineiro, estão atuando em nível abaixo do que são capazes. Novamente, se as críticas se resumissem a essa ideia, seria apenas um sinal de desconexão com a realidade. Mas a apresentação de Sylvinho como um técnico de capacidade insuficiente para dirigir este Corinthians (ele podia dirigir o anterior, né?) é uma peça tragicômica, vinda de quem vem.
Aos olhos dos que se incomodam com o jeito de Sylvinho se vestir ou se comunicar, a arrogância de classificá-lo como um estagiário é quase automática. Como se a contratação dos quatro fantásticos representasse o momento em que o técnico passou a viver um período de experiência, para mostrar que tem condições de seguir em 2022. Sob esta lógica, Sylvinho teria mais chances de ser o treinador no próximo ano se não aceitasse o convite há seis meses, e aguardasse o clube criar vergonha e montar, por amor ou por terror, um time à altura de sua camisa. A quem pede sua cabeça, uma sugestão: observe o comportamento dos jogadores, em campo e no banco, quando o Corinthians marca um gol. É um valioso indício de adesão ao que se faz no ambiente interno, e, em última análise, o que diferencia um técnico de um cadáver – profissionalmente falando – à beira do campo.
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Cuidado com as leituras definitivas sobre a preparação dos finalistas da Copa Libertadores. É tentador avaliar o momento de cada time com base nas últimas atuações, mas aspectos como nível de confiança e mobilização são muito difíceis de detectar.
A não ser, é claro, que se tenha informação neste sentido.
É bem provável que Flamengo e Palmeiras tenham atingido seus objetivos pré-decisão. Para o Flamengo, recuperar figuras fundamentais e reencontrar as melhores sensações. Para o Palmeiras, preparar jogadores para a(s) maneira(s) de atuar que pode(m) ser utilizada(s) em Montevidéu.
A cada rodada do Campeonato Brasileiro, o Atlético Mineiro exercita o que é ser campeão. Para o torcedor menos ansioso e mais disposto a curtir o momento, as semanas têm sido saborosas.
E lembrar que, no início da temporada, Cuca teve de pedir um prazo para ser criticado.
O debate sobre o Athletico Paranaense, novamente campeão da Copa Sul-Americana, não é ser ou não ser grande. Em estrutura, métodos, administração e troféus, não há qualquer dúvida sobre grandeza.
O debate é se o caminho até a grandeza, especialmente pelo mercado em que o Athletico está e o orçamento com o qual trabalha, servirá de exemplo para os demais.
Numa época em que se fala em legado para tentar convencer desavisados do que não é real, Óscar Tabárez representa o verdadeiro significado do termo.
É uma pena que a seleção uruguaia tenha atingido um momento tão ruim – e é claro que, como treinador, ele tem as responsabilidades correspondentes – que a necessidade de se classificar para a Copa do Mundo tenha se sobreposto ao que foi planejado para sua despedida.
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Em 25 de abril de 1973, Real Madrid e Ajax disputavam um lugar na final da Copa da Europa no estádio Santiago Bernabéu. Os holandeses tinham vencido o jogo de ida por 2 x 1, de modo que, no minuto 51, quando o meia Gerrie Muhren fez um gol com um chute de fora da área que desviou em dois defensores, a questão estava basicamente resolvida. O lendário time do Ajax, que viria a conquistar o título europeu em três temporadas seguidas, passou a controlar o jogo com longos períodos de posse até o inevitável final.
O encontro é tão lembrado pela superioridade incontestável do time de Amsterdã quanto por um “momento de arrogância e joie de vivre que resumia o caráter do Ajax de [Stefan, técnico] Kovács”, como Jonathan Wilson conta em seu livro “A Pirâmide Invertida”. Totalmente desmarcado à esquerda da intermediária do Real Madrid, Muhren recebeu um lançamento de Wim Suurbier que atravessou o campo. O domínio com o pé esquerdo foi seguido de três embaixadinhas e de um instante em que Muhren pôs a bola a descansar sobre seu pé, antes de fazê-la escorregar para o solo e tocá-la para Ruud Krol, que passava por trás dele num trote quase descompromissado. Nas palavras do próprio Muhren, relatadas no livro: “Eu sabia que ia passar a bola a Krol, mas precisava de algum tempo até que ele me alcançasse. Então brinquei um pouco até ele chegar. Você não planeja fazer algo assim. Não pensa nisso. Você apenas faz”.
