Morte de Pelé ganhou novos sentidos com proximidade da posse de Lula – UOL

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Professor sênior de literatura brasileira na USP, ensaísta e compositor, é autor, entre outros, dos livros “Maquinação do Mundo” (2018) e “Veneno Remédio” (2008)
Pelé morreu como um rei ungido pelo mundo, sem nenhuma herança real que não fosse a da cultura popular brasileira. Morreu bem aos poucos, e só quando estivéssemos todos já preparados. Sua morte se deu como uma passagem, não como uma ruptura.
A reação na imprensa mundial foi maciça e impactante, chegando às raias do desconcertante. Unânime, dissipou toda e qualquer dúvida sobre sua grandeza primeira e única, sobre a majestade de sua aparição, sobre a revelação da potência da beleza quando supera os limites do humano, sem separar-se deles.
Se vivemos um tempo em que a última novidade parece apagar imediatamente a que a antecedeu, em que tudo se mitifica para que se consume a destruição dos mitos, impressiona (sendo que ele encerrou sua carreira há quase 50 anos) o quanto permaneceu singularmente incólume a verdade do seu mito.
A mim, nascido e crescido em São Vicente, cidade colada em Santos como se fossem a mesma, coube presenciar esse assombro na Vila Belmiro, durante seus anos áureos, quase a cada semana. Ali, a exceção prodigiosa parecia natural. Os corpos negros de Dorval, Mengálvio, Coutinho e Pelé esplendiam no uniforme branco livres de logomarca.
Eles, assim como Pepe, Zito, Lima, Edu e Clodoaldo, permaneceram a carreira toda jogando no mesmo clube, antes do trança-trança que se tornou praxe no giro atual do mercado da bola. O estilo coletivo atingia a sua quintessência. O time do Santos jogava como uma onda a um só tempo suave e avassaladora, em cujo coração turbilhonante Pelé reinava.
Cidade portuária, provinciana mas cosmopolita a seu modo, Santos guardava uma complexidade social e cultural que ia do forte movimento operário das docas ao Festival de Música Nova impulsionado pelo compositor Gilberto Mendes, que a tornava uma referência na música de vanguarda da América Latina (Gilberto Mendes é, a propósito, autor de uma peça sinfônico-radiofônica cheia de ousadia e humor chamada “Santos Futebol Música”).

Estudei em escola pública excelente, no mesmo colégio de São Vicente em que vi Pelé deixar às vezes a irmã, que levava de carro, às 7h. A combinação do grande com o pequeno, da dimensão local com a dimensão global, que ele elevou à sua máxima potência, faz parte da aura e do feitiço da Vila Belmiro. Comove que seu velório tenha se dado no centro daquele gramado, dentro desse espírito —o espírito Santos— e que seu corpo tenha percorrido longamente em cortejo as ruas da cidade.
Quando o New York Times, baseado no fato de que eu escrevi um livro sobre o futebol e o Brasil e que acompanhei de perto a era Pelé, me solicitou um texto sobre ele, preparando-se para a eventualidade de sua morte, eu desejei comigo mesmo que pudesse ser, mais que um obituário, uma afirmação da vida em vida.
Me impressionava a entrevista filmada por João Moreira Salles, em 1997, em que Pelé problematizava a sua condição dúplice de ídolo planetário e de homem comum (encarnando bem a seu modo, e segundo seus próprios termos, a antiga teoria teológico-política dos dois corpos do rei —o corpo natural e o corpo místico, o corpo mortal e o imortal). O destaque do tema na capa do jornal foi um dos sinais da dimensão de grandeza sem sombras que a imprensa mundial reconheceu, em peso, na figura de Pelé.
Apenas três dias depois, por um desses lances do acaso que não temos o direito de considerar trivial, o mesmo New York Times estampava na capa a foto de Lula subindo a rampa do Palácio do Planalto acompanhado da gente do povo dos Brasis.
A imagem, tão inesperada quanto admirável e tocante, lembra longinquamente aquela passagem de “Grande Sertão: Veredas” em que Riobaldo, recém-investido da chefia, se faz acompanhar em cortejo do menino negro Guirigó, do sábio cego Borromeu e de outros deserdados do mundo do sertão, compondo como pode um precário desígnio de justiça.
Já se disse que o “Grande Sertão” é uma espécie de “Macunaíma” a sério. Mais sério ainda é o momento que vivemos, e o desafio contido nessa aposta incomum e cheia de grandeza, bafejada pela aura de Pelé, que morreu entre a Copa e a posse, quase ao mesmo tempo em que o ex-presidente se escafedia num avião rumo à Flórida, como lembra João Moreira Salles, em texto publicado na Piauí virtual.

A morte de Pelé, já para além dele, e mais além de qualquer posição político-partidária, é um passe à procura de nós, uma pergunta e uma resposta, a reaparição de uma inspiração. Entre a potência de uma vida comum sem fronteiras, da qual ele é o anúncio mais escancarado, e a desigualdade, a violência e a pequenez que sempre a travaram.
Haja travessia.
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