Os crias da favela: os jogadores da seleção que driblaram fome e violência e insistiram no futebol para mudar suas vidas – Extra

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Pelo menos 11 jogadores da seleção brasileira começaram a sonhar com uma camisa amarela personalizada com seus nomes ainda numa favela ou conjunto habitacional bem próximo de uma. Em diferentes pontos do país, a fome de bola e a sede de vencer camuflavam o estômago vazio e a violência diária. Jogadores que aprenderam a dominar o corpo franzino, e muitas vezes subnutrido, caindo no chão vermelho e árido da várzea e a desviar dos atalhos para sair de uma vida sem perspectivas são hoje as estrelas que valem milhões e estão defendendo o futebol brasileiro na Copa do Catar. Os crias podem ser os primeiros no mundo a dizer que a favela venceu e deu ao Brasil o inédito hexa. Mesmo ainda longe da taça, esse time já é campeão por ter conseguido driblar as adversidades. Ao correrem atrás de uma bola, quase sempre descalços, deram um chute certeiro no que parecia estar traçado e fizeram um golaço contra o destino.

Pelo menos 11 jogadores da seleção viveram em favelas ou conjuntos habitacionais na infância
Pelo menos 11 jogadores da seleção viveram em favelas ou conjuntos habitacionais na infância Foto: rep instagram

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Pulando corpos
Criado na favela do Inferninho (não, não é um trocadilho) em Osasco, na Grande São Paulo, a infância de Antony foi como a de muitos garotos da periferia: lidar com a violência que parece bater á porta tofdos os dias. “Uma vez, na minha caminhada para a escola, quando eu tinha uns 8 ou 9 anos, encontrei um homem deitado no beco. Só que ele não estava se mexendo. Quando me aproximei, percebi que ele estava morto. Na favela, você fica meio anestesiado para algumas situações. Não havia outro caminho a seguir, e eu tinha que ir para a escola. Então, eu só fechei meus olhos e pulei o cadáver", disse Antony em texto publicado no site The Players’ Tribune. Hoje jogando no Manchester United, da Inlgaterra, Antony vale cerca de R$ 600 milhões.

Antony, criado na Favela do Inferninho em Osasco
Antony, criado na Favela do Inferninho em Osasco Foto: rep instagram

Arma na cabeça
Richarlison, autor do gol mais bonito da Copa até aqui e do placar de 2×0 sobre a Sérvia, sempre foi um garoto preocupado com as questões sociais e queria ajudar a família, que morava na periferia de Nova Venécia, município do Espírito Santo, que tem pouco mais de 50 mil habitantes. Vendeu sorvete na favela e trabalhou no campo. Um dia, quase teve a mesma sentença de vários amigos perdidos para e pelo crime: “Uma vez eu estava voltando da escolinha de futebol com meus amigos e um cara achou que estávamos vendendo drogas na área. Apontou a arma para a minha cabeça e me ameaçou, mas graças a Deus tive tranquilidade para explicar que estava voltando do futebol e que não vendia nem usava drogas. Eles queriam atirar em mim, mas o futebol literalmente salvou minha vida. Ele me soltou, mas fiquei com muito medo porque sempre acontecia. É mais fácil falar sobre isso agora, mas foi algo que marcou muito a minha infância. Lembro que andava na rua e me chamavam de vagabundo, bandidinho. Graças a Deus não virei bandido como falavam”. O Pombo preferido da torcida recebe em média R$ 150 mil por dia no Tottenham.

Richarlison vendeu sorvete em favela e teve arma apontada pra cabeça
Richarlison vendeu sorvete em favela e teve arma apontada pra cabeça Foto: rep instagram

Sem pai
Gabriel Jesus é cria do Jardim Peri, uma comunidade bem pobre de São Paulo. Jogava num campinho de terra seca e batida do presídio militar Romão Gomes, em Tremembé, na Zona Norte da cidade, quando foi descoberto, aos 8 anos. Enquanto Neymar e outros companheiros hoje de seleção disputavam a Copa de 2014, ele pintava as ruas da comunidade de verde e amarelo. Como muitos garotos na favela, Gabriel não conheceu o pai, que abandonou a mãe do jogador, Vera Lúcia, grávida. Ela é o maior exemplo que teve e tem. Não por acaso virou marca a comemoração “Alô, mãe” ao fazer cada gol de sua carreira. Jesus vale hoje cerca de R$ 450 milhões no Arsenal.

Gabriel Jesus não conheceu o pai e morou em favela até quatro anos antes da primeira Copa
Gabriel Jesus não conheceu o pai e morou em favela até quatro anos antes da primeira Copa Foto: rep instagram

Louco por Yakult
Casemiro tem uma lembrança bem forte da infância pobre passada numa comunidade de São José dos Campos, São Paulo. “A senhora que vendia Yakult no carrinho passava todos os dias à tarde na rua de casa, às 17h. A gente não tinha dinheiro para comprar e antes que ela chegasse em casa a minha mãe dizia: ‘vamos entrar que já está tarde’. Hoje, eu brinco com a minha mãe que quando vamos ao supermercado, compramos 80 garrafinhas de Yakult”, contou Casemiro numa entrevista. O companheiro de Antony no Manchester recebe R$ 112 milhões por temporada.

Casemiro não podia comprar Yakult na infância
Casemiro não podia comprar Yakult na infância Foto: rep instagram

Na companhia do avô
Fred Rodrigues está em sua segunda Copa do Mundo. A infância passada num conjunto habitacional na região de Venda Nova, uma das mais violentas de Belo Horizonte, não foi de tantas privações como a dos companheiros de time. Nunca faltou comida na mesa, Fred teve pai e mãe presentes, e a proteção do avô, Gersino, que fazia o trajeto escola, escolinha de futebol e casa de ônibus com o neto. Tudo para manter o menino na linha e fazer com que o sonho de riança virasse uma realidade que mudaria tudo. Fred hoje também joga no Manchester para o qual foi vendido por aproximadamente R$ 310 milhões.