No último sábado, já nos minutos finais de um jogo do Campeonato Brasileiro, algo semelhante aconteceu. O Internacional vencia o Athletico, no Beira-Rio, quando o meia Maurício recebeu um passe de cabeça de Patrick, e, em progressão, carregou a bola fazendo embaixadinhas. Após sofrer falta de Leo Cittadini, Maurício foi agressivamente cobrado por Pedro Rocha e David Terans, o que gerou um breve tumulto. O árbitro Ramon Abatti Abel então mostrou cartão amarelo para Terans, decisão que pode parecer exagerada, mas se explica pelo aspecto disciplinar. Já o amarelo para Maurício, que não reagiu ou respondeu, é das maiores atrocidades cometidas pela arbitragem nesta controversa edição do Campeonato Brasileiro.
Constam na súmula os motivos para as advertências. Para Terans, “provocou seu adversário com o dedo em riste”. Para Maurício, “atuou de maneira a mostrar desrespeito ao jogo”. É necessário repetir: na lógica da arbitragem que se exerce no futebol brasileiro, um jogador, em movimento, capaz de controlar a bola sem permitir que ela toque o gramado está desrespeitando o jogo, e não só merece ser repreendido como deve receber a mesma punição de quem provoca um rival com o dedo na cara. Não seria tão sério se fosse apenas uma cretinice, mas é algo mais profundo. O caráter do futebol como forma de expressão está na origem da relação das pessoas com o jogo. Mais do que um verdadeiro desrespeito, reprimir esses comportamentos é um ataque a um esporte que, tal como tantos outros, sempre foi e sempre será governado pelos próprios atores, independentemente da existência de regras e da presença de árbitros.
Brasileiro: Edenílson brilha, e Internacional vence o Athletico-PR de virada; VEJA gols
Daquela noite em 1973, Muhren guardou a reação, dentro e fora do campo, ao que hoje se considera um dano ao jogo de futebol. “Esse foi o momento em que o Ajax e o Real Madrid trocaram de posição. Antes, era sempre o grande Real Madrid e o pequeno Ajax. Quando eles me viram fazendo aquilo, o equilíbrio mudou. Os jogadores do Real Madrid ficaram olhando. Eles quase me aplaudiram. As pessoas no estádio estavam de pé”.
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Após a dramática tarde de ontem no Morumbi, Calleri foi à rede social para se desculpar pela falta violenta que deixou o São Paulo à mercê de ser goleado pelo Flamengo.
Pediu desculpas aos companheiros e à torcida, por uma escolha equivocada, no calor de um jogo em que seu time já perdia por 2 x 0 antes dos dez minutos.
A abominável necessidade de encontrar um culpado e apresentar sua cabeça aos abutres leva à cultura do perdão por erros em tomada de decisão, falhas técnicas, infelicidades diversas. Leva também ao exagero vaidoso de quem acha que jogadores devem o que quer que seja aos torcedores de seus times.
Se Calleri devia desculpas públicas a alguém, é a David Luiz. O nome do zagueiro do Flamengo não aparece no post.
Sobre futebol…
O estabelecimento de Michael como um jogador decisivo e confiante é uma grande notícia para o Flamengo, mas a aparição de Everton Ribeiro no Morumbi, por hierarquia e influência, certamente foi comemorada por Renato Portaluppi.
Os pilares do melhor time do país precisam estar presentes, e em seu nível habitual, para que o Flamengo recupere seu caráter coletivo. A goleada sobre o São Paulo, embora anormal pelo trecho inicial, foi um sinal animador.
