O mercado é mais duro com Lula do que foi com Bolsonaro, diz Paulo Rocha, líder do PT no Senado – ISTOÉ

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CRÍTICO O senador Paulo Rocha diz que “não funciona” o discurso sobre gastança do PT: “investimentos são necessários para tirar o País do buraco” (Crédito: Agência Capta)
Ana Viriato
09/12/2022 – 9:30
O senador Paulo Rocha (PT-PA) transita pelos corredores do Congresso há 30 anos e conhece como poucos os meandros da articulação política. Não à toa, compôs a linha de frente do time escalado por Lula para destravar no Senado a PEC da Transição, que amplia o teto de gastos para bancar R$ 145 bilhões em despesas do Bolsa Família por dois anos. Afinado com o presidente eleito, Rocha afirma que, sem a medida, que ainda precisa ser aprovada na Câmara, o País corre o risco de parar e reclama da cobrança do mercado e de uma ala do parlamento por uma nova âncora fiscal. “Não vi a mesma pressão nos quatro anos do precário governo de Bolsonaro”, dispara. “Uma âncora é necessária para disciplinar a economia e o crescimento, mas precisamos de planejamento estratégico e não apenas de um instrumento frágil, desenvolvido às pressas”, emenda, Líder do PT no Senado, Rocha ressalta a urgência de outras soluções para desenvolver o País, como a Reforma Tributária, e o fim das emendas de relator, que comprometerão R$ 19,4 bilhões dos cofres públicos apenas no próximo ano. “O orçamento secreto é um símbolo das maldades que Bolsonaro fez. Desorganizou o Orçamento da União e direcionou recursos para a compra de parlamentares”, diz o petista.
O PT apostou alto na PEC da Transição, estabelecendo uma previsão de gastos extrateto de R$ 198 bilhões e quatro anos de licença para gastar. O objetivo era garantir espaço para a negociação que resultou numa proposta mais enxuta?
Priorizamos e valorizamos o Congresso. Ao mandar uma proposta para que o Parlamento se debruce nisso, com a responsabilidade que tem perante o País, a gente apostou na capacidade de negociação para aprovar um texto que dê uma resposta imediata à população. Era natural propormos pelo menos quatro anos (de licença para gastar), porque esse é o período do governo Lula. Como não foi razoável para alguns, nos dispusemos a aprovar com o tempo de dois anos. Um ano não resolveria, porque ele se traduziria, na prática, em seis meses. Por quê? Porque, em junho, o governo precisa mandar a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Já com dois anos, conseguiremos resolver os problemas imediatos e trabalhar nas questões que demandam mais tempo.
A PEC abre portas para muitas possibilidades. Quais são as principais?
A aprovação da PEC é central e estratégica para o governo iniciar o mandato com o cumprimento da proposta pela qual a população nos elegeu: o combate à fome e à miséria, com a recuperação da economia para a geração de emprego e renda. A PEC não é para o governo, é para o País. Os números se balizam pelo pagamento do Bolsa Família de R$ 600, mais os R$ 150 adicionais por criança. Para cumprirmos isso, temos de adequar o teto. Teremos condições de manejar no Orçamento R$ 105 bilhões em diversas áreas, ajustando o salário mínimo acima da inflação, fortalecendo o SUS, com o incremento da Farmácia Popular, e retomando programas para atender os mais pobres. A gente pensa, ainda, em investir em políticas públicas que geram emprego e, consequentemente, resultam em impacto no crescimento econômico. É o caso do Minha Casa, Minha Vida. Ele não só reaquece a indústria da construção civil, como abre vagas de emprego e fomenta a economia local.
Mas era necessária tamanha licença para gastar?
É bom afirmar que o Orçamento enviado por Bolsonaro ao Congresso não inviabiliza só o próximo governo, inviabiliza o País. Veja os cortes na área da Saúde, nas universidades, nos investimentos já em 2022. As universidades não têm mais dinheiro para pagar o custeio no mês de dezembro. Não funciona o discurso sobre gastança do PT. Esse é um discurso fácil, mas não verdadeiro. Investimentos são necessários para tirar o País desse buraco em que o atual governo o jogou.

