ONU: "Se quiser ser levado a sério, Lula terá de lidar com caso Marielle" – UOL Confere

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.
Jamil Chade é correspondente na Europa há duas décadas e tem seu escritório na sede da ONU em Genebra. Com passagens por mais de 70 países, o jornalista paulistano também faz parte de uma rede de especialistas no combate à corrupção da entidade Transparência Internacional, foi presidente da Associação da Imprensa Estrangeira na Suíça e contribui regularmente com veículos internacionais como BBC, CNN, CCTV, Al Jazeera, France24, La Sexta e outros. Vivendo na Suíça desde o ano 2000, Chade é autor de cinco livros, dois dos quais foram finalistas do Prêmio Jabuti. Entre os prêmios recebidos, o jornalista foi eleito duas vezes como o melhor correspondente brasileiro no exterior pela entidade Comunique-se.
Colunista do UOL
17/11/2022 04h00
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva tem a obrigação de garantir que a impunidade não prevaleça no caso do assassinato de Marielle Franco, vereadora carioca morta em 2018. O alerta é de Clément Nyaletsossi Voule, relator da ONU sobre o direito à associação pacífica.
Em entrevista exclusiva ao UOL, o relator contou que irá enviar uma carta ao presidente eleito para tratar justamente desse caso, considerado como emblemático da violência no Brasil.

“Se o novo governo quer ser levado a sério, ele terá de lidar com esse caso”, disse o relator, em conversa em Genebra. “Ele precisa garantir que as investigações cheguem até as pessoas que ordenaram o crime, e não apenas até quem puxou o gatilho. Mas quem planejou e quem está na base disso”, disse.
“Isso deve ser uma prioridade, inclusive para a imagem do Brasil”, destacou o relator. No Brasil, Lula anunciou a participação de Anielle Franco, irmã de Marielle, como parte da equipe de transição do governo. Ela compõe o grupo que trabalha sobre políticas de proteção às mulheres.
“Quando vejo mulheres brasileiras, elas me dizem que nem podem participar do debate político e dão o exemplo de Marielle como “prova” de que podem acabar mortas”, disse.
“O caso de Marielle é uma espécie de símbolo de um país onde a luta contra a impunidade não é feita de maneira séria”, disse. “Sabemos que, em países onde temos violência política e uso excesso de forma, e ter alguém como Marielle sendo morta, isso da um recado a todas as demais mulheres que querem ou almejam ter essa posição. É um recado de que elas precisam ter cuidado, já que podem ser mortas”, apontou.
“O governo precisa usar esse caso para dizer que não irá aceitar nenhum ataque contra qualquer pessoa sem que haja um processo”, disse o relator. “Marielle é a ilustração de que o Brasil não está levando essa luta como algo serio”, insistiu.
Segundo ele, não houve vontade de lidar com a impunidade. “Estamos tratando desse caso há anos, com a atenção internacional. Se o caso dela não pode ser lidado, imagina quantos outros sequer chegam a ser considerados”, lamentou.
O relator ainda denunciou a violência estrutural contra afrobrasileiros e deixou claro que, em um país onde uma parcela da população pode ser “jogada no lixo, a insegurança é enorme”.
Voule esteve no Brasil no começo do ano e, para 2023, promete apresentar no Conselho de Direitos Humanos um detalhado informe sobre a situação no Brasil. Entre as várias sugestões, ele lidará com a impunidade e pedirá a criação de um protocolo para estabelecer regras sobre o uso da força.
O relator ainda vai defender a reconstrução da relação com a sociedade civil, considerada por ele como “fundamental para lutar contra fome e discriminação”. “Ela deve ser tratada como parceira, e não inimiga”, recomendou.
Alem do caso de Marielle, Vouler destacou ainda para os riscos que o Brasil sofre nos próximos anos com a liberação de armas e o impacto que isso pode ter no país. “Num paīs com acesso maior às munições, há uma intensificação maior de gangues”, completou.

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