O segundo gol de Yago Felipe, em Fluminense x Palmeiras, é um lance raro no futebol nacional. O tipo de finalização com requinte técnico que figuras de elite como Toni Kroos costumam assinar. Um formidável passe para a rede.
Quando gente como Kroos faz, o mundo se curva. Yago não merece ficar sem os aplausos.
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Um substantivo feminino cujo significado parece ter sido esquecido, ou, em certos casos, jamais aprendido, é um dos componentes essenciais do futebol: oposição, por vezes lúdica, entre dois ou mais indivíduos, grupos ou instituições que perseguem um mesmo objetivo em que cada um visa suplantar o(s) outro(s). Os dicionários explicam assim o sentido de rivalidade, embora o mistério do jogo o tenha alçado a um conjunto de sensações que não se permite descrever por intermédio de palavras ou qualquer outro código. Claro, não é este o problema, pois compreender racionalmente a rivalidade não é preciso, desde que se saiba exercitá-la sem contaminar sua origem. Quando a rivalidade é evocada para justificar danos ao jogo ou qualquer comportamento que o deprecie, é necessário retornar às explicações mais básicas e relembrar que nenhum time, por mais tradicional ou poderoso, existe sem seus adversários.
O futebol no Brasil já deixou para trás a desfiguração do conceito de adversário. Desde que se descobriu – pela vitória de sentimentos pouco nobres – que derrotar é melhor do que vencer, oponentes não só se converteram em inimigos como passaram a ser enxergados como alvos de extinção. Da arquibancada aos gabinetes, passando por maus exemplos midiáticos, de fato se crê que o cenário ideal para um determinado clube é ver seus rivais reduzidos a pedintes, de joelhos, ali apenas para sofrer o tipo de degradação que certa camada de torcedores entende ser a maneira certa de vivenciar o esporte. Não basta ganhar ou conquistar, é preciso destruir, condenar à irrelevância, expor à humilhação. É ainda mais grave quando jogadores assumem condutas que expressam tal nível de desprezo pelo “outro lado”, como se viu no último Gre-Nal.
Não se trata de indiciar Patrick, meia do Internacional, que, após o clássico, ergueu caixões alusivos ao provável rebaixamento do Grêmio e gerou o mais recente desperdício de testosterona em nome de uma instituição do futebol brasileiro. Ele não é o único, não foi o primeiro, certamente – e infelizmente – não será o último. Também não se trata de fazer a retrospectiva de episódios que levaram o encontro de <a href="http://Grêmio“>Grêmio e <a href="http://Internacional“>Inter, um monumento ao jogo no país, a ser um espetáculo recorrente em que o futebol se ofusca diante de tantos detritos. O jogo dos jogadores é distinto do jogo dos torcedores, motivo pelo qual o caminho para se inscrever na memória coletiva de um clube não pode passar por atitudes desrespeitosas, desde que, por óbvio, o próprio clube se dê ao respeito.
Nada disso guarda qualquer relação com as emoções indescritíveis que o jogo de futebol oferece a quem tem a sorte de experimentá-lo dentro dos gramados. Tentar estabelecer esse tipo de correspondência apenas desvaloriza tais sentimentos e apresenta futebolistas como seres incapazes de entender os verdadeiros valores da paixão dos que torcem. O que não significa dizer que a história deva ser vivida com o coração calmo, porque aí se perde o trecho mais especial da jornada. Compreende-se que o encontro de sábado tenha significado, aos olhos colorados, uma espécie de redenção após um período dramático que coincidiu com títulos gremistas. Até por isso, os dias a serem perseguidos são aqueles em que se erguem troféus, não caixões.
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Ainda sobre o Gre-Nal…
Ao tirar Miguel Borja de campo, independentemente do nível da atuação do atacante gremista, Mancini abandonou a chance de um gol inevitável.
Cuadrado, Cantillo, Zapata e Falcao – todos convocados, assim como Borja, para enfrentar o Brasil pelas Eliminatórias – marcaram no sábado.
