STF decide que é constitucional regra que posiciona membro do MP ao lado do juiz – JOTA
ADI 4768
Na ação, o Conselho Federal da OAB argumentava que as conversas ‘ao pé do ouvido’ contribuem para uma impressão de parcialidade
O Supremo Tribunal Federal (STF) considerou ser constitucional a regra que garante a membros do Ministério Público a prerrogativa de se sentarem do lado direito de juízes durante sessões de julgamentos e nas salas de audiência.
O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4768 foi concluído nesta quarta-feira (23/11). Na ação, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) questionou artigos do Estatuto do Ministério Público da União (Lei Complementar 75/93) e da Lei Orgânica do MP (Lei 8.625/93). O conselho argumentou que o dispositivo favorece o Ministério Público nos julgamentos porque dá “impressão de parcialidade do julgador e confusão de atribuições”.
Além disso, a OAB lembrou que as partes, testemunhas ou advogados presenciam “conversas ao pé do ouvido” entre magistrado e representante do MP que, de certo modo, dão a impressão de que “o jogo estaria combinado’”, de modo a prejudicar a advocacia.
A relatora, ministra Cármen Lúcia, votou pela improcedência do pedido. Para ela, a proximidade física na sala de audiência entre integrante do MP e magistrado não influencia nem compromete os julgamentos e nem viola o princípio da paridade de armas.
“Não se trata de desigualdade de tratamento entre as partes. A posição revela mais um simbolismo de fundo histórico, até porque o MP não é apenas o ‘defensor do povo’”, entendeu a relatora. Ela citou o artigo 127 da Constituição Federal (“instituição permanente essencial à função jurisdicional do Estado”). Mas justifica-se também, é claro, por ser o MP o “defensor do povo, da sociedade”.
O ministro Edson Fachin acompanhou a conclusão da relatora, mas apresentou fundamentos divergentes. Para ele, deve-se reconhecer que a “proteção de direitos fundamentais” é a principal função do MP. Fachin entendeu que o MP atua, sim, como “parte” no desenvolvimento de um processo. A distribuição dos eventuais atores no espaço do processo judicial deve ser levada em conta, segundo ele.
O voto da ministra foi acompanhado pela maioria, com a tese de que não se identificou inconstitucionalidade na regra, uma vez que o MP, quando atua como parte ou fiscal da lei, é órgão estatal responsável pela defesa da ordem jurídica e do interesse público.
A maioria entendeu que a Constituição não exige nenhum tipo de organização dos assentos, e a conclusão de que o simbolismo da posição física das partes traria prejuízo ao equilíbrio processual, especialmente no processo penal, é especulativa. Assim, o membro do MP tem exatamente as mesmas garantias, prerrogativas e vedações do magistrado, porém atua com funções diversas. Cabe ao Poder Legislativo, segundo o entendimento dos ministros, redimensionar, excluir ou transferir, por meio de lei, as normas sobre o posicionamento das partes nos fóruns, nas salas de audiências e nos tribunais.
Votaram pela improcedência da ação os ministros Edson Fachin, André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Dias Toffoli.
“Se estivéssemos na época de Rui Barbosa, a OAB jamais entraria com uma ação dessas. Não vejo inconstitucionalidade”, disse Fux.
“A CF exige algum modelo de organização das cadeiras em sala de audiência. A resposta é não” afirmou Nunes Marques. “Não vejo inconstitucionalidade dos dispositivos”, completou.
O ministro Ricardo Lewandowski apresentou voto divergente por entender que deveria haver procedência do pedido a fim de que a prerrogativa seja garantida ao MP apenas quando seus membros atuarem como fiscais da lei. Para ele, nos casos em que o MP atua como parte, a diferença nos assentos é capaz de gerar desequilíbrio na relação processual, em violação ao princípio da igualdade, do contraditório e do devido processo legal.
“A posição do Ministério Público à direita do magistrado é mais a tradição multissecular do que uma determinação legal – é o que ocorre um pouco com os crucifixos no nossos tribunais”, entendeu Lewandowski.
O ministro Gilmar Mendes entendeu da mesma forma, desde que aplicado aos processos penais e de improbidade.
A presidente do Supremo, ministra Rosa Weber, ficou vencida em menor extensão. Para ela, a prerrogativa não deveria ser aplicada somente aos julgamentos do Tribunal do Júri.
Luiz Orlando Carneiro – Repórter e colunista.
Flávia Maia – Repórter em Brasília. Cobre Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF). Foi repórter do jornal Correio Braziliense e assessora de comunicação da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Faz graduação em Direito no IDP. Email: [email protected]
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