Pesquisas mapeiam ações sobre corrupção e lavagem de dinheiro e letalidade prisional – Portal CNJ – CNJ
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Para a pesquisa “Lavagem de dinheiro, corrupção e recuperação de ativos: características processuais, funcionamento do arranjo institucional e alternativas de aperfeiçoamento”, realizada pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (INSPER), cerca de 500 mil processos da Base Nacional do Poder Judiciário (DataJud) foram analisados, além de entrevistas semiestruturadas – por conversa direta com os juízes e juízas entrevistados(as) – e por meio de survey, com questionários específicos. O formulário possui 30 perguntas, cujas respostas abastecem um banco de dados sobre a distribuição geográfica das questões relacionadas ao tema da pesquisa, a idade e tempo de carreira dos magistrados e magistradas e o tipo de unidades judiciárias que lidam com a matéria. Com respostas de 99 juízes e juízas, o levantamento já reúne informações de 22 das 27 unidades da Federação.
A amplitude do trabalho foi ressaltada pelos debatedores, que mostraram que é possível realizar boas pesquisas por meio do DataJud, com a segurança da base de dados. O universo da pesquisa abrange ainda 281 unidades judiciárias e 343 juízes e juízas, incluindo substitutos e substitutas. “Saímos do campo do ‘achismo’ e temos dados do Judiciário e do Sistema de Justiça com credibilidade, sem perder de vista que a pesquisa ainda está em desenvolvimento”, apontou o conselheiro do CNJ João Paulo Schoucair
A heterogeneidade regional é uma das hipóteses que estão sendo avaliadas pela pesquisa. Nos resultados parciais da pesquisa, por exemplo, a lavagem de dinheiro é destaque em processos no Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Rio Grande do Sul. Enquanto as questões de corrupção ativa estão mais presentes em Minas Gerais, Mato Grosso e Pará. Para o secretário-geral da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), Jorsenildo Dourado do Nascimento, a pesquisa traz uma visão regionalizada da Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo (PLDFT) que é importante para verificar a realidade local e contribuir para uniformizar a política em território nacional.
Também estão em avaliação o papel da cooperação entre os órgãos, que surge como fundamento para a investigação, sendo vista, a princípio, como algo positivo pelos magistrados e magistradas. Nesse âmbito, a cooperação internacional pode ser feita de forma direta, desde que não implique a cadeia de prova, de forma a contribuir com a investigação, sem a necessidade do controle do Judiciário. Outro aspecto analisado é a quantidade de varas especializadas e a qualidade de seus resultados, apontando a velocidade da tramitação e a qualidade da investigação, valendo ressaltar que o benefício da celeridade fica restrito ao julgamento em primeiro grau de jurisdição, não repercutindo no tempo total do processo.
Outra hipótese analisada pela pesquisa considera os métodos de solução consensual – à luz das evidências encontradas até o momento. Por exemplo, qual o percentual de magistrados e magistradas que acreditam ser positivo a existência de acordos individuais ou empresariais para o andamento dos processos e como isso impacta nessa tramitação.
Para os pesquisadores do Insper é preciso ainda levar em conta o processo histórico complexo do combate à corrupção e lavagem de dinheiro no Brasil. Até o momento, com os resultados parciais, nota-se que a magistratura tem confiança de que o que foi desenvolvido no Brasil até agora – como os acordos de delação premiada, por exemplo – é positivo enquanto avanço, mas é necessário cuidado com propostas inovadoras cujos efeitos ainda são desconhecidos.
O conjunto das ações da pesquisa – survey, entrevistas semiestruturadas e os dados do DataJud – além das informações adquiridas com a realização de dois workshops sobre a questão da corrupção e lavagem de dinheiro, serão subsídio para construir propostas que serão contempladas no diagnóstico final.
A construção de um novo campo de pesquisa e a definição de ação política sobre as mortes relacionadas à privação de liberdade são alguns dos principais objetivos do estudo Letalidade prisional: uma questão de justiça e de saúde pública. O relatório preliminar foi apresentado pelas pesquisadoras e professoras Maíra Machado e Natália Vasconcelos no segundo painel do seminário promovido pelo CNJ. O estudo está sendo realizado pelo Insper e pela Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas e também utiliza dados do Datajud.