O domínio do Manchester City no dérbi da cidade pode ser descrito pelo movimento do segundo gol, em que todos os jogadores do time visitante tocaram na bola ao longo de 26 passes, ou pelo fato do United ter dado mais chutes contra o próprio gol do que ao gol adversário.
Mas o dado de que o United não pisou na área do City entre os 25 minutos do primeiro tempo e os 49 minutos do segundo, em sua própria casa, é definitivo.
Renato Portaluppi não é nem o gênio venerado quando as coisas no Flamengo iam bem, nem o imprestável massacrado enquanto as coisas vão mal.
Mas é curioso ver aqueles que praticamente o pediam na seleção brasileira solicitarem sua demissão antes mesmo da final da Libertadores.
E sem se envergonharem disso, claro.
Note quem fica indignado quando um técnico que vem de outro país, como Abel Ferreira, põe o dedo nas feridas do futebol brasileiro.
Você verá que a indignação está relacionada a quem fala, não a o quê. É triste, e ajuda a explicar por que são feridas tão antigas.
O favorito à decisão da Copa Libertadores segue sendo o Flamengo, que tem um time superior e reúne mais jogadores decisivos. Essa ideia não muda por causa das últimas atuações das duas equipes.
O que muda é a impressão de favoritismo, afetada pelos jogos de um Flamengo que sofre pela ausência de figuras importantes e em clara crise de confiança, e de um Palmeiras que não poderia estar fazendo uma preparação melhor para o grande jogo.
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Houve um momento da temporada em que se pôde imaginar um encontro decisivo entre Atlético-MG e Flamengo. Na final da Conmebol Libertadores ou – melhor, por ser em ida e volta – da Copa do Brasil, os times que receberam mais elogios ao longo do ano poderiam, digamos, acertar contas. Mas Palmeiras e Athletico-PR tinham outros planos, de modo que o “melhor evento” que o futebol brasileiro pode oferecer ficou restrito a um sábado à noite no Maracanã, com o Flamengo em modo de emergência e o Atlético-MG já eliminando rodadas no Campeonato Brasileiro.
A obrigação de vitória, de fato, estava apenas de um lado. O Flamengo não poderia perder pontos, sob pena de perder também seu técnico no trecho final do caminho para Montevideo. O Atlético teria de se mobilizar para aplicar à noite um caráter fictício de tudo ou nada, pois, na contabilidade para o título, a distância para o rival ficaria confortável com qualquer placar. Adversários históricos, ambos não se viam disputando as mesmas coisas há tempos, o que serviu para um recrudescimento nas relações – com o obrigatório e constrangedor embate diário entre os “defensores das instituições” nas redes antissociais – e o tipo de aumento na temperatura que pode contaminar jogos de futebol.
Flamengo deve mirar no tri do Campeonato Brasieliro ou no título da Libertadores? F360 debate
Ao final, estritamente do ponto de vista técnico, o que era para ser o ponto alto do ano futebolístico no país revelou-se um absoluto anticlímax, e, embora não seja justo responsabilizar apenas treinadores e jogadores pelo desempenho decepcionante, é necessário reconhecer que há algo errado quando os dois elencos mais talentosos do Brasil produzem um jogo do qual sobra pouco. E não se trata nem de recordar que, com frequência, seja aqui ou em qualquer lugar onde o futebol é importante, encontros precedidos por boas sensações terminam por rejeitá-las. A competitividade fala mais alto e o espetáculo se perde em meio a estratégias e equilíbrio. Mas não foi isso que se deu no gramado – novamente ruim, o que colabora para compor o cenário opaco – do Maracanã, em que os dois times jogaram mal. O critério aqui é a amostra oferecida por ambos do que são capazes de fazer, e não uma visão utópica baseada no que poderia ser apresentado ao mundo como um bom exemplo do produto nacional.
