Sob Bolsonaro, país tem queda no número de presos pela 1ª vez em um governo – UOL Confere

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.
Formado em jornalismo pela Universidade Federal de Alagoas e com especialização em gestão de conteúdo em jornalismo pela Universidade Mackenzie, Carlos Madeiro atua há 20 anos e escreve para o UOL desde 2009, participando de grandes coberturas e fazendo reportagens e análises sobre o Nordeste e o Norte do Brasil.
Colunista do UOL
14/11/2022 04h00
Pela primeira vez desde a redemocratização do país, um mandato de governo federal será passado para outro presidente com uma taxa de encarceramento e número de presos detidos em celas menor do que o encontrado no início de gestão.
Entre dezembro de 2018 e junho de 2022, a população carcerária brasileira caiu 11,1%, ou seja, de 744,2 mil para 661,9 mil pessoas detidas. Os dados são do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), ligado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Nas trocas de governo desde 1990, o presidente da República sempre entregou a seu sucessor uma taxa maior de pessoas encarceradas se comparada com a que havia recebido ao assumir.
Em 2023, porém, ocorrerá algo inédito na passagem da faixa de Jair Bolsonaro (PL) para Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A taxa de encarceramento por 100 mil brasileiros, que era de 356 em dezembro de 2018, caiu para 310 em junho. A tendência é de queda, já que em 2021 o número havia fechado em 318.
A maior alta de população carcerária ocorreu, inclusive, na gestão dos dois primeiros mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010). Ele recebeu o governo com uma taxa de encarceramento de 137 presos para cada 100 mil habitantes em dezembro de 2002. Em dezembro de 2010, essa taxa havia saltado para quase o dobro, ficando em 260.

A gestão do petista foi marcada, inclusive, por críticas à política de encarceramento em massa gerada pela Lei Antidrogas (nº 11.343, de 2006), que permitiu que uma pessoa fosse presa pela posse, a depender da quantidade.
Como consequência, milhares de usuários de drogas são presos anualmente, ajudando na superlotação do sistema carcerário brasileiro.
Curiosamente, enquanto setores da extrema direita e uma ala evangélica afirmavam, durante a campanha eleitoral, que Lula iria liberar as drogas e soltar presos, especialistas apontaram —com a comprovação pelos números— que a nova legislação não cumpriu o efeito prometido de anistiar o usuário e prender mais os vendedores das drogas.
Em junho de 2022, segundo o Depen, havia 197 mil pessoas presas por conta da Lei Antidrogas de 2006, sendo 164 mil detidas por associação ao tráfico. Em 2005, antes da lei, eram 32 mil nessa condição. Hoje, 60% das mulheres condenadas em presídios são com base nessa legislação.
“A lei tinha o objetivo de separar quem é usuário e quem é traficante. O usuário passou a ser visto como uma questão de saúde pública, e não de cadeia. Em tese, a lei tinha o objetivo de diminuir o encarceramento, mas aconteceu justamente o contrário”, afirmou Luís Carlos Valois, juiz de execuções penais do Amazonas e doutor em criminologia pela USP (Universidade de São Paulo), em entrevista à BBC Brasil.
O superencarceramento adotado pelo Brasil é sempre criticado pelos criminologistas, que veem uma série de erros levando a um aumento de detenções provisórias (antes do julgamento).
“O Brasil prende muito e prende mal. Prende de forma exagerada por crimes que não são reputados como graves e demoram a ter respostas”, diz o advogado Welton Roberto, que também é professor de direito penal da Ufal (Universidade Federal de Alagoas) e doutor em criminologia pela Universidade de Paiva (Itália).
“A prisão cautelar ou provisória por muitas vezes é utilizada como antecipação de uma pena que nem sequer é aplicada ou como forma de castigar o suposto infrator com a perda da liberdade de maneira apressada”, completa.
