Reinaldo Azevedo – Algumas críticas a Lula na grande imprensa … – UOL Confere
Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Reinaldo Azevedo, que publicou aqui o primeiro post no dia 24 de junho de 2006, é colunista da Folha e âncora do programa “O É da Coisa”, na BandNews FM. No UOL, Reinaldo trata principalmente de política; envereda, quando necessário – e frequentemente é necessário -, pela economia e por temas que dizem respeito à cultura e aos costumes. É uma das páginas pessoais mais longevas do país: vai completar 13 anos no dia 24 de junho.
Colunista do UOL
30/01/2023 16h59
Certas críticas a Lula parecem escritas pelo ChatGPT, o recurso de inteligência artificial capaz de redigir textos com lógica interna e coerência. Para alguns, pode ser a salvação… No caso das diatribes enfezadas contra o petista, tem sobrado artificialismo e faltado inteligência. O governo fecha amanhã seu primeiro mês. Em algumas penas — ou no automatismo da IA —, parece já ter a idade da Terra. Não é raro que se comece a contar já a história dessa gestão desde o fim, pressupondo que já foi um insucesso. Coisa dos sábios dos mercados. Eis aí: faltou às Americanas contar com expertos (com x) como esses.
Acho, sim, que Lula pisa na bola quando chama o “impeachment” de “golpe” e Michel Temer de “golpista”. Teria de voltar as baterias contra sete de seus ministros, que apoiaram o impedimento. Mais: nessa perspectiva, o golpe teria sido dado por Câmara, Senado e Supremo — o mesmo tribunal que devolveu a elegibilidade a Lula. Aí o cenário começa a ficar confuso. Produz-se mais ruido do que informação. Ademais, indague-se: o que o presidente e o governo ganham com isso? Isso é disputa de leitura da história que tem de ser feita por grupos políticos. Que o PT o faça, vá lá. Nota à margem: já escrevi e reitero agora que julgo não ter havido pedalada. Apoiei o impeachment de Dilma e foi um erro. Mas golpe é outra coisa.
Embora eu não veja nada de errado, desde que as operações não sejam lesivas ao país, que o BNDES financie obras no exterior de que participem empresas brasileiras — não sendo lesivas, nesse caso, tendem a ser benéficas —, acho que o anúncio sem que se tenha nada de concreto gera muito calor e pouca luz. O mesmo se diga sobre a tal moeda comum para o comércio entre os países do Mercosul ou sobre as críticas meramente retóricas à independência do Banco Central e à responsabilidade fiscal. Quando essas coisas surgem no noticiário, o ChatGPT tem novas referências para escrever os aborrecidíssimos textos de sempre. Com muito artificialismo e pouca inteligência.
E, no fim das contas, isso tudo é o quê? Por enquanto, retórica. Definidas as Mesas da Câmara e do Senado, começa a corrida para a criação do chamado “arcabouço fiscal”, como o governo prefere chamar a coisa, em vez de “âncora”, o que parece bom.
O mau humor, note-se, não nasce dos escorregões retóricos, não. A virulência “Duzmercáduz” contra o governo Lula vem de antes. Tomaram corpo com as críticas absolutamente injustas e infundadas contra a PEC da Transição. Mas conviria que o governo não ficasse alimentando o ChatGPT, não é mesmo?
Mas é um fato: experimente pedir à ferramenta um texto que contenha as palavras “Lula”, “PT”, “mercados”, “responsabilidade fiscal”, responsabilidade social”, “populismo”, “âncora fiscal”, “BNDES”… E ele não lhe devolverá nada que você já não tenha lido nas colunas dos de sempre.
Estou entre aqueles que acham que Lula está indo bem até seu 30º dia de governo. E não posso deixar de atentar para a ironia da coisa. Começou, com a aprovação da PEC, a governar antes de tomar posse e utilizou a emenda para costurar uma base de apoio no Congresso; enfrentou uma tentativa de golpe no oitavo dia de mandato — coisa que a turma da Inteligência Artificial quer ignorar para impor a agenda “Duzmercáduz” —; resolveu enfrentar as consequências das ações genocidas da gestão Bolsonaro na Terra Ianomâmi. As garantias que a turma do ChatGPT quer que ele dê, bem, ele não as dará porque eram as do governo Bolsonaro-Guedes, cuja herança está aí.
Lula já fez reuniões bilaterais com representantes de 15 governos, como informa O Globo, praticamente a metade do que fez Jair Bolsonaro em quatro anos: 31. Nesta segunda, encontrou-se com Olaf Scholz, chanceler alemão. Embarca para os EUA no dia 10 do mês que vem para um encontro com Joe Biden. Em março, será a vez da China; em abril, de Portugal e três países africanos. Já teve uma longa conversa ao telefone com Emmanuel Macron, que prepara uma visita ao Brasil. Em 2021, Bolsonaro foi à cúpula do G-20 na Itália. No salão em que circulavam chefes de Estado, buscava conversa com funcionários que atuavam no evento. Ninguém queria falar com ele. Tiveram de inventar alguns passeios para que ocupasse seu tempo no país.
O petista não está acumulando milhas. Os americanos dizem que podem investir até US$ 150 bilhões em projetos ambientais por aqui. Svenja Schulze, ministra alemã da Cooperação Econômica e Desenvolvimento da Alemanha, que integra a comitiva de Scholz, anunciou a doação de 200 milhões de euros para o meio ambiente e desenvolvimento sustentável. E declarou: “Vamos também cooperar em outras áreas, para ajudar a resolver o fosso social, porque temos certeza que a proteção do clima não funciona sem resolver os problemas sociais”. É o que prova a tragédia yanomami, por exemplo. Também os 20 mil garimpeiros precisam de uma resposta que não é apenas policial.
Na reunião da Celac (Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos), o presidente brasileiro se encontrou com Charles Michel, Presidente do Conselho Europeu. Tenta articular para julho uma cúpula Mercosul-União Europeia em Bruxelas. O ansiado acordo entre os dois blocos está travado em razão das questões ambientais no Brasil. Ou alguém imaginava um entendimento, dada a pistolagem que estava em curso na Terra Ianomâmi, de amplo conhecimento internacional?
Com todas as vênias ao ChatGPT, a resposta do governo, considerando os desafios, tem sido satisfatórias. Convém atentar mais para os fatos e menos para os escorregões retóricos, embora, por óbvio, estes não sejam desejáveis porque só servem para alimentar as milícias digitais do genocida — sem contar os textos aborrecidos dos aborrecidos de sempre na grande imprensa.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
Reinaldo Azevedo
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