O Flamengo construiu um gol com uma rapidíssima aparição de seu jogo natural, e, em vantagem, se pôs a competir como se não fosse o conjunto dominante dos últimos anos. Se é verdade que a missão suprema de um treinador é tomar as decisões que aproximem sua equipe da vitória, também se notou, talvez pela novidade, um time de certa forma descaracterizado. Fica a questão se foi um recurso momentâneo para uma ocasião específica, considerando todos os problemas recentes e as características do oponente, ou se esta versão do Flamengo será vista novamente. Ao Atlético faltou clareza para pressionar um adversário em situação sensível e sobrou a irritação diversionista própria de quem não esteve à altura da exigência.
Cada um seguirá seu caminho, provavelmente aliviado por não ter de pensar no outro. Não era esse tipo de conclusão que um jogo dessa natureza deveria gerar.
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Ocorrências como a invasão do gramado da Arena do Grêmio devem ser analisadas não pelo que aconteceu, mas pelo que poderia ter acontecido. Se o alvo dos cretinos convictos da impunidade não fosse a pobre cabine do VAR (que acertou nos lances do pênalti para o Palmeiras e do segundo gol gremista), mas pessoas, hoje se lamentaria um evento trágico. O tipo de evento que se aproxima perigosamente.
Houve tempo e meios para algo muito, mas muito pior do que o prejuízo material registrado. Só não houve a intenção.
Quanto ao jogo, ficou claro que o Palmeiras cumpriu, com sucesso, mais um ensaio para a final da Copa Libertadores. O modelo parece recuperado, o que é mais importante do que a cobrança por variações.
Em entrevista ao “Bola da Vez”, o presidente do São Paulo falou sobre o calendário do futebol brasileiro como se fosse um mero observador. Julio Casares também falou sobre o problema gerado por tratar como “Copa do Mundo” o exato motivo pelo qual o calendário é como é.
Casares soa como se o investimento do São Paulo no Campeonato Paulista não fosse uma decisão do clube. Ou como se ele não tivesse participado.
Nenhum dirigente cujo clube age de forma semelhante pode reclamar do calendário, ou dizer, como também disse Casares, que “o produto futebol deve ser repensado”.
Já os dirigentes do Athletico Paranaense podem.
Aliás… quantas temporadas de sucesso do Athletico serão necessárias para que se compreenda o óbvio?
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Um dia, quando Abel Ferreira estiver trabalhando em outro país, uma parte do ambiente futebolístico brasileiro lamentará a perda da oportunidade de conversar sobre futebol com um treinador que não rejeita o debate público. Sim, o flerte com a arrogância é parte do pacote, especialmente na derrota, e, sim, a visão distorcida do que seja o papel de jornalistas também precisa ser considerada, mas o técnico do Palmeiras não aborda entrevistas como ocasiões para exibir o resultado de cursos para falar ao microfone e/ou dissertar sobre o nada. Ao contrário, quando perguntado sobre o jogo, ele responde com jogo, mesmo que isso signifique revelar o que a maioria de seus colegas teme.
Após vencer o Ceará, na semana passada, Abel não apenas tratou da atuação de seu time em Fortaleza, como também explicou como o Palmeiras pretende ser campeão da Conmebol Libertadores. Ao dizer que pediu à equipe que “não abdicasse da bola sempre quando o adversário não é melhor”, o plano de como enfrentar o Flamengo no fim de novembro na final da competição continental, que terá transmissão ao vivo do FOX Sports e pela ESPN no Star+, ficou evidente (se ainda houvesse dúvidas). Abel passou a temporada claramente incomodado com a ideia de que o Palmeiras deveria jogar “outro tipo de futebol” – mais próximo do que fazem Atlético Mineiro e Flamengo, adversários que constituem o trio de candidatos a tudo no Brasil –, baseada num time imaginário que seria formado pelos jogadores que compõem o elenco do clube. Suas convicções, ou seja, o jogo que ele sente e enxerga como mais apropriado para o time que dirige, sempre lhe disseram outra coisa. E se a possibilidade de uma alteração de rumo com vistas à decisão em Montevidéu parecia próxima de zero, as últimas atuações do Flamengo certamente encerraram o caso.
