ConJur – Vista interrompe ação de deputado no STF, e há risco de prescrição – Consultor Jurídico

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Por Sérgio Rodas
Pedidos de vista dos ministros André Mendonça e Dias Toffoli interromperam nesta quinta-feira (10/11) o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, da ação penal contra o deputado federal Silas Câmara (Republicanos-AM) pela prática de "rachadinha" em seu gabinete. E geraram críticas de integrantes da corte, uma vez que ocorrerá prescrição se o caso não for encerrado até o próximo dia 2. Cinco magistrados já votaram pela condenação do parlamentar.
Líder da bancada evangélica na Câmara dos Deputados, Silas Câmara está no seu sexto mandato e foi reeleito no mês passado. Caso seja condenado, além da pena estipulada pelo Supremo, ele poderá perder o cargo. O parlamentar é acusado de peculato por se apropriar do salário de seus assessores para o pagamento de contas pessoais, como cartão de crédito, prática popularmente conhecida como "rachadinha".
Câmara foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República em 2010. Segundo a denúncia, ele, com o auxílio de um ex-secretário, desviou em proveito próprio parte dos recursos destinados à contratação de sua assessoria parlamentar no período de janeiro de 2000 a dezembro de 2001. De acordo com a PGR, o deputado nomeou diversos servidores em cargos comissionados para atuar em seu escritório de representação estadual e no gabinete na Câmara. Em troca, exigia constantemente que entregassem parte, ou até mesmo o total, da remuneração.
A defesa do deputado sustenta que os valores depositados em sua conta eram decorrentes de quitação de empréstimos feitos aos seus auxiliares.
No último dia 3, o relator do caso, ministro Luis Roberto Barroso, reafirmou seu voto, proferido durante sessão virtual em 2020, quando o ministro Nunes Marques pediu destaque. No entendimento de Barroso, ficou comprovado que Câmara, usando o cargo de deputado federal, desviou valores destinados ao pagamento de assessores parlamentares. O magistrado votou pela imposição de pena de cinco anos e três meses de reclusão, além do pagamento de multa e devolução dos valores desviados.
Na sessão desta quinta, seguiram o voto do relator os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Nunes Marques votou pela absolvição do parlamentar. André Mendonça e Dias Toffoli pediram vista, e os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes preferiram aguardar o retorno do caso para se pronunciar. O ministro Luiz Fux não participou da audiência.
Mendonça pediu vista porque entendeu ser preciso analisar se Câmara pode firmar acordo de não persecução penal (ANPP). O requerimento de suspensão do julgamento desagradou a outros ministros, devido ao risco de prescrição.
Alexandre de Moraes disse que só cabe ANPP se o acusado confessar o crime, o que Silas Câmara nunca fez. Ele também ressaltou que tal acordo existe na legislação há quatro anos, mas a PGR não o ofereceu ao deputado. Portanto, segundo o ministro, não faz sentido suspender o julgamento.
Já Edson Fachin ressaltou que a denúncia foi recebida pelo Supremo em 2010. Mendonça respondeu que não estava no Supremo na época e que é a primeira vez que analisa o caso. Fachin, então, lembrou que a ação entrou no Plenário Virtual em 2020.
Ricardo Lewandowski opinou que a prescrição é um direito do réu, e não um favor que a Justiça faz a ele. Presidente do STF, Rosa Weber mencionou que um dos critérios que considera na elaboração da pauta de julgamentos é a proximidade do fim do prazo prescricional. Por sua vez, Alexandre concordou que a prescrição é direito do réu, mas ressaltou que também é dever da Justiça concluir o julgamento quando perceber que ele pode prescrever.
Dias Toffoli também pediu vista, por causa de compromissos institucionais. Em um deles, nesta quinta, ele representaria o STF a pedido de Rosa Weber.
Gilmar Mendes disse que o direito de pedir vista é fundamental, porém, ponderou que quem o exerce deve levar em conta o prazo prescricional.
André Mendonça foi indicado para o STF pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). Dois filhos dele, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (PL), são investigados pela prática de "rachadinha" em seus gabinetes.
Excesso de provas
Edson Fachin avaliou ter ficado provado, acima de qualquer dúvida razoável, que Silas Câmara agiu ilicitamente para receber parcelas de salários de seus assessores, o que caracteriza peculato. E o fato de o parlamentar ter sido absolvido em ação civil pública por improbidade administrativa não impacta o processo penal, que é independente daquela esfera.
Alexandre de Moraes afirmou que há até excesso de provas de que Câmara cometeu o crime. O ministro questionou o argumento da defesa de que o deputado estava apenas recebendo valores que havia emprestado. "Não me parece que o parlamentar possa ser banco ou agiota, e as justificativas sejam: 'Ah, estavam devolvendo dinheiro emprestado'", declarou ele, mencionando que não há provas dessas supostas transações.
Além disso, Alexandre afirmou que a prática de "rachadinha" constitui corrupção. Afinal, o dinheiro que deveria ser destinado ao pagamento de assessores vai para o próprio parlamentar, em vez de ser devolvido aos cofres públicos por falta de uso.
"(A 'rachadinha') Ao mesmo tempo é um enriquecimento ilícito pelo réu e um dano ao erário público. É um dano ao erário público porque aquele serviço que deveria ser prestado mediante a remuneração não é prestado. Isso ocorre porque, a meu ver, o esquema de 'rachadinha', que, lamentavelmente, ocorre diversas vezes e em diversos locais, é uma clara e ostensiva modalidade de corrupção, que tem a finalidade de desviar recursos públicos. São recursos públicos destinados à assessoria (parlamentar), e esses recursos públicos simplesmente passam a ser um acréscimo salarial para aquele parlamentar que se utiliza desse mecanismo".
Cármen Lúcia também entendeu que ficou provado o esquema de "rachadinha". E Rosa Weber opinou que falta consistência à justificativa dada pelo deputado para o recebimento de depósitos bancários constantes e fracionados.
Falta de provas
Nunes Marques votou pela absolvição de Silas Câmara por ter concluído que não há provas suficientes de que parcelas dos salários dos assessores eram repassadas ao parlamentar.
O magistrado ainda entendeu que há nulidade na instauração do inquérito pela Polícia Federal sem anuência do STF, a quem cabe ordenar a medida, uma vez que Câmara, por ser deputado, tem foro por prerrogativa de função na corte.
Outros ministros rebateram esse argumento apontando que não foi promovida nenhuma diligência sujeita a aval do Supremo. Mesmo se isso tivesse ocorrido, teria sido superado pelo recebimento da denúncia em 2010, destacou Rosa Weber.
Clique aqui para ler o voto de Luís Roberto Barroso
AP 864

