Por que Aloizio Mercadante no governo Lula assombra o mercado? – Mercado – Estadão E-Investidor – As principais notícias do mercado financeiro – E-Investidor

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O início da semana foi traumático para o Ibovespa. Na segunda-feira (12), o principal índice de ações da B3 fechou o dia em queda de 2,02%, aos 105.343,33 pontos. Com a derrocada, a carteira teórica zerou todos os ganhos acumulados em 2022.

Por trás do dia negativo, estavam os rumores sobre o economista Aloizio Mercadante estar cotado para assumir o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ou o comando da Petrobras (PETR4) no ano que vem, quando Lula (PT) volta a ser chefe do Executivo pela terceira vez. A notícia azedou o humor dos investidores e afetou os ativos da petroleira, que também cederam 3,24% no pregão.
Para entender a reação do mercado, é necessário relembrar quem é Mercadante. Atual coordenador de grupos técnicos da transição,  o economista formado na Universidade de São Paulo (USP) liderou três ministérios durante os mandatos da ex-presidente Dilma Rousseff (2011 a 2016): Ciência, Tecnologia e Inovação, Educação e Casa Civil.

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“Ele teve participação protagonista durante os mandatos de Dilma Rousseff. Ele foi uma presença efetiva em diversas tomadas de decisão importantes do governo, que não foi um governo bem avaliado pelo mercado”, afirma Matheus Pizzani, economista da CM Capital.
O governo Dilma foi marcado por atitudes consideradas irresponsáveis do ponto de vista fiscal. As sucessivas interferências nas estatais, o controle artificial dos preços da gasolina e energia elétrica, e a chamada “contabilidade criativa” nas contas do governo resultaram na alta da inflação e em recessão.

O ex-ministro também tem mestrado e doutorado em Economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), considerada de viés mais “heterodoxo” – pensamento econômico antagônico ao tradicional, geralmente associado à política de maiores investimentos públicos para fomentar o crescimento econômico.
“Ele é lido como um economista heterodoxo, o que não é bem visto pelo mercado, tendo em vista a percepção de que isso pode envolver retomada de políticas de caráter desenvolvimentista”, explica Pizzani.
Na visão de Flávio Conde, analista de ações da Levante Ideias de Investimentos, a possível escolha de Mercadante significa também que Lula está descartando o suporte de economistas liberais. Figuras respeitadas como Pérsio Arida, Armínio Fraga e Henrique Meirelles chegaram a manifestar apoio ao líder do Partido dos Trabalhadores (PT) durante a corrida eleitoral.
Contudo, até o momento, nenhum deles foi anunciado como parte do novo governo.
“Ele está desconsiderando, para posições-chave da economia, colocar alguém desse grupo ou apoiado por esse grupo (de liberais). A decepção maior (do mercado), na minha visão, é em relação a isso. Não é apenas o nome do Haddad ou Mercadante, por si”, diz Conde. “Lula desconsiderou as ideias deles e está apenas colocando pessoas que defendem um lado da moeda, que é o lado do ‘PT raiz’.”
A possível indicação de Mercadante ao BNDES, divulgada pelo Estadão, assusta o mercado financeiro pela perspectiva de um retorno às práticas do governo Dilma.
Na época, a instituição foi muito utilizada para direcionar crédito com juros abaixo do mercado, por meio do forte endividamento do governo.
“O governo se endividava para fazer com que o BNDES pudesse fazer empréstimos com juros baixos, porque o BNDES não podia ficar operando no prejuízo, então o prejuízo ficava para o Tesouro. Só que hoje não temos essa capacidade de endividamento”, diz Mário Lima, analista sênior de política e macroeconomia da Medley Advisors.
A consequência dessa política é o aumento dos gastos públicos e do risco fiscal, fora a interferência na política monetária. Em outras palavras, a medida provocava distorções no mercado de crédito – enquanto o Banco Central tentava controlar a inflação subindo os juros, o BNDES continuava fornecendo crédito com juro baixo, estimulando o consumo na ponta final.
Durante o governo de Michel Temer (MDB), o programa foi reduzido. Logo, o BNDES pagou a dívida com o governo e os juros dos empréstimos passaram a andar em linha com o mercado. “Isso fez com que as grandes empresas fossem buscar financiamento também via mercado, melhorando o mercado de crédito no Brasil com esse novo desenho”, afirma Lima.
O analista político ressalta que a formação acadêmica de Mercadante na Unicamp e a possibilidade de que ele apoie maiores gastos públicos para financiar crescimento provoca a dúvida sobre o modelo que será adotado no BNDES caso o ex-ministro assuma o comando da instituição. “Retomar esse modelo de o BNDES promover uma enxurrada de dinheiro no mercado, de forma subsidiada pelo governo, pode criar mais distorções e dificultar o trabalho do Banco Central no combate à inflação”, diz Lima.
De acordo com a coluna do jornalista Lauro Jardim, em O Globo, Mercadante também é um candidato forte ao comando da Petrobras. Lima ressalta que uma eventual indicação do ex-ministro à petroleira seria uma situação ainda mais delicada do que com relação ao BNDES.
Isto porque, pelas Lei das Estatais, aprovada em 2016 durante o governo de Michel Temer, é necessário experiência profissional mínima no ramo para assumir cargos nos conselhos de administração e diretoria das companhias públicas. Também é exigido qualificação acadêmica compatível com o cargo e “notório” conhecimento a respeito do setor. O texto veta, ainda, a indicação para a presidência de quem atuou em estruturas decisórias de partidos políticos nos últimos 36 meses. Saiba por que a possível revogação da Lei das Estatais preocupa o mercado.
“Mercadante não me parece cumprir os requisitos para poder assumir a Petrobras. Então, dá a impressão de que querem mudar a Lei das Estatais. É natural que os investidores fiquem nervosos”, afirma Lima.
De fato, este provavelmente será um dos próximos passos governo eleito, segundo relatório da consultoria Eurasia divulgado na última segunda (12). A expectativa da consultoria é de que Lula edite uma Medida Provisória (MP) para mudar a legislação em torno das estatais.
“Mercadante, com todo respeito, não sabe nada do setor de petróleo”, afirma Conde, da Inversa. “No BNDES tudo bem, é um banco 100% estatal. Agora, a Petrobras é empresa mista. O governo tem cerca de 26% dos papéis, mas e o resto dos investidores?”, questiona. Segundo apuração do Estadão, Mercadante afirmou que “desconhece” iniciativas para mudanças na Lei das Estatais.
Ricardo Jorge, sócio da Quantzed, explica o contraste em expectativas do mercado e as sinalizações dadas até o momento pelo governo eleito. “O desconforto é gerado pela indicação política, que apesar de estatal, deveria ter um comando segregado do governo. Espera-se que a gestão de uma companhia não tenha interferência política, coisa que o PT já fez uma vez e agora quer fazer de novo”, afirma Jorge.

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