A PEC prevê uma discussão sobre uma nova âncora fiscal. Quando ela ocorrerá?
Sobre essa coisa da âncora fiscal, não vi a mesma pressão do mercado nos anos deste governo precário de Bolsonaro. Vamos pensar que temos também quatro propostas de Reforma Tributária em andamento. A discussão tramita há 30 anos no Congresso, desde a época de Fernando Henrique Cardoso, e não se chega a um acordo. Por causa das diferenças regionais, dos interesses de cada um etc. Apressar uma âncora fiscal sempre com o discurso de que queremos a gastança não é certo. O Lula demonstrou, em oito anos, o tamanho da responsabilidade e do compromisso fiscal diante dos problemas do País. Nós não fugimos de qualquer discussão política. Vamos buscar o que é melhor para o País. Mas não se pode apressar somente porque é o governo do PT que assumiu e agora entendem que têm que colocar uma corda no nosso pescoço. Esse debate é rebaixado. Por que tanta animosidade? Veja os resultados que alcançamos. Na era PT, deixamos reservas cambiais de R$ 370 bilhões, pagamos a dívida externa e construímos um legado de políticas públicas operantes para todos.
Mas a criação do substituto do teto será uma prioridade?
A âncora fiscal é necessária para disciplinar a economia e o crescimento. Mas precisamos de planejamento estratégico, não apenas apresentar um instrumento frágil. O fato é que nossa visão de Reforma Tributária é a seguinte: quem tem muito, paga muito, quem tem pouco, paga pouco e quem não tem nada, recebe. Essa é a Reforma Tributária que precisa ser construída. E isso não é fácil. É um processo de diálogo. No ano passado, avançamos bem numa proposta que tramita no Senado e que cria o imposto IVA dual, unificando, em dois impostos, os tributos federais, estaduais e municipais que incidem principalmente sobre o consumo e bens e serviços (ICMS, ISS, PIS e Cofins). Há outras tramitando na Câmara. Temos de continuar o debate em 2023 e brindar a população com uma reforma e um arcabouço fiscal que resolvam nossos problemas.
O sr. reclamou da pressão. O mercado é mais duro com Lula do que com Bolsonaro?
Claro que sim. E o pior é que o mercado financeiro nem sequer tem motivos para alimentar desconfianças sobre Lula. À época em que Lula governou o País, eles mantiveram seus negócios e ampliaram seus ganhos, sem nenhuma perseguição ou restrição. No agronegócio, a mesma coisa. Não há o que falar. Temos clareza que o campo é um setor importante para desenvolver o País e para a produção de commodities. Por isso, quando terminou nosso governo, deixamos o Plano Safra com R$ 280 bilhões no Banco do Brasil. O avanço da mecanização, da automação do campo, ocorreu a partir do nosso governo, que investiu em tecnologia e subsidiou juros para maquinários agrícolas. Aumentamos a produção do agronegócio, mas também fortalecemos a agricultura familiar, que é o que produz alimentos saudáveis para o povo. Setenta por cento do alimento do brasileiro vem da agricultura familiar. Lula tem autoridade para dialogar com todos esses setores sem nenhum problema. O que queremos é que eles fiquem dentro do País com esse sentimento de democracia, responsabilidade.
O nome de Fernando Haddad, aliás, não foi bem recebido. Há quem fale da completa submissão dele a Lula e das dificuldades de articulação. Para o sr., o que explica a resistência ao nome dele?
Nós não estamos entendendo. É uma visão antipetista em uma ala do mercado. O mercado fica nervosinho com um bocado de coisas relacionadas ao PT, mas não ficou nervoso com os gastos bilionários de Bolsonaro, que furou uma série de vezes o teto, em cerca de R$ 795 bilhões, e está deixando o País com um rombo nas contas públicas.
Outros nomes sofrem vetos do PT. Aliás, a indicação de que José Múcio assumirá a Defesa provocou a indignação de uma ala do partido, que lembrou que o ex-ministro votou contra as contas de Dilma no TCU e “subsidiou” o impeachment. É hora de deixar de picuinhas?
Tudo que sai sobre nomes é especulação. Formaliza-se um ministro apenas após o anúncio. Lula quer governar com todos os que o apoiaram. São 14 partidos. Precisamos ouvir todos os setores, ponderar todas as questões.
Mas insisto: é hora de deixar as divergências internas?
O impeachment já passou. Já era. Nem a prisão do Lula estamos colocando à mesa — e ela foi a maior maldade que fizeram contra nós. Ele voltou cheio de “paz e amor”, sem nenhum rancor. Nós sabemos o tamanho da responsabilidade e a dimensão dos problemas que envolvem a Nação.
O PT desistiu de enfrentar o orçamento secreto, certa vez apontado por Lula como a “maior excrescência política orçamentária do País”?
O orçamento secreto é um símbolo das maldades que Bolsonaro fez. Ele desorganizou o Orçamento da União, direcionou recursos para a compra de parlamentares. O orçamento secreto segue sendo uma excrescência. Tudo o que pudermos fazer para recuperar o Orçamento, faremos. Mas, para isso, passa-se pelo Parlamento. Precisamos de maioria. O governo, antes de tudo, precisa de uma base unida e forte para realizar qualquer mudança.
O caminho ideal, então, é acabar com o orçamento secreto via STF?
Não sabemos o que o Supremo decidirá ao final do julgamento, mas entendemos que a Corte deveria classificar as emendas de relator como inconstitucionais para que o governo retome o controle do Orçamento.
Falando, agora, no Senado: o PL lançou Rogério Marinho à presidência da Casa, em uma contraposição a Rodrigo Pacheco, do PSD, nome mais alinhado a Lula. O liberal pode complicar a vida do governo eleito?
Acho que ele tem que chegar aqui e se acomodar. Se concorrer mesmo, aplicaremos outra derrota neles. Creio que a candidatura de Marinho seja o “jus sperniandi” de Bolsonaro.

Apesar das movimentações internas, Bolsonaro, que deveria liderar a oposição, segue em silêncio. Como o sr. encara a posição do atual presidente?
Bolsonaro e o PL se perderam. O presidente parece cachorro quando cai na mudança e fica desnorteado na estrada. Acho que vão buscar outro tipo de liderança, de direção, para fazer oposição ao novo governo.
Bolsonaro não tem musculatura para isso?
Não é que ele não tenha musculatura. É pelo método dele de mentira, misturada com ódio, que resulta no confronto. O Brasil moderno não deu e não dará futuro a isso. O Brasil é um país religioso, de boa gente. Carnaval e futebol unem todo mundo. E o cara vem para a política com o método do ódio… Não dará mais certo.
Mas ainda há extremistas acampados em frente a quartéis.
São alguns poucos fundamentalistas.Logo serão uma minoria ainda mais clara. Com a recuperação da democracia e diante de um governo popular, que reorganizá o País e as contas, esse grupo sumirá.
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