Quem são os estilistas e designers que vestem as líderes do governo Lula – UOL

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Da esq. para a dir., camisa da Misci usada por Janja em entrevista na TV, blazer da Misci vestido por Fernanda Santiago, do Ministério da Fazenda, e camisa da Misci usada por Marina Silva em sua posse como ministra do Meio Ambiente Divulgação
Uma série de estilistas e designers de acessórios independentes ganhou bastante destaque na imprensa e nas redes sociais esta semana —e vê agora a demanda por seus produtos aumentar. O motivo é a exposição de suas criações em imagens amplamente circuladas de duas líderes do novo governo, a primeira-dama de Lula, Rosângela Lula da Silva, a Janja, e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
Elas vestiram, em situações de muito poder e forte apelo simbólico, roupas, calçados e brincos de criadores que vêm moldando a cara da moda nacional, criando assim desejo no público, agora de olho nos atores que fazem parte do retorno da esquerda ao poder.
“A moda é a melhor maneira de se comunicar com o povo, é o que faz o intelectual refletir e o povo refletir, também. Não existe nada melhor nesse mundo em que ninguém lê nada, a massa não lê, no Instagram ninguém lê legenda, só quer ver a foto. A moda tem o papel de contar história assim como a arte tinha antigamente”, diz Airon Martin, o mato-grossense criador da Misci.

Em uma recente entrevista para a televisão, Janja usou uma camisa branca de mangas longas com estamparia em tons terrosos, da Misci. Nesta semana, ao tomar posse, Marina Silva vestia uma camisa da marca, na qual se viam desenhos de cajus, tatus e da cangaceira Maria Bonita feitos por Isabel Moura. A assessora especial de Assuntos Jurídicos do Ministério da Fazenda, Fernanda Santiago, também apareceu com calça e blazer da etiqueta.
Com sua iconografia dos rincões do Brasil estampada em peças confeccionadas com o mesmo fio da seda brasileira usada por Dior e Hermès, a Misci está ajudando a definir o que é o luxo na moda nacional de hoje. O mesmo pode ser dito das outras marcas que desfilaram, no corpo de Janja, pelos palácios do Planalto e do Itamaraty no dia da posse de Lula —Helô Rocha, Neriage, Juliana Bicudo e Flavia Madeira.
Além do design original, muitas vezes baseado no imaginário brasileiro, as etiquetas têm em comum o fato de serem independentes —ou seja, sem um grande conglomerado de moda por trás—, equipes majoritariamente femininas, tanto na costura quanto no marketing, e a valorização de processos artesanais em peças de tiragens limitadas ou únicas, feitas com exclusividade, sempre com matéria-prima nacional e mão de obra local.
É o caso de Helô Rocha, que criou sob medida para a deputada federal Erika Hilton um conjunto de blusa e saia todo vermelho, justo ao corpo, e para Janja o terno e a calça pantalona que ela vestiu ao subir com Lula a rampa do Palácio do Planalto, look que trazia bordados feitos com palha. Ou ainda da marca paulistana Neriage, responsável pelo conjunto plissado em lilás, costurado à mão, com o qual a primeira-dama foi no jantar da posse, no Itamaraty.

Naquela festa, a socióloga calçava uma sandália cereja de couro da designer Juliana Bicudo, com uma estrela vermelha aplicada à sola, a única referência ao PT vista em seu look naquele dia. A paulistana é conhecida por estampar um coração no solado de sua linha de calçados de noiva.
“A gente carrega a roupa, mas o sapato nos conduz”, diz Bicudo, de forma poética. “O sapato fica como uma lembrança de uma ocasião especial, de você olhar para a peça e falar ‘esse sapato foi do meu casamento’.
Bicudo, que tem como clientes a cantora Tiê e a chef Bel Coelho, também criou a sandália de salto que Janja vestiu durante a cerimônia de posse, um modelo na cor creme com inspiração na arquitetura art-nouveau, que ela já havia usado em seu casamento com Lula.
Nas orelhas, Janja desfilou criações da designer paulistana Flavia Madeira. Durante o dia, usou o brinco Pitangão, inspirado na fruta nativa da Mata Atlântica e feito em latão banhado a ouro. Para a festa, trocou para o brinco Bandeira, joia composta por diversas pedras preciosas, feita em colaboração com Guilherme Nabhan.
Madeira afirma que não deve ter sido só pela estética a escolha de Janja por estes brincos em específico. “Tem uma camada a mais de conteúdo aí. A gente fala muito da joia pela perspectiva de cada um, não se o material é muito precioso ou não.”
Do pequeno ateliê da designer na capital paulista saem anéis, brincos, colares, pingentes e pulseiras em formatos inusitados, como piscinas de estrada, boias de salva vida, rodinhas de bicicleta e pregadores. Ela e duas outras criadoras usam na composição das joias materiais variados, como aço, madeira, porcelana, borracha e latão, além dos tradicionais ouro e prata.
Olhando em conjunto, não parece exagero afirmar que todas essas marcas têm potencial de representar o design brasileiro de moda e acessórios no exterior, assim como Osklen e Alexandre Herchcovitch fizeram em décadas passadas, cada uma com as suas peculiaridades.

Vender numa multimarcas de luxo em Nova York ou Paris é mercado, claro, mas ele vem associado ao chamado “soft power”, com o qual determinado país se posiciona e se torna culturalmente desejável em outras terras —basta pensar na bossa nova.
Em outras palavras, importa a imagem do Brasil lá fora, afirma Martin, da Misci, para quem, com a troca de governo, a presença nacional no exterior passa por um reposicionamento. “A Misci está em processo de internacionalização e para mim é muito importante que a Marina Silva esteja no Meio Ambiente. É uma outra visão do nosso país”, ele diz. Seria diferente, acrescenta, caso a expansão de sua etiqueta ocorresse em um governo que não valoriza questões ambientais.
Para o estilista, a “marca Brasil” ajuda os designers locais a largarem na frente no processo de internacionalização, e termina por impactar a indústria de moda nacional, um dos setores que mais emprega mulheres no país, do cultivo do algodão à finalização das peças.
“Tudo é indústria, tudo é emprego. É isso o que os bolsonaristas precisavam entender.”
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