De acordo com Maíra Machado, a estratégia utilizada foi estudar diversas camadas de ocultação de mortes caracterizadas pela violência, porque ocorrem dentro das instituições prisionais e são, em sua maioria, naturalizadas ou incorporadas ao sistema de Justiça. “Nosso objetivo principal é avançar no sentido desse problema, medindo e indicando os vários níveis em que essa questão opera”, explicou.
O levantamento trabalha com dois eixos analíticos: o do evento da morte e o da contagem das mortes. Na hipótese de o trabalho avaliar a interface entre o sistema de Justiça e o sistema de saúde, a letalidade prisional é entendida em sentido amplo para alcançar tanto as mortes que ocorrem dentro das unidades – mortes sob custódia – quanto as ligadas à passagem anterior por instituições de privação de liberdade.
Com cinco núcleos de pesquisa, além das informações do DATAJUD e do Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU), o estudo utilizou amostras de processos estratificadas por tribunal. Ao todo, foram analisados 194 processos por tribunal nos estados do Acre, Amazonas, Amapá, Bahia, Goiás, Pernambuco, Paraná, Rondônia, Roraima, Sergipe, Tocantins, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, com sede no Recife, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Piauí, Maranhão, Mato Grosso, São Paulo, Distrito Federal, Pará e Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com sede em Brasília.
Entre as diferentes dimensões para análise estão o “corpo”, que se refere à pessoa e/ou família, “o dado”, voltada para a informação, e a “política judiciária”, que são as possibilidades normativas. Um dos aspectos mais relevantes sobre a letalidade prisional diz respeito ao apagamento de pessoas, que significa a escassez de informações sobre as condições de morte dos presos, embora a coleta de dados varie de estado para estado. Outro ponto importante é a dificuldade que ainda existe em se identificarem como letalidade prisional os casos em que, por doença acometida nas unidades prisionais, as mortes venham a ocorrem nos equipamentos da rede pública de saúde. Nesses casos, há o dilema para definir o dentro e fora.
Maíra lembrou que a prisão é a prestação jurisdicional do sistema criminal e é fundamental estudar as mortes dentro das prisões e ao seu redor para que se possa refletir, sobretudo, sobre a função da Justiça no Estado Democrático de Direito. “Estamos falando de preservar a vida das pessoas às quais cumprimos um papel jurisdicional. De maneira sistemática, essa é a primeira vez que se tenta reunir informações para entender o tamanho dessa problemática”, enfatizou.
Em sua explanação, a pesquisadora Maíra destacou ainda a função exercida pelo Conselho Nacional de Justiça, que é capaz de editar regras, definindo como essas mortes devem ser nomeadas, quais categorias utilizar, permitindo a abertura de um novo nível de debate.
Como uma das debatedoras do seminário, juíza auxiliar da Presidência do CNJ Karen Luise Souza fez uma análise social do relatório preliminar. “Quando pensamos no apagamento mencionado no estudo, também podemos analisar de que forma essas pessoas se distinguem. São indivíduos que acabam tendo um contato com o sistema prisional, estão sob custódia e, para além disso, sabemos também que temos uma maioria de pessoas hierarquicamente racializada dentro da nossa sociedade”, ponderou.
A juíza criminal Fernanda Orsomarzo, que encerrou os debates, afirmou que a ausência de dados sobre o tema não é algo circunstancial. A falta de sistematização e integração, dificuldade encontrada pelas pesquisadoras, é uma das faces de um projeto de invisibilização de existências que são disfuncionais ao sistema, em curso desde o Descobrimento. “O tratamento indigno reservado a pessoas privadas de liberdade é estrutural ao sistema carcerário brasileiro, construído para esconder corpos negros e periféricos”, pontuou.
Em sua conclusão, Natália reiterou que as escolhas metodológicas da pesquisa buscaram incluir uma rede grande para que se pudesse criar uma agenda de estudos sobre o tema, até o presente momento, quase inexistente. “Precisamos produzir informação sobre o assunto da letalidade prisional na maior escala possível”, disse.
Na quinta edição da série Pesquisa Justiça, seis temas estão em estudo. Dois deles também já tiveram dados preliminares apresentados: Estudos empíricos sobre a efetividade da jurisdição ambiental na Amazônia Legal e Comportamento judicial em relação à Convenção Americana de Direitos Humanos. Os outros dois temas são: A Lei Brasileira de Inclusão e o Poder Judiciário; e Grupos vulnerabilizados e privação de liberdade.
Texto: Lenir Camimura e Ana Moura
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias
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