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio de Janeiro.
Revista Consultor Jurídico, 10 de novembro de 2022, 21h14
3 comentários
Anderso D K (Advogado Autônomo – Civil)
11 de novembro de 2022, 11h13
Prescrição nuca foi problema para os ministros do STF, especialmente os ditos “garantistas” de ocasião.
Cadê o julgamento dos processos de Renan Calheiros, José Dirceu e cia?
Esse caso só ganhou relevo por se tratar do ministro indicado por Bolsonaro.
Ridículo é levar 20 anos para o caso ir a julgamento. Há ministros que sentam em cima de processos há mais de década. Os críticos aí que o digam.
Pra julgar “fake news” são bem rapidinhos.
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LCLO (Advogado Autônomo – Tributária)
11 de novembro de 2022, 9h28
A reclamação é justa e o ponto suscitado pelo Ministro Lewandowski tem fundamento, pois a prescrição é um direito do réu. Porém, também não podemos condenar os Ministros Andre(indicado do atual Presidente) e Dias Toffoli(indicado do futuro Presidente) por uma prática muito comum (suspensão de julgamentos), corriqueira, que vem sendo adotada, com constância, pela atual composição do STF.
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Jacques Villeneuve (Outros)
11 de novembro de 2022, 5h50
A justificativa de Mendonça é ridícula. Ele inclusive usa o argumento genérico de que “a sua preocupação vai ao encontro de temas debatidos na quarta-feira (9) com o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como políticas de desencarceramento e redução da litigiosidade em casos penais”. Agora um juiz se vê convencido por um político a não aplicar a lei. É isto? Rejeito o argumento, que não tem guarida no nosso Código Penal. Políticas de desencarceramento não podem implicar na não aplicação da Lei Penal. Onde está escrito no Código Penal ou em qualquer outro dispositivo? Isto é pura filosofia inventada judicial, como tem virado moda mundo afora. Além disso, o argumento sobre o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) é igualmente genérico e incorreto, como também disse Alexandre de Morais. Os outros ministros tiveram razão em reclamar.

É por isto que tantas pessoas com foro, como se convencionou aqui no Brasil, não dá certo. As Cortes superiores, além de não serem estruturadas para ter tanta gente sob a sua jurisdição penal, tem tais “inconvenientes”, ainda por cima muitos da classe jurídica (o Conjur incluso) rejeita a limitação dos inúmeros recursos possíveis para estes tribunais superiores. Querem manter as portas abertas, escancaradas para todo e qualquer detalhe, ou sentença penal, ou civil de alguém que detenha capital suficiente para tal. O resultado só podia dar nisto.

Depois reclamam do clima de ojeriza que se criou contra o STF e demais instituições. Decerto, a aplicação correta do Direito não pode se curvar ao clamor público. Mas não faltam motivos VERDADEIROS pelos quais as pessoas têm se manifestado ardosamente contra o STF.
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