Fred tinha companhia do avô para andar de ônibus
Fred tinha companhia do avô para andar de ônibus Foto: rep instagram

Uma bolacha no estômago
Nascido e criado em Bicas, interior de Minas Gerais, Danilo teve no pai seu maior incentivador. Caminhoneiro, muitas vezes era ele que levava o menino, morador de uma zona bem pobre, para se apresentar em escolinhas e clubes até conseguir uma chance num time de Juiz de Fora, a 40 km de sua casa. Muitas vezes, o zagueiro saiu da escola direto para o treino apenas com uma bolacha no estômago e só comeria de novo à noite. A família ainda vive na mesma cidade e todo ano, durante as férias, o jogador volta á escolinha onde aprendeu a jogar. Hoje atuando pelo Juventus, recebe em torno de R$ 2 milhões por mês.

Danilo Luiz ia treinar apenas com uma bolacha no estômago
Danilo Luiz ia treinar apenas com uma bolacha no estômago Foto: rep instagram

No meio do tiroteio
Thiago Silva, que está provavelmente em sua última Copa do Mundo, teve, assim como a maioria dos seus companheiros de seleção, uma vida bem sofrida. Morou anos em Santa Cruz, na Zona Oeste do Rio, a 100 metros da entrada de uma favela bem violenta. Enquanto soltava pipa e jogava no campinho, o capitão da seleção convivia com tiroteios entre policiais e bandidos. Para brincar na rua, ele esperava que a mãe cochilasse depois do almoço para sair e se juntar a molecada. Em 2005, na Rússia, Thiago teve um diagnóstico de tuberculose, foi hospitalizado em condições precárias e quase perdeu parte do pulmão, fruto de uma saúde que demandou cuidados que ão foram possíveis pela falta de recursos na infância. Jogador do Chelsea, ele tem hoje um dos maiores salários do futebol europeu: R$ 6 milhões por mês.

Thiago Silva jogava em campinho no meio do tiroteio
Thiago Silva jogava em campinho no meio do tiroteio Foto: rep instagram

Estudo veio antes
Criado na periferia de Imirim, na Zona Norte de São Paulo, Marquinhos teve a chance de jogar futebol na Centro de Formação e Treinamento de Atletas, onde começou como goleiro. Terceiro de cinco irmãos, foi o único que conseguiu mudar a vida da família através do futebol, que parecia ser a única saída depois de a mãe perder o emprego. Sempre estudioso, ele levou a sério a disciplina imposta pela mãe, professora. Muitas vezes, para não faltar a última aula do dia, Marquinhos abria mão de seu almoço para chegar a tempo de treinar. O valor de mercado do jogador é R$ 420 milhões.

Marquinho foi o primeiro de quatro irmãos a conseguir dar uma vida melhor para a família
Marquinho foi o primeiro de quatro irmãos a conseguir dar uma vida melhor para a família Foto: rep instagram

Por um Dolly
Ederson foi criado na periferia de Osasco, no bairro Rochdale, conhecido pelas enchentes e alagamentos. O goleiro começou suia trajetória jogando descalço, na rua. “A gente enfrentava os meninos da rua de trás e a jogava valendo dois litros de Dolly (refrigerante). Eu saia com o pé todo estourado, mas era uma alegria ganhar”, Na seleção de Tite, Ederson defende hoje o Manchester, onde recebe R$ 1,8 milhão por mês.

Goleiro Ederson: pés estourados no campinho de terra batida
Goleiro Ederson: pés estourados no campinho de terra batida Foto: rep instagram

Luvas de carona
O goleiro Alisson, titular da seleção, cresceu nuim apartamento simples no Loteamento Mundo Novo, um dos maiores conjuntos habitacionais do Brasil, em Canudos, bairro de Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul. O local é o segundo maior em criminalidade do município. Sem dinheiro para passagem, Alisson pegava carona na BR-116, que liga sua cidade a Porto Alegre. Ele carregava sempre uma mochila e suas luvas, herdadas de uma geração de goleiros de sua família. Defensor do Liverpool, recebe R$ 4 milhões por mês.

Alisson, o goleiro morou num dos maiores conjuntos habitacionais do Brasil
Alisson, o goleiro morou num dos maiores conjuntos habitacionais do Brasil Foto: rep instagram

2º mais valioso do mundo
Cria de uma comunidade em São Gonçalo, na Região metropolitana do Rio. Vinicius Jr. sequer tinha como pagar a escolinha de futebol que frequentou. Quando chegou ao Flamengo, tinha que pegar vários ônibus para chegar ao CT, percorrendo 145 kms. Foi morar com um tio na Abolição, que era um pouco mais perto. aos 14 anos. Passava três horas por dia em ônibus e muitas vezes deixava de comer para chegar a tempo. Hoje, uma das joias do real Madrid se orgulha de ter mudado a vida da família, mas quando pode ainda solta pipa pelos lados de “sãogonça”. Um dos melhores do futebol europeu, Vini é tido como o segundo mais valioso do mundo por R$ 1,2 bilhão. O primeiro é o inglês Jude Bellingham.

Vinicius Jr. percorria 145km de ônibus de São Gonçalo até o CT do Flamengo em Vargem Grande
Vinicius Jr. percorria 145km de ônibus de São Gonçalo até o CT do Flamengo em Vargem Grande Foto: rep instagram

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