Garoto John Kennedy brilha, e Fluminense faz 3 a 1 no Flamengo; assista
Abel Ferreira é um proponente das visões de José Mourinho, compatriota que entende que os chamados times “de posse” vivem sob o permanente risco de pagar caro por erros inevitáveis a essa forma de jogar. A estratégia para enfrentá-los passa pela recusa a discutir a posse, investindo na precipitação e capitalização desses erros. Assim o Palmeiras viveu seus melhores dias desde o ano passado, e, quando as coisas não andaram bem, a dificuldade para ser protagonista com a bola diante de oponentes inferiores tecnicamente mostrou, de maneira indiscutível, como o time se sente mais cômodo. A não ser que Renato Gaúcho dê uma cartada extremamente arriscada e improvável, a dinâmica da final da Libertadores terá o Flamengo com a bola e o Palmeiras com o espaço. É exatamente o desejo de Abel.
O atual estágio de atuação do Flamengo – considerando os desfalques – lhe dá razão. Contra Cuiabá e, especialmente, Fluminense, o que se viu do melhor time do país foi uma versão defeituosa de si mesmo, incapaz de desordenar rivais por intermédio de superioridade técnica e exposta ao ter de se defender. É o inferno de equipes habituadas a dar as cartas, instalar-se no campo do adversário e impor suas vontades. Pode-se perfeitamente apontar soluções de jogo para esse dilema, como por exemplo a sugestão do ataque posicional, com o acréscimo de um atacante e a disposição de jogadores entre os defensores rivais de forma a alargar a linha mais próxima da área. A questão é que, como tudo, essa organização ofensiva precisa ser treinada, compreendida e interpretada pelos futebolistas. Antes de mais nada, precisa ser parte do manual do técnico, e está claro que Renato prefere que seus times utilizem a bola como referência para associações. É o futebol que ele aprendeu, jogou (muito) e propõe como treinador.
No momento, a um mês da final, não está funcionando. As perguntas que o Flamengo se faz agora indicam as respostas que Abel Ferreira já tem.
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A atuação do Corinthians em Porto Alegre é um exercício para dirigentes habituados a terceirizar suas obrigações para curiosos de rede social e notas oficiais de torcidas organizadas (e talvez até para o ‘fogo amigo’ no canal oficial do clube no YouTube). Um time que não está ao lado de sua comissão técnica não vira um jogo fora de casa contra o Internacional, uma das boas equipes do campeonato.
Há cartolas que só querem o bônus de comandar clubes grandes, direcionando o ônus para quem não tem de palpitar. É típico.
E claro: se o desrespeito de Marcelinho Carioca a Sylvinho foi proposital para enfraquecê-lo, o Corinthians deve se envergonhar. Se não foi, deve pedir desculpas.
Inter faz golaço no fim e busca empate contra o Corinthians no Beira-Rio; assista
Um passe é uma conversa entre dois jogadores. Everson, goleiro do Atlético Mineiro, ao se posicionar mais perto da lateral, disse a Nathan Silva que queria facilitar sua tarefa. Nathan não ouviu, ou não entendeu. Acontece.
O acidente no Mineirão pode ser analisado por diferentes ângulos, com exceção de um: a ‘lei’ de que não se recua a bola na direção do gol. O futebol avançou e o goleiro joga como os demais. Os recuos devem ser estimulados e treinados.
Mais uma: nota-se, entre o time e a torcida do Atlético, a comunhão própria das grandes equipes.
Disponibilizar os áudios do VAR, medida que, em tese, colabora para a transparência, só aumentará a pressão sobre os árbitros brasileiros. O que o VAR da CBF precisa é de padronização (no posicionamento de câmeras, por exemplo) e qualidade de imagens para a tomada de decisão. No dia em que tudo funcionar bem e a ferramenta cumprir seu papel, os áudios comprovarão.
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