Não é tardio lembrar a Operação Ouvidos Moucos, desencadeada em 14 de setembro de 2017, que prendeu antecipadamente o ex-reitor da UFSC [Universidade Federal de Santa Catarina] Luiz Carlos Cancellier, que veio a se suicidar. Ao final, o inquérito da PF foi arquivado por falta de provas.”
Welton Roberto, criminalista
Para ele, a redução do aprisionamento percebida a partir de 2020 deve ser atribuída a fatores ligados à pandemia, e não há uma mudança de lei criminal ou de execução penal, especialmente justamente a uma queda no percentual de presos provisórios de 40%, em 2014, para 29,1% neste ano.
“Isso pode ser explicado pela maior adoção de outras medidas cautelares, diferentemente da prisão. Mas temos também a questão da pandemia, que atrasou o julgamento de muitos processos e pode ter forçado os juízes a liberarem os presos provisórios”, comenta.
Nesse sentido, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) fez recomendações para tentar reduzir a lotação dos presídios na pandemia, como a aplicação preferencial de medidas em meio aberto e a revisão das prisões provisórias e decisões de internação de adolescentes. Também se pediu a “máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva”.
Seguindo a orientação, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) tomou algumas resoluções para a contenção da pandemia nos presídios, como o habeas corpus coletivo a todos os presos que tivessem liberdade provisória condicionada por fiança, mas que ainda estavam presos por alegaram não ter valor para pagar o valor arbitrado.
A pedido da coluna, a Comissão do Sistema Prisional, Controle Externo da Atividade Policial e Segurança Pública do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) avaliou os números e afirma que muitos fatores podem ter influenciado —citando, porém, que não há um estudo oficial consolidado sobre o tema.
Segundo a nota enviada, a pandemia “exigiu algumas medidas estatais urgentes, principalmente para os presos com comorbidades”.
Um exemplo citado é justamente a resolução do CNJ que previu a prisão como medida excepcional.
Quanto à aplicação de medidas cautelares, a exemplo de tornozeleiras eletrônicas, ele cita que há previsão no Código de Processo Penal, e os juízes criminais são autônomos para analisar os requisitos legais.
“São medidas substitutivas que, se aplicadas com toda a fiscalização necessária para o monitoramento, fomentam a diminuição de eventuais superlotações nos presídios e resguardam a proteção da sociedade.”
Em resumo, a comissão considera salutar a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, “desde que cumpridos rigorosamente os requisitos legais”.
“Ademais, é imprescindível a efetiva fiscalização pelo Estado para que as medidas garantam uma adequada proteção social”, finaliza.
Por regime:
Por sexo:
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Em nota, o Ministério da Justiça se Segurança Pública afirma que “questões relacionadas ao encarceramento ou ao desencarceramento de pessoas presas são complexas, pois envolvem diferentes órgãos da execução penal tanto do Executivo, quanto do Judiciário, por exemplo.” “Além disso, também podem estar relacionadas a alguns fatores externos à execução penal, como a pandemia da Covid-19.”
“A redução na taxa de desencarceramento pode ser resultado dessa mudança de abordagem, que trouxe resultados positivos para a segurança pública, como a própria redução na taxa de homicídios no país verificada recentemente”, diz.
A pasta diz que o estado brasileiro passou a adotar ações nos presídios após os massacres “ocorridos no passado”.
Sobre políticas desenvolvidas, diz que atualmente o Depen “possui mais de R$ 68 milhões investidos em 23 Unidades Federativas para as Políticas de Monitoramento Eletrônica que inclui o fomento à construção de Centrais de Monitoramento Eletrônico.”
Desde 2021 o Depen investiu R$ 274.964.136,71 de recursos do Fundo Penitenciário Nacional para fomentar financeira e tecnicamente as unidades federativas para a criação de celas físicas para abrigar custodiados nas penitenciárias estaduais. No total, são 39 obras em andamento no sistema penitenciário brasileiro em 2022.”
MJSP
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Carlos Madeiro
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